Conversa de Delcídio sugere que senador quer um pouco mais de ética na sacanagem!
Para quem se delicia prestando atenção a detalhes da linguagem, o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), antes a Vovó Mafalda, é mesmo um banquete quando se manifesta como Vovó Metralha, quando solta o verbo.
Naquela conversa em que planeja a rota de fuga de Nestor Cerveró, em companhia de Edson Ribeiro, o advogado, o petista lamenta o comportamento de Fernando Baiano, nestes termos:
“É uma vergonha o que ele fez! Bicho! Para as oportunidades que o Nestor deu, porra! Fernando fazer uma calhordice dessa, uma canalhice dessas”.
Ah…
Notem o tratamento das personagens pelo prenome: “Fernando, Nestor…”. Isso, não tenhamos dúvida, é intimidade.
Também acho encantador que se recorra ao que me parece ser uma espécie de ética da bandidagem, certo? Afinal de contas, qual era o trabalho de “Fernando”? Fazer lobby criminoso, tráfico de influência, pagar e receber propina…
E quem lhe dava as “oportunidades”? Ora, “o Nestor”. O que Delcídio está dizendo aí, parece, é que é preciso haver ética na sacanagem, “bicho”! Como pode?
Edson Ribeiro, o advogado ainda foragido, procurado pela Interpol, comenta, na conversa gravada, que Sérgio Riera, que defende Baiano, “traiu” — sugerindo que algum acordo fora rompido. Depois, emenda sobre Alberto Youssef, ainda preso: “A cada delação que faz, ele melhora a situação dele lá dentro”.
O intuito, como se nota, é demonstrar que existe uma espécie de conspiração contra Cerveró, evidenciando a necessidade da fuga — o que, obviamente, é do interesse de Delcídio, que queria evitar que o ex-diretor confirmasse as denúncias do próprio Baiano, segundo as quais o senador recebera US$ 1,5 milhão de propina na compra da refinaria de Pasadena. Ainda volto a esse tema.
Ah, sim: no depoimento prestado nesta sexta, Delcídio diz ter recebido Bernardo Cerveró, o filho de Nestor, por uma questão de humanidade. Ah, bom… Leiam o que afirmou seu advogado, Maurício Silva Leite: “O senador disse que [a reunião] foi um pedido que o advogado e o filho do Cerveró fizeram para ele, e ele disse que iria encaminhar o assunto, que ia interceder, sim, e ele explicou que era uma questão humanitária, que era dar uma palavra de conforto e esperança, e que iria fazer isso para diminuir a dor, o sofrimento, talvez. Ele mencionou que conhecia a família [de anos antes]”.
Entendi. Vai ver foi por humanidade que Delcídio sugeriu até o tipo de avião que deveria ser usado na fuga.
Advogados têm o direito e o dever de defender seus clientes. É um primado da democracia. Mas precisam tomar cuidado com o ridículo.
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