Dilma tem de responder hoje: também pensa que o Senado não tem moral para julgá-la?
![EFE/Cadu Gomes](https://jpimg.com.br/uploads/2017/04/104708922-dilma-rousseff-le-carta-aos-senadores-e-ao-povo-brasileiro-efe-1.jpg)
Dilma vai nesta segunda-feira ao Senado para o capítulo final, no que lhe diz respeito, de sua longa cerimônia do adeus. Sim, ela cometeu crime de responsabilidade, segundo o que estabelece a Constituição e especifica a Lei 1.079. A pena para casos assim é o impeachment. Mas é evidente que não teria caído se a economia caminhasse nos trilhos e se o maior escândalo de corrupção de que se tem notícia permanecesse nos subterrâneos.
Infelizmente, intuo que, se o país estivesse crescendo e distribuindo alguma renda, a roubalheira sozinha teria sido insuficiente para derrubá-la. E a razão é simples: a admissão do crime de responsabilidade passa por três filtros em Casas essencialmente políticas: uma vez na Câmara — quando se exigem nada menos de dois terços dos deputados para que a coisa tenha continuidade — e duas vezes no Senado: primeiro por maioria absoluta (metade mais um dos votos) e, depois, igualmente, por dois terços.
Assim, diga-se de novo e sempre: o impeachment de um presidente tem um duplo caráter. É jurídico, sim, mas a questão jurídica pode simplesmente ser ignorada pela política. Isso nos leva à conclusão óbvia de que, antes mesmo de ser impichada, Dilma já havia perdido a condição de governar o Brasil. Uma líder política que foi ministra por oito anos, seis dos quais na pasta mais importante do país, que é eleita e reeleita, governando por cinco anos, e que, ao fim dessa jornada, não consegue ter um terço da Câmara e um terço do Senado tem de ir reclamar na cama, que é lugar quente. É preciso ser de uma incompetência assombrosa para ter tal desempenho. E Dilma se mostrou assombrosamente incompetente.
E que se note: não foi uma incompetência apenas política. Ainda que a Afastada tenha herdado muitos problemas da gestão Lula — a economia começou a destrambelhar em meados do segundo mandato —, o fato é que Dilma não apenas deixou de tomar as medidas corretivas como meteu o pé no acelerador dos erros. Ela destruiu o que restava de fundamentos da economia, o que contribuiu para minar a sua base de apoio no Congresso. A versão de que Eduardo Cunha não a deixou governar, ameaçando-a com a pauta-bomba, é falsa como nota de R$ 3.
Quando um princípio de governabilidade se anunciou, com a ida de Michel Temer, interino apenas até o fim deste mês e depois presidente sem adjetivos, os “companheiros” deram um jeito de inviabilizar a sua permanência na coordenação política. Se houve conspiração, é preciso deixar claro com todas as letras: foi o Palácio do Planalto, sob a genial batuta de Aloizio Mercadante, que conspirou contra Temer, a ponto de obrigá-lo a se demitir.
Desacertos
Ali se iniciava a espiral para baixo, sem chance de retorno. Restou, então, aos petistas inventar essa farsa ridícula do golpe, que, com efeito, se existisse, teria feições inéditas: seria o mais longo da história da humanidade, contaria com o apoio da esmagadora maioria da população, teria o suporte de mais de dois terços do Congresso e seria meticulosamente regulamentado pelo Poder Judiciário, segundo as balizas oferecidas pela Constituição e por uma lei que está em vigência há 66 anos. Logo, só se pode concluir que, para o PT, democracia é golpe. E, pois, na versão da legenda ao menos, um golpe — que consistiria em ignorar as leis — é que seria democracia.
Lamento que Dilma esteja deixando o poder com a mesma irresponsabilidade com que o exerceu. Se o descontrole das contas públicas e seus brutais erros estratégicos causaram e causarão ainda muitos dissabores aos brasileiros, sua partida também não está sendo sensata: ao acusar um golpe parlamentar, deixa claro que não reconhece o mesmo conjunto de leis e as mesmas instituições que garantiram a sua legitimidade.
No fim das contas, é preciso que se lhe pergunte: Dilma também pensa, a exemplo de Gleisi Hoffmann (PT-PR), que o Senado não tem moral para julgá-la? Se ela concorda com a sua aliada, então é preciso expulsá-la de uma das Casas do povo; se não concorda, então que se submeta o veredito.
O Brasil nem é a ditadura militar de 1970 nem é a VAR-Palmares, que é um dos grupos terroristas ao qual Dilma pertenceu.
O Brasil é uma democracia.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.