Doenças graves no ambiente de trabalho: direitos, deveres e o aspecto humano nas relações empregatícias
Ordenamento jurídico brasileiro estabelece que o empregador pode demitir seus funcionários quando lhe for conveniente, esse direito encontra limitações em alguns casos de saúde
A relação entre empregadores e empregados que enfrentam doenças graves é um tema complexo que envolve aspectos jurídicos e tem impactos sociais relevantes, os quais extrapolam os impactos individuais aos envolvidos. Não há uma lista fechada de quais são as doenças consideradas graves e que podem gerar dispensa discriminatória, mas as principais tratadas pelo Poder Judiciário são: HIV ou outra doença grave que suscite estigma ou preconceito, por exemplo, o câncer, a hepatite, a tuberculose, cardiopatia grave, cegueira (inclusive monocular), contaminação por radiação, doença de Paget, Parkinson, esclerose múltipla, fibrose cística, hanseníase, nefropatia, paralisia. Um dos principais aspectos discutidos é a questão da estabilidade do empregado, isto é, a vedação à sua demissão. A priori, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece que o empregador pode demitir seus funcionários quando lhe for conveniente, cabendo ao empregado apenas aceitar tal decisão. No entanto, esse direito encontra limitações quando se trata de empregados que enfrentam doenças graves.
A estabilidade é assegurada aos trabalhadores que sofrem acidentes de trabalho ou tem doenças ocupacionais, garantindo que não sejam demitidos sem justa causa durante 12 meses após o retorno do afastamento previdenciário. No entanto, essa garantia não se aplica a todos os casos de doenças graves, especialmente quando não há relação com o trabalho. Nesses casos, a empresa não pode demitir o empregado enquanto ele estiver com atestado médico ou afastado por um benefício previdenciário, pois o contrato de trabalho fica suspenso. Entretanto, essa situação não confere estabilidade ao funcionário, podendo o empregador rescindir o contrato assim que cessarem os motivos do afastamento.
Há que se ter cautela, contudo, ao demitir empregado que esteja em tratamento médico por doença grave. Isso, pois, embora não haja obrigação de estabilidade, a demissão sem justa causa do empregado portador de doença grave pode ser interpretada como sendo dispensa discriminatória. Isso ocorre quando há o rompimento da relação de trabalho por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, idade ou qualquer outro motivo que fere o tratamento isonômico entre os empregados. A lei veda dispensa discriminatória, e essa proteção se estende especialmente a casos de doenças relacionadas ao ambiente de trabalho, configurando doença ocupacional ou acidente de trabalho.
Existem duas exceções importantes: a primeira refere-se às doenças estigmatizantes, como o HIV, onde a demissão presume-se discriminatória. A segunda exceção diz respeito aos casos em que o empregado está em tratamento médico custeado pelo plano de saúde da empresa. Nesse caso, o TST tem entendido que a concessão da estabilidade pressupõe a exigência de cinco anos de trabalho para a empresa, uso contínuo do plano de saúde, ausência de punições e tratamento de doença grave. Quando o trabalhador retorna ao trabalho após licença para tratamento de saúde, surgem dúvidas sobre seus direitos e deveres. Os atestados de comparecimento a consultas médicas ou exames não abonam faltas, e o empregador pode descontar do salário do funcionário quando falta para realizar consulta de rotina ou exame médico, a menos que haja previsão contrária em acordo coletivo. A empresa também não é obrigada a aceitar atestados de consultas ou tratamentos multidisciplinares, tampouco tratamentos alternativos, por não haver essa previsão expressa na CLT.
Em suma, é essencial que as empresas ajam de forma justa e respeitosa, observando os preceitos legais e garantindo o tratamento digno e adequado aos trabalhadores em situações de vulnerabilidade. Embora as empresas não tenham obrigação legal de aceitar atestados de consultas ou tratamentos multidisciplinares, seria uma atitude louvável buscar formas de conciliar o tratamento de saúde dos funcionários com as demandas laborais. O diálogo e a negociação podem ser ferramentas poderosas para encontrar soluções que atendam às necessidades tanto da empresa quanto dos colaboradores. É importante destacar que o respeito à vida e à saúde humana é uma tendência crescente no mundo corporativo. Empresas que priorizam o bem-estar de seus funcionários não apenas cumprem com suas responsabilidades legais, mas também constroem um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo. Reconhecer a interdependência entre empregado e empregador é essencial para promover relações de trabalho mais equilibradas e harmoniosas.
*Especial para a Jovem Pan
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