Foro privilegiado uma ova! E o que valentes defendiam no mensalão

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 20/02/2017 08h56
Brasil, Brasília, DF. 28/07/2004. O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos (foto), empossa a nova presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Elizabeth Farina, no Ministério da Justiça. - Crédito:RAFAEL NEDDERMEYER/ESTADÃO CONTEÚDO/AE/Codigo imagem:11626 Estadão Conteúdo Márcio Thomaz Bastos - Agência Estado

Gilmar Mendes, ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, classificou de “assanhamento juvenil” a pregação em favor do fim do Foro Especial por Prerrogativa de Função. É claro que ele se refere à imaturidade da proposta, não das pessoas que a defendem. Por “imaturo”, entenda-se: mal pensado, em desacordo com os fatos, sem mediar as consequências do que se defende. Como se sabe, o ministro Roberto Barroso, do Supremo, quer restringir as possibilidades do foro especial por medida, digamos, cartorial. Ocorre que o tema é matéria constitucional e só pode ser alterado por emenda. Edison Fachin também mostrou simpatia pela tese.

“Reinaldo, e se a maioria do tribunal decidir violar a Constituição? Acontece o quê?” O país se degrada um pouco mais; diminui a segurança jurídica; ficamos ainda mais próximo de uma República de Bananas e dos bananas. Afinal, quem vai afrontar o Supremo? Depois dele, só os tanques. Como tanques cuidam de guerra (e é o certo), fim de papo. A única coisa que livra as sociedades democráticas da ditadura do Judiciário é a disposição dos juízes de seguir as regras do jogo.

Citando o jornalista americano H. L. Mencken, Mendes afirma que o simples fim do foro, como querem alguns, é um remédio simples e errado para um problema difícil. E é claro que ele tem razão. Todos estamos de acordo que há um excesso de processos em cortes superiores. Restringir as pessoas com esse direito é uma demanda do bom senso. DESDE QUE SEJA PELO MEIO LEGAL, NÃO PELO ARRANJO, COMO QUER BARROSO. Restringir, sim! Mas acabar?

Memória
Ninguém impede as pessoas de proceder a uma pesquisa antes de defender uma tese. Hoje em dia, vejo fanáticos do fim do foro especial que, no dia 2 de agosto de 2012, demonizavam Márcio Thomas Bastos, advogado de um dos réus, justamente porque este defendia que aqueles que não tinham direito a foro especial fossem enviados para a Primeira Instância. Explico. O julgamento do mensalão começou com 38 réus. Ocorre que só três — SIM, APENAS TRÊS — tinham direito a foro especial: os deputados Pedro Henry (PP-MT), João Paulo Cunha (PT-SP) e Valdemar Costa Neto (PR-SP). Os outros 35, segundo a Constituição, deveriam ter sido julgados pela primeira instância. Era o que pedia Bastos. E foi duramente criticado pelos não petistas, INCLUSIVE POR MIM. E EU NÃO MUDEI DE IDEIA.

Note-se que os ministros, ao manter todos os processos na corte suprema, o fizeram segundo as regras: a contiguidade dos casos, o seu entrelaçamento, a sua imbricação podem levar a que se julguem todos numa mesma corte, desde que se caminhe para a instância superior. Mais: conta também a isonomia. Como? Ora, um deputado e um empresário podem, por exemplo, ser sócios num crime. Julgados por cortes distintas, podem ter penas diferentes. Não faz sentido. O estado que pune é o mesmo.

Por que a crítica a Bastos?
E por que a crítica a Bastos em 2012? Ora, simples: porque dava-se de barato que a tramitação dos julgamentos na primeira instância acabaria sendo mais lenta — como, de hábito, é — e porque, em certos casos (e me abstenho de elenca-los aqui), a Justiça Federal, tocada pelos ares do localismo, tenderia a ser mais amena com os criminosos.

Os que travam luta política sem princípios não se vexam de estar sempre a enganar as pessoas, não é? Hoje, chama-se o Supremo, por exemplo, de “foro privilegiado” porque ele não puniria ninguém, o que é uma mentira grotesca. E o que o mesmo Márcio Thomas Bastos e a cúpula petista sem foro especial, José Dirceu inclusive, alegavam em 2012? Ora, o Supremo acaba sendo a primeira e a última instância. Esse foro que se diz “privilegiado” não concede às pessoas nem mesmo um direito praticamente universal das democracias: o duplo grau de jurisdição. Será mesmo isso um “privilégio”?

Mais: com penas de 16, 17 ou 40 anos, merece o STF a alcunha de tribunal da impunidade? Fosse assim, por que os 35 que não tinham foro especial no mensalão tentaram dele fugir?

Mudar, sim!
Sim, acho que é preciso reduzir o número de processos que chegam a uma corte superior. De fato, no mérito, Barroso está certo: não há sentido em mandar para esse foro quem cometeu crime fora do exercício de sua função ou sem vínculo com ela. Mas essa é tarefa do Congresso. E assim deve ser não porque a primeira instância seja o reino da Justiça, e a Superior, o reino da impunidade.

Se assim fosse, o Brasil seria, enfim, um país… justo! Tenhamos a honestidade intelectual necessária: de todas as coisa mal distribuídas no Brasil, a que mais constrange é justamente a Justiça.

Por causa dos tribunais superiores? Acho que não!

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