Impor à mulher o parto normal contra sua vontade é medieval

  • Por Jovem Pan
  • 17/02/2015 10h44
Hoje eu vou falar sobre o direito de parir.
Com a desculpa de que “há uma epidemia alarmante de cesarianas no Brasil”, o Governo, através da Agência Nacional de Saúde Suplementar, decidiu baixar uma norma que, na prática, tira da gestante, o direito de optar pelo tipo de parto que melhor lhe convém.
Pelas novas regras da ANS, os planos de saúde não serão mais obrigados a pagar por cesarianas classificadas como desnecessárias.
Através de pesquisas questionáveis, o governo alega que o alto índice de cesarianas está diretamente relacionado às elevadas taxas de mortalidades infantil e materna.
Segundo artigo do colunista Rodrigo Constantino, a Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Rio de Janeiro questiona a falta de critérios científicos dessas alegações, já que segundo a entidade, ocorre exatamente o oposto: nas últimas décadas, o aumento dos partos cirúrgicos vem sendo acompanhado por diminuição das taxas de mortalidades de mães e filhos.
Para a entidade, o Governo usa essa cortina de fumaça contra a cesariana e os médicos para esconder a precariedade do sistema público de sáude.
De fato, a tão apregoada humanização dos partos não existe no Brasil real, salvo para umas poucas privilegiadas que podem pagar por ele. Quantas podem ter uma equipe médica de plantão em num hospital decente, cercando a parturiente de cuidados e mimos?. Parir numa banheira quentinha, cercada de familiares e obstetras, mas com uma uti móvel na porta de casa em caso de complicações?
Em regra, as parturientes do sistema público não tem a assistência merecida. Durante o trabalho de parto, que pode durar de longas horas a dias, essas mulheres ficam desassistidas, não têm o acompanhamento integral de um médico. Na prática, elas não têm sequer assegurado o direito de estar perto da família durante o parto. Há relatos de partos extremamente traumáticos sem anestesia, isso sem falar na violência obstétrica, as mutilações genitais na hora do nascimento, para acelerar o parto, sem o consentimento da mulher.
Estimular o parto normal não é impor uma norma de cima para baixo. Se quer reduzir o número de cirurgias, o Governo deve primeiro dar o exemplo. É preciso assegurar a toda gestante um pré-natal completo, de qualidade. Garantir que a gestante seja atendida pelo médico de sua preferência. É vital dotar os hospitais públicos de estrutura mínima necessária para que as mulheres se sintam seguras e felizes na hora de parir, com salas humanizadas, profissionais capacitados, enfermeiros e obstetras em plantão permanente.
Não sou profissional da sade para opinar aqui qual o tipo de parto mais seguro: normal ou cesárea.
O que sei, como mulher e mãe de duas crianças, é que, antes do Governo ou de qualquer entidade, quem deve decidir sobre o tipo de parto mais adequado é a gestante juntamente com seu médico de confiança.
Assim como o vice presidente do Conselho Federal de Medicina, Dr. Mauro Ribeiro, entendo, que a nova regra da ANS fere a autonomia da parturiente, que deve ter assegurado o direito de escolher o tipo de parto mais adequado as suas necessidades.
Em pleno século XXI, impor à mulher o parto normal contra sua vontade é tão medieval quanto forçar um paciente a amputar uma perna sem anestesia. Pode?

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