Janot presta serviço a Dilma e ao PT, mesmo que aponte crimes reais de Cunha

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 21/08/2015 13h37
Montagem - Rodrigo Ramon/ Jovem Pan e Agência Senado Fernando Collor de Mello e Eduardo Cunha

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Junto com ele, em caso nem conexo, está o senador Fernando Collor (PTB-AL), acusado dos mesmos crimes.

Notem que não vou entrar no mérito das acusações, se as provas são contundentes ou não, se é justo ou não é justo. Se Cunha e, obviamente, Collor (a exemplo de quaisquer outros), forem culpados, que paguem até o osso por seus crimes. O fato de eu reconhecer que o presidente da Câmara fez e faz um bom trabalho não o torna inimputável. Se cometeu os crimes de que é acusado, que vá para a cadeia. E, mesmo com ele na cadeia, eu lhe seria grato por ter ajudado a tirar de Dilma a poder de nomear mais cinco ministros do Supremo — caso ela fique até o fim de 2018. Imaginem uma presidente moribunda com esse poder…

Assim, vale para Cunha o que vale para qualquer outro. Mas é claro que há no conjunto da obra um episódio escancarado de, como posso afirmar, “IAS” — Investigação Acelerada Seletiva. Cunha foi um dos últimos políticos a aparecer em depoimentos.

A Lava-Jato começou em fevereiro do ano passado. Cunha só entrou na dança num depoimento de Alberto Youssef dado em outubro. Julio Camargo, o pagador, negava que ele tivesse algo a ver com a roubalheira. Mudou a versão faz pouco tempo.

Cunha ser o primeiro político denunciado sugere ao distinto público que ele tinha um papel central no petrolão. E isso é apenas mentira. Ainda que tenha feito todas as safadezas que lhe atribuem. É claro que se está, neste momento, prestando um serviço ao Planalto.

Mais: ao ser denunciado junto com Collor, um político odiado fora de Alagoas, busca-se estabelecer uma conexão entre coisas que, se conectadas, só o estão nos maus hábitos.

Janot até pode estar coberto de razão, mas presta um serviço a Dilma.

Já faz algum tempo que todos temos a certeza de que Rodrigo Janot iria apresentar a denúncia contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara. E também já faz tempo que o PT e as esquerdas marcaram para o dia 20 a marcha em defesa do governo e “contra o golpe”.

Pois bem: todos sabem que a denúncia contra o deputado estava, quando menos, pronta desde ontem. Tanto é que seu conteúdo vazou. Intuo, aliás, que Janot a tinha na cabeça há muito mais tempo.

Ninguém é ingênuo nessa história — e o procurador-geral é o menos ingênuo de todos. Retardasse em um dia a sua decisão, ou a antecipasse em um, já que estava tomada havia muito, e a denúncia contra o inimigo jurado do PT e de Dilma não viria à luz ao mesmo tempo em que os “companheiros” tomam as ruas com seu pequeno exército.

Ora vejam: é claro que, para Dilma, é, como posso dizer?, um prazer ver os vermelhos na rua em sua defesa, no mesmo dia em que se vende ao país a falsa verdade de que Cunha é a grande estrela do petrolão.

ATENÇÃO! ELE PODE SER CULPADO DE TUDO O QUE ESTÁ NA DENÚNCIA, E NÃO SERÁ, NEM ASSIM, A PERSONAGEM PRINCIPAL DO PETROLÃO.

Os burros e os de má-fé, e essas coisas não se excluem, confundem ou tentam confundir essa observação com a defesa de Cunha. Eu? Não mesmo! Ele tem bons advogados para isso. Cumpro a minha obrigação ao apontar que Janot não procurou evitar a coincidência. Isso é fato. Na verdade, acho que ele a procurou — e isso é uma conjectura ancorada da lógica. Ou ele não lê o noticiário?

Há um óbvio roteiro político nessa sequência, que começou a ser escrito quando se decidiu transformar duas figuras do PMDB em peças-chave do petrolão, como se fossem suas personagens de maior expressão: a outra é Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado. Mas esse ganhou uma folga, não é?, depois que se transformou num neoconvertido entusiasmado.

Cunha já seria tema dos protestos a favor do governo, ainda que não estivesse sendo investigado. Afinal, andou aplicando derrotas ao petismo — algumas delas de caráter verdadeiramente salvador, como a aprovação do que se chamou toscamente de PEC da Bengala (deixo para outro post).

Entregar uma pauta como a denúncia contra Cunha no dia da passeata do PT é daquelas decisões que poderiam ser consideradas quase obra de militância.

Ah, sim: se Cunha está sendo satanizado pelos petistas na rua, os valentes, no entanto, não dizem uma vírgula sobre Collor. Afinal de contas, este, sim, tem sido um fiel aliado do governo e óbvio adversário da Lava-Jato.

O procurador-geral soube jogar muito bem com o calendário.

“Ah, está dizendo que Cunha é inocente?” Só um quadrúpede leria isso aqui. Estou dizendo que houve uma gestão política da denúncia, mesmo que ela diga a mais pura verdade. Isso não exclui a manipulação.

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