Moro na Comissão: um acerto e um erro do juiz

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 05/08/2016 11h17
Brasília - O juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira instância da Justiça Federal do Paraná, defendeu hoje (4), na Câmara, a revisão das penas mínimas aplicadas em casos de corrupção (José Cruz/Agência Brasil) José Cruz/Agência Brasil Na Câmara

O juiz Sergio Moro falou nesta quinta-feira na Comissão Especial da Câmara que analisa o projeto de lei elaborado pelo Ministério Público Federal, que ganhou a roupagem de texto de iniciativa popular, que propõe 10 medidas contra a corrupção. Falou bastante e sobre vários assuntos. E teve de enfrentar a fúria dos petistas, que até poderiam ter lançado questões pertinentes, não fosse o mau propósito. Estavam lá para defender um modelo que instituiu o assalto generalizado aos cofres públicos.

Vamos pôr um lead aqui artigo, em dois pontos: 1) Moro também não gosta da forma como está proposto o teste aleatório de honestidade. Apanhei de alguns ligeiros porque critiquei a ideia. Vão bater em Moro também? 2) O juiz defendeu o fim do foro especial por prerrogativa de função. A opinião é popular e mobiliza o alarido. Mas sou contra. E estou aqui, e em vários outros lugares, para dizer o que penso.

Teste
Vamos ver. Entre as propostas do Ministério Público está uma que é mesmo do balacobaco. A íntegra estáaqui. O nome oficial é “teste de integridade”.

Lá se leem as seguintes barbaridades:
“Art. 1º Esta Lei cria o teste de integridade dos agentes públicos no âmbito da Administração Pública.
Art. 2º A Administração Pública poderá, e os órgãos policiais deverão, submeter os agentes públicos a testes de integridade aleatórios ou dirigidos, cujos resultados poderão ser usados para fins disciplinares, bem como para a instrução de ações cíveis, inclusive a de improbidade administrativa, e criminais.
Art. 3º Os testes de integridade consistirão na simulação de situações sem o conhecimento do agente público, com o objetivo de testar sua conduta moral e predisposição para cometer ilícitos contra a Administração Pública.”

É coisa de regime fascista ou comunista. Como se nota, não é preciso haver suspeita ou autorização judicial para aplicar a estrovenga. É escancaradamente inconstitucional e ilegal. Provas colhidas assim não são admitidas no ordenamento jurídico brasileiro. Ainda bem! Moro defendeu, sim, um teste ou algo semelhante desde que exista uma suspeita definida e que haja autorização judicial. E o juiz falou a coisa certa: “É preciso evitar que o estado aja para criar criminosos”.

Os que me atacaram porque critiquei severamente essa proposta farão o mesmo com Moro agora?

Mais: dada a redação do anteprojeto, em breve se formariam verdadeiras máfias que atuariam para extorquir pessoas.

Foro especial
Creio que  o foro especial precisa ser disciplinado, mas não me importo de ir contra o alarido e dizer que me ponho à sua extinção. Não se aplica a lei no vácuo, mas em circunstâncias dadas.

Um país em que, por três vezes, juízes de primeira instância tiraram nada menos do que o WhatsApp do ar, punindo milhões de pessoas em nome da investigação de um crime, precisa, quando menos, pensar direito se o fim do foro especial é mesmo uma boa ideia.

Se, numa mirada retroativa de longo prazo, pode-se dizer que o expediente foi fonte de impunidade, não parece ser essa a realidade de hoje, com uma sociedade mobilizada.

Vocês sabiam que há ainda réus do mensalão — sim, de processos associados ao mensalão — que nem mesmo julgados foram na primeira instância? Mais: quando o forem, haverá as instâncias recursais seguintes. Não obstante, os que, com foro ou sem foro especial (já que o tribunal também se ocupou de réus nessa condição), foram julgados pelo Supremo ou estão presos ou já cumpriram a sua pena.

Não existe um só imperativo lógico, técnico ou de qualquer outra natureza a indicar que um juiz de primeira instância é mais “justo” do que um de um tribunal superior. Já lhes ocorreu, por exemplo, que uma demanda de caráter local, que eventualmente mobilize a sensibilidade do magistrado, pode levá-lo a decidir o destino de uma autoridade federal?

Embora em outra área da Justiça, que não a penal, ainda me lembro de limares pipocando em todos os cantos do país suspendendo a privatização de empresas públicas porque, afinal, o Sindicato de Xiririca do Mato Adentro considerava que aquela não era a melhor escolha para o país.

Vamos com calma! Estamos virando uma importante página da história brasileira. Não se pensa uma legislação para um dia nem apenas para as demandas da hora.

Uma nota irônica: tenho essa opinião faz tempo. Aí vi Roberto Barroso, ministro do Supremo, a defender o fim do foro especial. Tive um motivo a mais para concluir que é mesmo uma péssima ideia. Este senhor é o grande responsável pela proibição das doações de empresas a campanhas — vale dizer, pelo fato de o pleito de 2016 estar perigosamente exposto ao crime organizado.

Mas tratarei desse assunto em outro post.

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