O financiamento privado de campanhas: entre a transparência e a eleição exposta ao crime organizado
O Supremo Tribunal Federal deve retomar, nesta quarta-feira, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade que pode tornar sem efeito — a menos que uma PEC seja aprovada — parte da reforma política já aprovada pelo Congresso que permite a doação de empresas privadas a campanhas. A ADI pede que as doações de empresas sejam consideradas inconstitucionais. O julgamento da questão foi suspenso em dezembro de 2013 por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
Quando isso aconteceu, já havia pelo menos seis votos declarados em favor da inconstitucionalidade, o que é um absurdo autodemonstrável. Até 1994, as doações de empresas eram proibidas e só foram legalizadas justamente porque eram sobejamente feitas pelo caixa dois. Nesta quarta, ao retomar o julgamento, Mendes vai deixar isso claro mais uma vez. O ministro deve sugerir um limite para a doação. Atenção! Ainda que já existam seis votos em favor da proibição, ministros podem mudar de opinião enquanto o julgamento não é encerrado.
PEC já aprovada na Câmara constitucionaliza a doação de empresas, mas o texto ainda precisa ser aprovado por três quintos (49) dos senadores em duas votações, o que pode não acontecer. Em votação recente, o Senado, na legislação infraconstitucional, votou pela proibição da doação de empresas. Caso prevaleça mesmo essa proibição, OAB e Supremo estarão dando uma contribuição e tanto para que a política brasileira mergulhe de vez na clandestinidade.
É claro que muito dinheiro de origem ilegal vai circular nas campanhas, o que, atenção!, expõe ainda mais a política aos setores que costumam lidar principalmente com dinheiro vivo — e o crime organizado é um deles.
Espero que o bom senso baixe no Supremo; que um ou outro ministro que já votaram pela proibição se lembrem de que legislar a respeito é uma tarefa do Congresso, não do tribunal; que empresas são entes que participam da vida pública e que proibir a doação acabará levando, fatalmente, a que as eleições passem a receber um aporte muito maior de dinheiro público — isso num país que não tem receita nem para arcar com as suas despesas ordinárias.
Dada a realidade, esse aporte seria muito menor do que a necessidade, o que fatalmente faria explodir a quantidade de doações clandestinas. Chega a ser estupefaciente que um país obrigado a cortar R$ 20 bilhões do Orçamento destinado a um programa como o Minha Casa, Minha Vida flerte com financiamento público de campanha.
Não! Não é a doação de empresas que torna corruptos o país e o sistema eleitoral. Quem corrompe a ambos são os… corruptos.
Mais curioso ainda: o mesmo ministro que é o pai oculto da ideia — Luiz Roberto Barroso — é aquele que deu o mais entusiasmado voto em favor da descriminalização da posse de maconha (ainda tratarei do assunto num post específico). Barroso certamente está entre aqueles que consideram que proibir um tapa na pantera só criminaliza o tapa na pantera, certo? Mas ele quer proibir doações de empresas privadas a campanhas porque, assim, acha que vai acabar com a doação de… empresas privadas a campanhas. Obviamente, ele só vai empurrá-las para a clandestinidade.
Barroso, em suma, trata a maconha como um hábito e o financiamento do regime democrático como droga viciosa.
Está nas mãos dos ministros do Supremo contribuir para aumentar a transparência das doações privadas ou jogá-las de vez na clandestinidade, fazendo com que se confundam os dinheiros que financiam eleições e que financiam o crime organizado.
De resto, arremate-se: é mentira que o petrolão tenha nascido do financiamento de campanha. Na maior parte de sua vigência, nem mesmo havia eleição. Havia só um estado ocupado por bandidos.
PS — Ah, sim, não custa notar: o PT e as esquerdas são fanaticamente favoráveis à proibição do financiamento de campanhas por empresas. Sabem como é… Trata-se de uma gente muito correta!
Por Reinaldo Azevedo
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