Pingo Final: a fetichização da ocupação de prédio público começa a contaminar a Justiça

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 03/05/2016 11h36

A Justiça concedeu liminar para reintegração de posse do prédio

Rovena Rosa/Agência Brasil Polícia Militar entrou no Centro Paula Souza

É do balacobaco. A ser como se depreende de algumas decisões judiciais, tão logo um grupo invade um prédio público, não importa o pretexto, ele se torna uma parte com direitos protegidos pela lei. Por que digo isso? Estudantes de esquerda e extrema esquerda — PT, PSTU, PSOL e coisas ainda mais exóticas — invadiram na última quinta-feira a sede do Centro Paula Souza, na região central de São Paulo. É a autarquia do governo do Estado responsável pela administração de 219 Escolas Técnicas e 66 Fatecs.

O governo conseguiu uma liminar garantindo a reintegração de posse. Foi expedida pelo juiz Fernão Borba Franco, que questionou a legitimidade da invasão, “uma vez que o prédio não é utilizado para aulas, mas para sede administrativa de rede educacional”. O magistrado afirmou, também, que o ato dos ditos estudantes pode causar prejuízos não tanto ao Estado, mas “a muitas pessoas que dele dependem: os servidores do Centro Paula Souza e seus alunos e ex-alunos” devido ao “atraso no processamento da folha de pagamentos e à possibilidade de dano aos arquivos”.

Ponto parágrafo. Por volta das 11h, a Polícia Militar entrou no prédio, MAS NÃO PARA EFETIVAR A REINTEGRAÇÃO, E SIM PARA GARANTIR A ENTRADA DOS FUNCIONÁRIOS, o que os invasores estavam impedindo. Alexandre de Moraes, o secretário de Segurança, estava presente.

Pra quê? O juiz Luís Manuel Pires, da central de mandados, não gostou e deu 72 horas para a Secretaria de Segurança Pública explicar o ato. Mas não havia a liminar de reintegração? Havia! Ocorre que as partes ainda não tinham sido informadas.

Manuel Pires aproveitou para fazer um pouco de proselitismo:
“Um país que se anuncia sob a ordem do Direito deve respeitar os parâmetros definidos pelo sistema jurídico e não pela vontade casuística e personalíssima de agentes que se encontram no Poder. Sem mandado judicial, não há possibilidade de cumprimento de decisão alguma. Sem mandado judicial, qualquer ato de execução forçada caracteriza arbítrio, violência ao Estado Democrático, rompimento com a Constituição Vigente e os seus fundamentos”.

É mesmo? Responda, doutor: um país que se anuncia sob a ordem do Direito deve tolerar invasões, obstrução do direito de ir e vir e cerceamento da atividade profissional de terceiros? Mas essa é uma questão de fundo que nem pretendo debater agora.

Ocorre que a Polícia Militar nada fez além de garantir o direito que têm os funcionários do Paula Souza de trabalhar. Quem disse que houve reintegração de posse? Não houve. Tanto é assim que os invasores continuam lá. Uma pergunta ao doutor Manuel: os invasores também exercem arbítrio sobre os direitos dos funcionários? Vale a vontade casuística de quem se impõe pela força?

E que se note: a reintegração de posse não foi suspensa, não. Continua a valer. Será preciso apenas discutir a forma de aplicá-la.

Creio que o doutor Manuel exagera na retórica e acaba conferindo a invasores um estatuto que eles obviamente não devem ter: o de agentes de direito. Não! Eles podem reivindicar o que quiserem. Impor-se como parte, na base do fato consumado, parece coisa inaceitável na democracia.

Infelizmente, há uma corrente de juízes que passou a cultivar uma espécie de fetichização da invasão de prédio público. Não tenho dúvida de que isso é ideologia, não exercício do direito.

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