Pingo Final: Janot permite que o Renan dos 11 inquéritos lhe dê uma lição de moral democrática

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 08/06/2016 10h24
Brasília - Presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros, durante apreciação de vetos e destaques, antes de iniciar a discussão e apreciação do PL da nova meta fiscal (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil) Agência Brasil Renan Calheiros

Fique certo, leitor amigo: sempre que você confere a alguém habitualmente errado a chance de dizer a coisa certa, é sinal de que algum erro você cometeu. É o que me ocorre dizer ao considerar a reação de Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado — e do Congresso —, aos pedidos de prisão encaminhados por Rodrigo Janot, procurador-geral da República, que vazaram para a imprensa.

Antes de se pronunciar em plenário a respeito, Renan divulgou a nota que segue abaixo. Leiam. Volto em seguida.
Apesar de não ter tido acesso aos fundamentos que embasaram os pedidos, o presidente do Congresso Nacional reitera seu respeito à dignidade e autoridade do Supremo Tribunal Federal e a todas às instituições democráticas do País. O presidente do Senado está sereno e seguro de que a Nação pode seguir confiando nos Poderes da República.
O presidente reafirma que não praticou nenhum ato concreto que pudesse ser interpretado como suposta tentativa de obstrução à Justiça, já que nunca agiu, nem agiria, para evitar a aplicação da lei. O senador relembra que já prestou os esclarecimentos que lhe foram demandados e continua com a postura colaborativa para quaisquer novas informações.
Por essas razões, o presidente considera tal iniciativa, com o devido respeito, desarrazoada, desproporcional e abusiva. Todas as instituições estão sujeitas ao sistema de freios e contrapesos e, portanto, ao controle de legalidade. O Senado Federal tem se comportado com a isenção que a crise exige e atento à estabilidade institucional do País.
A Nação passa por um período delicado de sua história, que impõe a todos, especialmente aos homens públicos, serenidade, equilíbrio, bom-senso, responsabilidade e, sobretudo, respeito à Constituição Federal.
As instituições devem guardar seus limites. Valores absolutos e sagrados do Estado Democrático de Direito, como a independência dos poderes, as garantias individuais e coletivas, a liberdade de expressão e a presunção da inocência, conquistados tão dolorosamente, mais do que nunca, precisam ser reiterados.

Retomo
Já em plenário, o presidente do Senado afirmou, depois de ouvir do senador Romero Jucá (PMDB-RR) uma manifestação de inconformismo com o pedido de prisão:
“E queria dizer ao senador Romero Jucá que nós não devemos ter preocupação com os excessos que cometem contra a gente. Eu, como presidente do Senado, toda vez que cometem excessos contra os senadores, eu fico preocupado. Preocupado, sobretudo, com a soberania dos mandatos dos senadores. Mas isso não importa, não precisamos ter tanta preocupação. Temos de ter, sim, preocupação é quando cometem excessos contra a instituição. Porque aí não haverá quem corrija esse excesso”.

Por incrível que possa parecer, caros leitores — e o arquivo está à disposição para que vocês saibam o que penso sobre Renan —, a fala está correta. Notem: Renan é investigado em 11 inquéritos, nove deles dizem respeito à Lava-Jato. É figura carimbada de várias delações premiadas, ainda que, até agora, Rodrigo Janot não tenha oferecido denúncia contra ele.

Ora, permitir que uma personagem com esse perfil dê lições sobre institucionalidade dá conta do tamanho do erro cometido por Janot — um erro, acho, ao qual foi induzido pela soberba e pela arrogância. E, de certo modo, pelo espírito de reformadores do mundo que, tudo indica, tomou conta dos membros da Lava-Jato. É bom que baixem um pouco a bola da autossuficiência para não perder o foco.

Num particular, Renan está coberto de razão: uma coisa é tomar providências para meter em cana personagens que degradam as instituições; outra, distinta, é ignorar as fronteiras dessas instituições. Isso é sinal de perda de rumo.

E Renan prosseguiu com a sua aulinha:
“Queria dizer aos senadores e às senadoras: temos a mais aberta compreensão da separação dos Poderes. Mais do que nunca, é preciso exercitar a separação dos poderes e aguardar com tranquilidade, com serenidade, com responsabilidade a decisão da Suprema Corte. Qualquer movimento que fizermos a mais parecerá que estamos danificando a separação dos Poderes, que é fundamental para o equilíbrio nesse momento dramático da vida nacional. Mais do que nunca, é preciso falar pelo silêncio. Eu acabei de dizer pra imprensa que o meu silêncio será uma manifestação retumbante. Eu falarei pelo meu silêncio. E aguardarei a manifestação do Supremo”.

Se Renan fez um décimo, ou ainda menos, do que lhe atribuem os delatores, seu lugar é a cadeia. No caso em questão, no entanto, Rodrigo Janot lhe deu a oportunidade de dizer a coisa certa.

Logo, adivinhem se Janot acertou ou errou.

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