Pingo Final: Renan deixa pra lá a bobagem de encaminhar pedido de impeachment de Janot
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), desistiu, segundo informa reportagem da Folha, de dar curso a um processo de impeachment contra Rodrigo Janot, procurador-geral da República. Bem, dizer o quê? Duvido que ele tenha levado isso a sério em algum momento. E por várias razões.
Em primeiro lugar, a coisa não é assim tão simples. Seria preciso apontar os motivos. Eu estou entre aqueles que enxergam algumas falhas óbvias no comportamento de Janot e as aponto, exercendo, aí sim, o meu direito de crítica. Mas é certo que não há nenhuma evidência que justifique o impeachment.
Em segundo lugar, é claro que isso soaria para o país como aquilo que é: um desejo de retaliação. Renan começou a conjecturar mais claramente essa hipótese depois que Janot, num ato realmente doidivanas, encaminhou ao Supremo os pedidos de prisão do próprio presidente do Senado, do também senador Romero Jucá (PMDB-RR) e do ex-presidente José Sarney. Como deixou claro o Supremo, os motivos que justificavam medida tão drástica não estavam dados.
Considerada a razão pela qual pediu a prisão do trio, não deveria Janot, então, ter pedido também a de Lula, a saber: intenção de interferir na Lava-Jato? Numa mirada puramente lógica, a resposta é “sim”. Mas daí a se falar em impeachment, vai uma diferença brutal. O presidente do Senado encaminhou a questão para a área jurídica. Lá pode permanecer sem tempo. Mas é evidente que ele não levará a coisa adiante.
E se levasse? Certamente seria derrotado. E estaria caracterizado um embate com o procurador-geral que seria visto como o paladino da legalidade lutando contra um político poderoso, investigado em 11 inquéritos. Renan sabe que não tem força para isso. E, por óbvio, ainda que possível fosse, não seria bom para o país.
Abuso de poder
Na reportagem em que informa que Renan decidiu deixar a coisa pra lá, a Folha sugere que o presidente do Senado preferiu investir na aprovação de uma nova lei contra abuso de autoridade. A que está em curso é de 1965. Já tratei do assunto aqui na sexta-feira.
O projeto, cuja íntegra está aqui, é bom e nada tem a ver com a Lava-Jato. Até porque o texto, assinado originalmente em 2009 pelo então deputado Raul Jungmann (PPS-PE), hoje ministro da Defesa, antecede em muito a operação em curso, que é de 2014.
É bom a gente não começar a misturar alhos com bugalhos. Sugiro que vocês leiam o projeto. Vão constatar que se trata apenas de uma proposta que aprimora o regime democrático. Sim, também os membros do Ministério Público, segundo o texto, podem ser punidos por abuso de autoridade. Ora, se um presidente da República e o guarda da esquina estariam sujeitos, por que não um procurador ou promotor? Que se saiba, a Lava-Jato não está pedindo autorização para desrespeitar as leis, certo?
Assim, não vamos misturar as coisas. Uma é Renan ser tentado a encaminhar um pedido de impeachment contra Janot e desistir porque sabe que não daria em nada. Outra, distinta, é, por sugestão do Supremo, resgatar uma proposta, originalmente apresentada na Câmara, para punir agentes do estado que cometam abusos.
Isso não faz mal à democracia. Ao contrário: aprimora-a.
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