PMDB faz programa de oposição, ataca o governo Dilma com dureza e se mostra pronto para a Presidência
No dia em que a Presidência da República informa o adiamento do anúncio da reforma ministerial — e justamente em razão de impasses com o PMDB —, o partido leva ao ar o seu programa no horário político. Vocês constatarão que o mistério sem segredos da peça é um sujeito que conjuga quase todos os verbos: “Nós”. Alguém poderia dizer: “Ah, as falas se referem a nós, os brasileiros”. Com a devida vênia, é um jeito inocente de ver as coisas. O “nós”, inequivocamente, é o PMDB. E a legenda se coloca como alternativa ao PT e, é inescapável constatar, a Dilma. O vídeo está aí, mas recomendo que leiam antes o texto.
Não há por que economizar palavras ou juízos: trata-se, sem dúvida, de um programa de oposição. Note-se, alias, que a ministra Kátia Abreu (Agricultura), que se tornou também amiga pessoal da presidente, não só uma aliada política, está ausente.
O programa abre com uma tela negra, onde surge uma apresentadora, igualmente vestida de negro, para anunciar que o “país enfrenta uma crise econômica, que já resulta em recessão e desemprego, e uma crise política que retarda a mudança desse cenário”. O resultado é “uma sociedade angustiada, à espera de soluções, cansada de sempre pagar a conta, pessimista diante do nó, que não se desfaz”. Aos 28 segundos, de forma inequívoca, o PMDB anuncia pela voz de sua apresentadora:
“É hora de deixar estrelismos de lado; é hora de virar esse jogo”.
O leitor sabe que a “estrela” é o símbolo do PT. O “estrelismo” aí, claro!, não é sinônimo de protagonismo — até porque a palavra, com esse sentido, nem se encaixaria bem no discurso. Reescrevo a frase segundo o que ela quer dizer: “É hora de deixar o petismo de lado”. E vem o arremate: “É hora de reunificar os sonhos”. No dia 5 de agosto, Michel Temer, vice-presidente, numa entrevista muito mal recebida pelo PT, afirmou: “É preciso que alguém tenha a capacidade de reunificar a todos”.
Em seguida, a tela é tomada por retratinhos de peedembistas, e emerge, então, a figura do vice como líder inconteste do partido. Ele diz ser preciso pôr o Brasil acima de interesse partidário ou motivações pessoais”. Em contraste com um governo considerado inábil, hesitante e nada ético, Temer ensina: “Crise, se enfrenta com união, com coragem, com determinação e retidão”.
Líderes do partido passam, então, a fazer exortações quase sempre em tom oposicionista. Muitos pregam a necessidade de “reconhecer o erro”. Algumas falas merecem destaque. Renan Calheiros (AL), presidente do Senado, resume: “Governos passam (…) O que a gente tem de defender são os interesses do país”. Eduardo Cunha (PMDB), que preside a Câmara e em cujas mãos está o princípio do que pode ser o impeachment, anuncia: “Chegou a hora da verdade! Chegou a hora de dizer que país queremos”.
O mais eloquente de todos os textos, sem dúvida, foi o que coube a Moreira Franco, ex-governador do Rio e peça central hoje no esforço do PMDB de ganhar musculatura própria. Depois de Leonardo Picciani (RJ), líder do PMDB na Câmara, dizer que nada é mais normal do que o maior partido propor diálogo, Franco emenda: “Foi assim na volta da democracia, na estabilização da nossa moeda, nos avanços sociais dos últimos anos. E vai ser assim também agora na reunificação do país. O PMDB forte faz você forte, faz o Brasil forte”.
É evidente que esse é um partido que se mostra disposto a conduzir, não a ser conduzido.
E frases outras vão sendo ditas, ora pela locutora, ora por lideranças do PMDB, numa jogral. O alvo de sempre é o governo Dilma:
– “O Brasil não pode viver de promessas” (locutora);
– “Temos de saber qual é a proposta concreta para sair da crise. O Brasil precisa dessa direção” (Marquinho Mendes, deputado federal-RJ);
– “Um Brasil que se dizia tão gentil com seus filhos, de repente, resolve cobrar a conta. Isso dói” (locutora);
– “Não dá para manter o país desacreditado, e os brasileiros pagando a conta” (Fernando Jordão, deputado federal-RJ);
– “A solução não está na criação de mais impostos para tapar buracos no Orçamento” (Lúcio Vieira Lima, deputado federal-BA);
– “o Brasil e seus filhos querem ser abraçados” (locutora);
– “Temos toda a capacidade de retomar o caminho do crescimento e não vamos decepcionar” (João Arruda, deputado federal-PR);
– “E eu posso garantir que existe muita gente capaz e pronta para entregar o Brasil que foi prometido a você” (Raul Henry, vice-governador de Pernambuco);
– “Estamos descobrindo um novo Brasil; um Brasil que não se cala diante dos erros” (locutora);
– “O Brasil quer mudar. O Brasil deve mudar. O Brasil vai mudar” (locutora);
– “O Brasil quer e vai avançar” (locutora).
E, então, Michel Temer volta para encerrar o programa. A fala é eloquente:
“Quero lembrar que os mesmos motivos que geram uma crise e trazem desencanto também servem para darmos exemplo de responsabilidade e de trabalho. Assumindo e, acima de tudo, corrigindo erros, mostraremos a todos que somos um país confiável”.
Isso parece ser o norte moral de um governo, não é mesmo? Falta alguém com experiência para tocá-lo e que não se assuste com facilidade. Será que o PMDB pensa em alguém?
Temer, então, diz:
“Na minha trajetória, como cidadão e homem público, já vi e convivi com situações bem mais difíceis do que a que enfrentamos agora. Não tenho dúvida de que seremos capazes de superar esse momento (…) Tenho a clara certeza de que vamos vencer essa batalha. (…) Boa noite e dias melhores para todos nós”.
A figura do vice, que ocupa, então, a tela se multiplica em dezenas e dá lugar ao logo do partido. Um locutor, em off, põe um ponto final: “PMDB! É hora de reunificar os sonhos”.
O PMDB, não há duvida, se disse pronto para assumir a Presidência.
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