Resultado da votação derruba mitos como “Super-Cunha” e “Centrão”
O grande eleitor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) se chama Eduardo Cunha. A votação surpreendente que ele obteve foi, parece evidente, uma manifestação de repúdio ao deputado peemedebista. As coisas passaram do limite. E, como se nota, a sua influência na Câmara, hoje, é muito menor do que se pensava.
Há muito tenho insistido aqui que ele não passa de um cadáver adiado da política. E, é bem provável, de um presidiário adiado também. Os 285 votos obtidos por Maia, fiquem certos, são 285 votos contra Cunha. Para cassá-lo, são necessários 257.
Mas parece que outra, vamos dizer, “entidade” igualmente cara ao jornalismo, e odiada, pode entrar na categoria de “mito”: o tal “Centrão”, aquela gente terrível que tudo controlaria. Na contabilidade da imprensa, eram pelo menos 217 deputados. Pois é… Rogério Rosso, o dito nome do “Centrão”, obteve apenas 170 votos. Considerando que parlamentares que não pertencem a tal suposto grupo também votaram nele, temos de concluir que ou a turma se desfez ou ela é mais fama do que proveito.
Eis mais uma razão por que não acredito que a disputa deixará sequelas na base de apoio do governo, que atuou de modo correto no certame, evitando tentar passar o rolo compressor para apoiar este ou aquele nomes. Com uma simpatia inicial — e não mais do que isso — pela candidatura de Rosso —, o Planalto percebeu a ascensão de Rodrigo Maia, ancorado, inicialmente, no seu próprio partido, o DEM, e no PSDB, com apoio do PPS. Quando o PSB decidiu se juntar, sua passagem para o segundo turno estava assegurada.
Maia já tinha mantido conversações com as esquerdas. Ou, para ser mais exato, PT e PCdoB, partido saudado por ele no primeiro discurso como presidente eleito, na figura de Aldo Rebelo. A proximidade foi vista com suspeição pelo Planalto. Até porque ela contava com as bênçãos de Lula. Mas setores da própria esquerda estrilaram.
Foi então que o petismo tirou Marcelo Castro (PMDB-PI) da cartola. Obteve 70 votos, parte deles, é evidente, despejada depois na candidatura de Maia, que continuou a se apresentar como o homem do diálogo. Na entrevista que concedeu depois de eleito, voltou a se referir aos esquerdistas da Casa: “Sem a esquerda, eu não venceria essa eleição e, por isso, batiam tanto nos votos que a esquerda ia me dar. Todos nós, juntos, temos condições de construir uma agenda de consenso, onde o diálogo possa prevalecer, aprovando em conjunto medidas para o Brasil”.
O discurso é bonito, mas não sei o que significa na prática. Quem “batiam” nos votos que a esquerda lhe daria? Eu, por exemplo, bati no seu entendimento com o PT ainda na disputa do primeiro turno, o que continuo a achar uma sandice. No segundo, os critérios, obviamente, são outros.
É claro que não existe “agenda de consenso” como um norte a ser perseguido. Certos temas podem entrar nessa categoria; a maioria deles, no entanto, não. Querem ver? A renegociação da dívida dos Estados tende a juntar todo mundo, com um descontente ou outro episódicos. Mas não a reforma da Previdência ou o projeto que permite que a Petrobras não participe, se ela não puder, da exploração do pré-sal.
Um presidente da Câmara tem um imenso poder sobre o que entra ou não em votação. As esquerdas farão o diabo para tentar impedir o governo de levar adiante uma agenda de caráter, vamos dizer, liberalizante. O fato de muitos de seus representantes terem votado em Maia — para, afinal, derrotar aquele que julgavam ser o candidato de Cunha — não os torna doutores em democracia.
Esse negócio de agenda de consenso é conversa que serve para o discurso da vitória. De verdade mesmo, não quer dizer nada. Até porque será preciso enfrentar as esquerdas também nas ruas quando chegar a hora de bola ou bule, de isso ou aquilo, de sim ou não a reformas que são essenciais para o país.
E, como sabemos, as esquerdas ora saudadas por Maia atrapalham muito.
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