Versão de Baiano não bate com a de Costa. Qual bandido está mentindo? Os dois?

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 19/10/2015 11h35
Montagem/ Folhapress e Agência Brasil Fernando Baiano e Paulo Roberto Costa

A cada vez que apontei estranhezas na operação Lava-Jato, apanhei bastantinho, né? Dou de ombros. Não sou religioso nessas coisas. Só me ajoelho diante de um altar — e, ainda assim, sem nunca me despir da razão. A aguardada delação de Fernando Baiano, apontado como lobista do PMDB (o que ele diz não ser), está botando em xeque a de Paulo Roberto Costa, por exemplo.

Começam a surgir indícios de que o ex-diretor de Abastecimento pode não ter falado a verdade ou não ter falado toda a verdade. Ou por outra: pode ter mentido e omitido em seus depoimentos. A exemplo dele, quantos mais? Não! Não estou cobrando anulação da operação! Isso é tolice! Só estou cobrando cuidado. Querem ver?

Segundo informa reportagem da Folha, “Baiano contou em depoimento que pagou entre R$ 20 milhões e R$ 25 milhões para o ex-diretor da estatal. Já os valores que Costa diz ter recebido de Baiano em 2012 são muito menores: US$ 4 milhões (R$ 8 milhões), dos quais de US$ 2 milhões a US$ 2,5 milhões saíram da Andrade [Gutierrez], e US$ 1,4 milhão da Estre Ambiental. (…) Baiano diz ainda que deu entre R$ 2 milhões e R$ 3 milhões a um sobrinho da mulher de Costa e que uma das entregas foi ele mesmo quem fez, de helicóptero”.

Notem! Não se trata de uma versão que nega a roubalheira. O que Baiano está dizendo é que Costa roubou muito mais do que admitiu. E os dois fizeram delação premiada.

No dia 11 de agosto, eu comentei aqui no Jornal da Manhã o seguinte:

“Há algumas coisas na Operação Lava Jato que me parecem um pouco estranhas. Tentei achar a lógica que as explica e, confesso, não consegui. Talvez vocês me iluminem ou mesmo a força-tarefa se encarregue de responder. Vamos ver. Hamylton Padilha, um dos delatores, que está longe de integrar a lista das maiores celebridades da operação, fez um acordo de delação premiada e se comprometeu a devolver R$ 70 milhões — sem dúvida, uma bolada.
(…)
Muito bem! Se o tal Padilha topa devolver R$ 70 milhões, a gente deve imaginar que a dinheirama corria mesmo solta. Você, leitor, e a vasta maioria de seus confrades nunca nem devem ter ouvido falar do tal Padilha, uma figura marginal do petrolão.

Pois bem… Todos devemos supor que, na organização criminosa, Paulo Roberto Costa, por exemplo, exercesse papel bem mais importante do que o Padilha das Couves, certo? E Alberto Youssef? Não obstante o protagonismo da dupla, o primeiro aceitou devolver os mesmos R$ 70 milhões, valor idêntico ao de Julio Camargo, aquele que primeiro inocentou e depois acusou Eduardo Cunha. Youssef, o doleiro universal da turma, topou entregar apenas R$ 55 milhões, menos de um quinto da bolada que será devolvida por Pedro Barusco, esta em dólares: US$ 97 milhões. Vamos ver quanto custará a de Renato Duque, que era chefe de Barusco…”

No dia 13 de agosto, escrevi outro post sobre inconsistência dos valores.

Com base nessas diferenças de versão, a Folha informa que advogados de diretores da Andrade Gutierrez vão entrar com um pedido de anulação da delação de Costa.

“A versão do Fernando é absolutamente incompatível com a acusação dos procuradores e com o que diz Costa”, afirma ao jornal Juliano Breda, advogado de executivos da Andrade Gutierrez que estão presos. São três os detidos da empresa: Otavio Azevedo, presidente do grupo; Elton Negrão, presidente da empreiteira, e Flávio Barra, presidente da AG Energia. Baiano diz que nunca viu nenhum dos três discutir pagamento de suborno.

A eventual anulação da delação premiada de Costa pode resultar em perda dos benefícios negociados, que permitiram, por exemplo, que ele fique fora da cadeia.

Só pra constar: a anulação de uma delação premiada em razão de mentira ou omissão não prejudica a operação nem leva à anulação de provas. Mas é evidente que a Força-Tarefa está com um pepino nas mãos. Alguém está mentindo.

João Mestieri, advogado de Costa, diz que o mentiroso é Baiano. Bem, só a eventual produção de provas de uma versão ou de outra pode desfazer o empate. Eu não sei quem fala a verdade. Há, certamente, a possibilidade de que ambos estejam mentindo.

Eu mantenho a minha questão lógica: numa organização criminosa, não consigo entender que quem pode menos roube muito mais. Se há uma área em que a hierarquia é rigorosamente obedecida é o mundo do crime.

E, por enquanto, na Lava-Jato, bandido menor está devolvendo bem mais dinheiro do que bandido maior.

Não faz sentido.

Por Reinaldo Azevedo

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