Chegou a hora de o Congresso defender suas funções e garantias

Ou o Legislativo defende com altivez e seriedade as suas prerrogativas, ou assume de vez esse papel tosco nesse teatro denominado de ‘democracia brasileira’

  • Por Pedro Henrique Alves
  • 30/09/2023 08h00
Waldemir Barreto/Agência Senado Relator do PL 2.903/2023, senador Marcos Rogério (PL-RO) conversa com parlamentares. Senadores aprovam por 43 votos a 21 o PL que estabelece um marco temporal de referência para demarcação de terras indígenas

Para aqueles que não entenderam ainda, o governo Lula tem basicamente três formas de governar o país hoje, por meio de decretos, da compra de deputados via emendas parlamentares, e o mais assertivo em sua estratégia: através do STF. Os decretos podem ser anulados pelo Congresso, as emendas nem sempre garantem maioria nos pleitos, mas o STF, queridos amigos, esse jamais falha quando há uma mínima comunhão de vontades entre governo e ministros do Supremo. É a política usando do Judiciário para ganhar espaço, é o Judiciário se tornando político para ganhar poder. Foi assim que pautas como o marco temporal e o aborto encontraram ressonância no ativismo do nosso Judiciário nos últimos dias.

Por exemplo, semana passada, segundo um importante portal de notícias brasileiro, nosso novo presidente do Supremo Tribunal Federal, Roberto Barroso, elencou algumas de suas prioridades no cargo. Seguem elas: “combate à pobreza”; “prioridade máxima para a educação básica”; “investimento relevante em saneamento básico”; “investimento relevante em ciência e tecnologia”; “habitação popular”; “retomada do Brasil da sua posição de liderança global em matéria ambiental”; e “desenvolvimento econômico-social sustentável”. Convenhamos, nada mal para um político profissional. Quem não compraria tal proposta de governo? Aliás, onde posso votar em Barroso?

Por sua vez, no apagar das luzes de seu mandato, Rosa Weber, tal como se coordenada por forças alheias à democracia nacional e às funções do nosso Judiciário, pautou o tema do aborto, abrindo a possibilidade do assassinato intrauterino ser legalizado no Brasil sem o debate no Congresso ‒ o lugar onde se fazem leis, é sempre bom relembrar. Hoje o STF se tornou um antro de força reversa, pois é claro o desalinhamento de prioridades e visões entre a Suprema Corte e a sociedade civil; nos dois temas acima citados, marco temporal e aborto, em nenhum deles a opinião popular está do lado dos magistrados politiqueiros. O STF brasileiro, assim, se tornou uma redoma política guardada por uma pompa jurídica sem legitimidade democrática para fazer o que atualmente mais faz ‒ atravessar as funções dos demais poderes.

É bem verdade que, ao seu estilo bananão, Rodrigo Pacheco deu aquela leve cutucada na Suprema Corte ‒ seguida de mesuras e de convites efusivos ao diálogo ‒; mas é óbvio que não é o suficiente, hoje é certo que o STF irá usurpar as competências legislativas e, tal como a Janja, tentará roubar a cena em alguma viagem internacional de Lula. É certo também que, após as portas do Congresso se fecharem às vontades do governo federal, o PSOL ou o PT judicializarão as pautas negadas e, como numa típica democracia à esquerda, tentarão impor a todo custo suas vontades. Entretanto, a oposição, tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados, parece ter finalmente saído da letargia após a canetada de Weber com relação ao aborto. Como sempre digo aos meus amigos progressistas, é impressionante notar como a pauta do aborto jamais se popularizou no país, continua sendo a utopia de diretórios, a sanha das grandes organizações internacionais e, quiçá, o sonho de todo psolista em seu boieiro político.

Fato é que hoje o Congresso tem condições de recolocar o STF em seu canto republicano e defender suas funções e garantias, basta que use o exemplo do aborto para ilustrar à população o mal de um Judiciário politizado e sem freios. Afinal, se for para continuar o abuso, que fechem logo o Congresso e coloquem a chave de vez na toga de Barroso. Ou o Legislativo defende com altivez e seriedade as suas prerrogativas, ou assume de vez esse papel tosco nesse teatro denominado de “democracia brasileira”. Chegou a hora dos deputados, oposicionistas e independentes traçarem aquela velha linha entre as casas, recolocar os tigrões em suas jaulas. Já que gostam tanto de falar em “democracia” e risco “antidemocrático”, deixem-me falar uma coisinha, e que fique só entre nós: hoje o maior risco à democracia brasileira está no autoritarismo dominante de um de nossos poderes, e não em conservadores de porões, em tias do zap zap com tara pelo Bolsonaro.

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