Apesar dos indícios, hipotermia não é apontada como causa de mortes pelo IML

  • Por Jovem Pan
  • 17/06/2016 07h17
São Paulo - Maria Ivani dos Santos Lima dorme nas ruas do centro de São Paulo enfrentando temperaturas próximas a 0°, Praça Ramos, região central (Rovena Rosa/Agência Brasil) Rovena Rosa/Agência Brasil Morador de rua - AGBR

 Em países desenvolvidos, como os Estados Unidos, toda morte suspeita por hipotermia é investigada. O contexto do óbito, e não apenas a autópsia, é valioso para o Departamento de Saúde e Serviços Humanos americano. Tanto que o Centro de Controle de Doenças divulgou recentemente um estudo sobre o número de mortes associadas ao frio por lá: até 2013, a média é de 1.300 por ano no país. No Brasil, desde março, o IML diz que mais de 100 moradores de rua faleceram, seis só nos últimos dias em consequência do frio que tem feito em São Paulo, segundo a Pastoral do Povo da Rua.

Mas hipotermia não aparece nos laudos do Instituto Médico Legal, que elenca outras causas de óbito, como ataque cardíaco e pancreatite. Segundo o professor do Instituto de ensino e pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, David Oliveira Souza, isso ocorre porque a hipotermia agrava doenças pré-existentes: “A causa da morte fica confusa, porque ela pode estar associada a outros fatores, que não a baixa temperatura. É complexo você fornecer um laudo que diz “morreu por hipotermia”, o que não significa justamente que não tenha morrido por hipotermia. E normalmente, essa notificação da morte por hipotermia, é feita com o somatório do que o IML, os legistas do país observam do corpo, associado ao contexto em que essa pessoa estava, de frio extremo”.

A hipotermia é ainda um desafio para a medicina forense e, segundo Souza, ocorre quando a temperatura corporal do organismo fica abaixo dos 35 ºC: “E em um estado mais agravado, ela além a confusão mental, vai evoluir para um estado de inconsciência e perda de controle dos membros. Isso pode ser bastante agravado pela questão do uso do álcool”.

A bebida, usada pela população de rua como um sedativo, também engana a fome e “esquenta” o corpo, é o que explica o Marcos Antônio da Silva, amigo de João Carlos, 55 anos, encontrado morto nas imediações da estação Belém do metrô, Zona Leste na sexta passada: “Se tiver que falar alguma coisa, infelizmente, é que de vez em quando a gente bebia uma cachaça juntos”.

O doutor David Oliveira, que já trabalhou atendendo moradores de rua na Europa e na África, avalia que o poder público precisa reforçar a busca ativa por moradores nas ruas em dias frios, além de analisar a série histórica de mortes nos últimos invernos. A Jovem Pan questionou o SSP sobre esse levantamento, mas ainda não obteve resposta.

Reportagem: Carolina Ercolin

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