Editorial: Chefão petista se juntou às empreiteiras para repensar o socialismo
Luiz Inácio Lula da Silva participou nesta segunda da conferência “Novos desafios da democracia”, promovida pelo instituto que leva seu nome e pelas fundações Friedrich Ebert e Perseu Abramo. O convidado de honra da mesa era Felipe González, ex-primeiro-ministro da Espanha, que Nicolás Maduro, ditador da Venezuela e amigão de Lula, considera inimigo da democracia popular. Mas deixemos isso de lado agora.
O chefão petista resolveu ensaiar um discurso de autocrítica em nome do PT que é, na verdade, elogio em boca própria e esforço de se descolar do governo Dilma para tentar se candidatar à Presidência em 2018. Lula está tentando sobreviver.
Não estava previsto que falasse, mas o falastrão não resistiu e discursou duas vezes. Em uma delas, voltou a pregar a regulamentação da mídia. O homem não tem cura.
No evento em que chegou a se dizer, por duas vezes, cansado, criticou, sim, o PT. Afirmou, referindo-se ao partido:
“Eu, sinceramente, não sei se o defeito é nosso, se o defeito é do governo… Eu acho que o PT perdeu um pouco a utopia. Eu lembro como é que a gente acreditava no sonho; como é que a gente chorava quando a gente falava (…). Hoje, a gente só pensa em cargo, a gente só pensa em emprego, a gente só pensa em ser eleito, ninguém mais quer trabalhar de graça…”. E afirmou que o partido precisa de uma revolução.
Mas não ficou só aí, não. Cantando as próprias glórias, lembrou que, quando era presidente, realizaram-se 74 conferências com os movimentos sociais — é claro que fazia uma crítica indireta a Dilma Rousseff.
Com aquela capacidade de ser grandiloquente sobre o nada, pregou a necessidade de repensar as esquerdas e, pasmem!, o socialismo! Agora já sabemos por que o Brahma era tão íntimo das empreiteiras: estava construindo o socialismo de concreto armado. Deveria haver um limite para o ridículo. Mas não há.
Lula quer tirar o corpo fora. Quando diz não saber se o erro é “nosso” (do PT) ou “do governo”, é evidente que está tentando se descolar da crise e da gestão Dilma, pensando exclusivamente no seu futuro político, apesar de “cansado”.
Nada disso! Tanto a obra como a filha pertencem a Lula. Dilma é aquela que ele escolheu para sucedê-lo, mas os desastres que estão dados não são obra exclusiva da companheira. Eles começaram a ser gestados nos oito anos de mandato do Poderoso Chefão.
Foi ele que aproveitou uma janela de fantástico crescimento da China e elevação formidável das commodities brasileiras para erigir um modelo ancorado puramente no consumo, que tinha como substrato a explosão de gastos públicos, uma política de elevação de salários acima da produtividade e de contínua desindustrialização.
Foi Lula quem demonizou as privatizações, gerando um formidável atraso na infraestrutura, e que interditou o debate político opondo “nós” (eles) contra “eles” — qualquer um que não aceitasse o catecismo herético do petismo.
O que fez Dilma? Deu continuidade ao modelo. Seu erro adicional foi não mudar de rumo quando as circunstâncias já eram outras, com a China crescendo muito menos, e as commodities despencando.
É nesse ponto que ela, tendo como operador o inefável Guido Mantega, opta por bobagens novas para tentar cobrir os rombos produzidos pelas antigas: populismo tarifário, desonerações seletivas, compressão do preço dos combustíveis — contribuindo para levar a Petrobras à lona. E tudo isso, note-se, sem reduzir os gastos. Ao contrário: os gênios decidiram expandi-los, muito especialmente em 2013 e 2014, ano eleitoral.
Lula não sabe se o erro é do PT ou do governo Dilma? Ora, meu senhor! O erro é seu! Tome, que a obra é sua. Tome, que a filha — destinada a ser a Mãe do Brasil, não é isso? A Dilmãe … — também é sua.
Lula está tentando deixar a sucessora pendurada na brocha, como, aliás, venho advertindo aqui há tempos. É claro que em circunstâncias normais, ela deveria, por exemplo, ter vetado o fim do fator previdenciário sem apresentar alternativa nenhuma. Mas foi pressionada, inclusive por seu criador. A proposta que está na MP do governo continua a inviabilizar o sistema.
Aberrações
Coitado do Felipe González! Deve ter ficado espantado. Em primeiro lugar, veio para um seminário sobre democracia e teve de se haver com chororô sobre questões de economia interna no PT.
Depois, foi obrigado a ouvir Paulo Okamotto a confundir democracia — um “exercício solitário de pensar”, segundo ele — com masturbação. O mesmo Okamotto ainda afirmou que as redes sociais “complicam” o regime democrático. Finalmente, Lula encontrou um tempinho para defender Saddam Hussein, no mesmo seminário em que já havia pregado o controle da mídia.
Lula está errado, é claro! O PT não está velho. Está morto.
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