Editorial: Ministro Cardozo, o sr. acredita mais em homens que tornam virtuosos os sistemas ou em sistemas que tornam corruptos os homens?

  • Por Jovem Pan
  • 28/11/2014 18h12
SÃO PAULO, SP, 19.10.2014: DEBATE-PRESIDENTE -José Eduardo Cardozo (PT-SP) - O senador Aécio Neves (PSDB) e a presidente Dilma Rousseff (PT), que disputam o segundo turno das eleições à Presidência, participam do debate da TV Record, neste domingo (19) em São Paulo. (Foto: Rodrigo Dionisio/Frame/Folhapress) Frame/Folhapress José Eduardo Cardozo no debate entre Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) no dia 19/10/2014
Os ouvintes são testemunhas de quantas vezes alertei aqui para um absurdo que está em curso no Supremo. A OAB, Ordem dos Advogados do Brasil, patrocinou uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) contra a lei que permite que empresas façam doações a partidos políticos. Proibição total, sem exceção! Uma maioria temporária já se formou a favor da tese absurda. A votação só não foi concluída, e com um resultado desastroso, porque o ministro Gilmar Mendes pediu vista, sem data para retomar o julgamento. Por enquanto, segue tudo como está.
Sim, este programa acredita que é preciso estabelecer um limite para as doações privadas. Não parece razoável que 10 empresas respondam por 61,5% de tudo o que os partidos arrecadaram legalmente. Proibir, no entanto, as doações incorre em várias agressões, entendemos, à ordem democrática e à lógica.
Comecemos pela lógica. Não se proíbem doações legais para tentar conter as doações ilegais. Seria como proibir o consumo de tabaco para conter o tráfico de cocaína e maconha. A única consequência de uma medida estúpida como essa seria fortalecer o tráfico, que passaria a ter o monopólio também da venda de tabaco. Se hoje se estima que parcela considerável das doações é feita por baixo dos panos, mesmo sendo permitidas, se e quando forem proibidas, então vai aumentar exponencialmente a doação ilegal.
Mais: o financiamento púbico ou privado de campanha, e a sua forma, tudo isso é matéria que diz respeito ao Congresso Nacional e tem de ser debatida no âmbito de uma reforma política. O Supremo não foi feito para legislar.
O Supremo é um tribunal constitucional, com funções adicionais e excepcionais na área penal — infelizmente, note-se à margem, ele tem se ocupado mais disso do que seria saudável, o que é um mau sinal. Mas voltemos ao ponto: não se pode entregar a 11 juízes a tarefa de reformar o sistema político-eleitoral. Essa é uma atribuição da sociedade. E a voz da sociedade, com toda a sua diversidade, é o Parlamento.
Igualmente falaciosas são as teses que asseguram que a sem-vergonhice que se instalou na Petrobras deriva da doação de empresas privadas a campanhas eleitorais. Essa, infelizmente, é a tese do PT, tanto da ala majoritária como da corrente Mensagem ao Partido, à qual pertence José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, por exemplo.
Eu lamento muito que um ministro da Justiça, pré-candidato, dizem a uma vaga no Supremo — mas confio no Senado brasileiro para impedi-lo –, sustente a falácia de que é legislação que torna corruptos os homens. Ora, se querem impedir corrupção na Petrobras, por exemplo, parece-me que impedir que um partido indique o diretor de Serviços pode ser muito mais eficiente do que proibir a doação de campanha.
Felizmente, parece que o bom senso começa a fazer fruto. Em debate ocorrido no XII Congresso Brasiliense de Direito Constitucional, promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), Michel Temer, vice-presidente da República, do PMDB; o tucano José Serra, senador eleito de São Paulo pelo PSDB, e José Antônio Dias Toffoli, ministro do Supremo e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, reconheceram que a simples proibição de doação de empresas privadas a campanhas traria mais malefícios do que benefícios.
Toffoli, diga-se, parece, saudavelmente, ter mudado de ideia, esboçando uma opinião diferente da que foi manifestada, até agora, no Supremo. Enquanto o julgamento não é encerrado, ministros podem mudar o seu voto.
De resto, note-se: as empresas fazem parte, sim, do conjunto de relações sociais e devem ter compromisso com a cidadania. Não há mal nenhum que façam doações a campanhas eleitorais. O que se tem de coibir, com leis mais duras, claras e efetivas, é a mercantilização do apoio.
E lembro, finalmente, a José Eduardo Cardozo: acredito mais em homens que tornam virtuosos os sistemas do que em sistemas que tornam corruptos os homens, ministro!

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