Editorial: A sabatina de Fachin e o “pobrismo”

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 12/05/2015 19h05
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Luiz Edson Fachin, indicado pela presidenta Dilma Rousseff para substituir o ministro Joaquim Barbosa no STF, durante sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (Marcelo Camargo/Agência Brasil) Marcelo Camargo/Agência Brasil Luiz Edson Fachin

Tudo bem pensado e pesado, assiste-se a um espetáculo meio patético no Senado. O advogado Luiz Edson Fachin, que fez treinamento com assessores da base parlamentar do governo antes de participar da sabatina no Senado, passou boa parte do seu tempo, até agora, fazendo quase-abjurações.

Não pede desculpas por coisas que falou e escreveu, mas quase implora, com uma melodia na voz que lembra um pouco a de um cura de aldeia, para que nos esqueçamos de sua trajetória, de seu pensamento, de sua militância. OU POR OUTRA: FOI INDICADO POR DILMA POR TUDO O QUE FEZ, MAS PRETENDE SER APROVADO EM RAZÃO DAS COISAS QUE PROMETE.

Não chega a ser algo que excite a nossa inteligência. O Fachin que escrevia e que militava até ontem não quer uma vaga no Supremo. Quem a pleiteia é o homem que, agora, se diz um entusiasta da propriedade privada. Ficou para trás o que defende confisco de terras ditas improdutivas e expropriação das produtivas? Não exatamente. Ele pretende não abrir mão do que dsefendeu, mas também não endossa o que está escrito.

No capítulo do ordenamento da família, suas respostas são uma salada. Nega que seja favorável à poligamia e diz que a Constituição protege os filhos havidos fora do casamento. Convenham: até aí, a lei já chegou. Ocorre que o doutor se fez uma espécie de teórico das famílias simultâneas, sem que fique claro que diabos isso quer dizer. O fato é que foi um militante fanático da causa, embora, ora vejam, ele se diga um defensor da monogamia.

Uma resposta sobre a maioridade penal deixa entrever que o advogado é contrário à redução dos atuais 18 para 16 anos. Até aí, tudo bem! Ele pode pensar o que quiser. Mas se negou a responder se considera que a idade penal é cláusula pétrea da Constituição, preferindo se esgueirar. Para ele, cláusulas pétreas não são apenas aquelas definidas como tal… Ah, tá! Com a devida vênia, é cascata.

As ditas-cujas estão definidas no Parágrafo 4º do Artigo 60, a saber:
– A forma federativa de Estado;
– O voto direto, secreto, universal e periódico;
– a separação dos Poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário;
– os direitos e garantias individuais do Artigo 5º.

E pronto! O resto é feitiçaria. A maioridade penal não está em nenhum desses artigos; logo, cláusula pétrea não é, mas parece que o doutor dá a entender que sim.

Ainda sobre a maioridade, evoca, ele também, a tese cretina do “medo”. Afirmou que qualquer decisão a respeito tem de ser tomada levando-se em consideração não só a sensação de medo, mas o melhor interesse dos adolescentes e da sociedade. O melhor interesse da sociedade é pôr assassino na cadeia. O do adolescente assassino é não ser preso. Dizer que a população não pode decidir movida pelo medo corresponde a afirmar que ela não tem o direito de reagir quando agredida. A resposta de Fachin é nada!

E vou falar aqui também, ouvintes, do mi-mi-mi do pobrismo.

Quando é que vai aparecer um “pobre menino rico” para choramingar, hein?

Eu, que fui muito pobre — e não entro em detalhes porque ninguém tem nada com isso –, não aguento mais
– o chororô do pobrismo;
– a estética do pobrismo;
– a ladroagem do pobrismo;
– a vigarice intelectual do pobrismo;
– o orgulho cretino do pobrismo…

Não aguento mais o pobrismo como categoria de pensamento. Indagado por que um publicitário que trabalha para o PT faz a sua campanha na Internet — como se fosse o caso –, Fachin optou pela saída petista: NÃO SABE. Indagado quanto custa, ele também não sabe. Não sabia nem que a agência trabalhava para o partido.

Mas gravou quatro vídeos para a turma. Vale dizer: o candidato ao Supremo vai gravando o que lhe pedem sem saber para quem. Como diria Fernando Pessoa, mordomos invisíveis administram-lhe a casa.
Mas, de saída, como um Lula das letras jurídicas, saiu-se com esta:
“Sobrevivi a uma adolescência difícil e enriquecedora. Não me envergonho; ao contrário, me orgulho de ter vendido laranjas na carroça de meu avô pelas ruas onde morava. Me orgulho de ter começado como pacoteiro de uma loja de tecidos. Me orgulho de ter vendido passagens em uma estação rodoviária”.

A gente viu aonde nos levou o culto a essa tolice. É claro que sempre me seguro para não chorar em horas assim e, como sou meio briguento, tenho vontade de dar início a um campeonato de pobreza. Mas meu senso de decoro me impede.

Oh, meu Deus! Quando é que vai aparecer no Brasil um pobre menino rico que venha chorar as pitangas porque oprimido por seu pai rico, hein? Quando? Posso imaginar: “Ah, Vossa Excelência não sabe como eu sofria… Queria ir brincar de pipa na rua, mas meu pai me obrigava a ficar dando ordem para os mordomos…”.

Sempre que alguém me conta uma história pessoal triste e fora do contexto, acho que o sujeito está querendo me enganar. Eu estou me lixando se a infância de um candidato ao Supremo foi pobre ou rica. Quero saber o que ele entende das leis. Quero saber quais princípios organizam seu pensamento. Quero saber quais são seus valores. Quero saber o que ele pensa de alguns dos pilares da Constituição. Quando eu estou com vontade de chorar e não encontro bons motivos, corto cebola, não preciso de Fachin.

Chega dessa conversa mole! E com esse espírito que o país está passando por um dos momentos mais difíceis de sua história.

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