Decisão do TSE de censurar a Jovem Pan só pode ser derrubada pelo STF, diz procurador do MPSP
Segundo Cesar Dario Mariano, toda determinação judicial deve ser cumprida, mesmo quando é criticada, e sua revogação só pode ocorrer por instância superior de justiça
Nesta quinta-feira, 20, o procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo e professor de direito penal e processual penal Cesar Dario Mariano concedeu uma entrevista ao vivo para o Jornal da Manhã, da Jovem Pan News, para falar sobre a decisão do Tribunal Superior Eleitoral de restringir a emissora de publicar determinados conteúdos. Segundo ele a medida configura “censura prévia” e vai de encontro ao que está expresso na Constituição Federal do Brasil. Ainda assim, o procurador afirma que a decisão deve ser cumprida e que só pode ser revogada eventualmente por uma instância judiciária superior ao TSE, no caso o Supremo Tribunal Federal. “Qualquer decisão judicial deve ser cumprida. Ela pode ser criticada, mas vai ser determinada. Se foi feita uma resolução, ela vai ter que ser questionada no Supremo Tribunal Federal. É assim que funciona no Estado Democrático de Direito: não concordou, recorre. E é o STF que vai dizer se essa determinação do TSE é constitucional ou não. Decisão judicial se cumpre. Pode ser criticada, mas nunca descumprida. [A decisão do TSE] tem validade, porque é uma decisão de um órgão eleitoral responsável pelas eleições. Quem pode cassar essa decisão é o STF. Nós temos que seguir a hierarquia dentro do sistema judiciário para que ela seja questionada dentro da Constituição”, alegou Mariano. Ainda segundo o procurador, o TSE deve dizer até quando a decisão é válida: “Se ele não limitar, não disser que a decisão está em vigor até o dia das eleições, ela ficará em vigor indefinidamente, até que eles mesmos revoguem ou o STF diga que ela não é válida, inconstitucional”.
O procurador falou também sobre a decisão em si da justiça eleitoral, classificando-a como “censura prévia” e afirmando ser expressamente vedada pela Constituição Federal. “É muito preocupante o que eu tenho visto. Eu não esperava ver isso mais, porque, a partir da redemocratização e da Constituição de 1988, o constituinte teve uma preocupação muito grande de proteger o direito à livre manifestação do pensamento e o direito à informação. Foram direitos suprimidos durante o regime militar. Uma coisa que a gente sempre tem que ter em mente é que qualquer norma infralegal, código eleitoral, lei geral das eleições, e qualquer portaria, regulamento ou regulamento do TSE deve ser interpretado de acordo com a Constituição e não o contrário. A Constituição, em pelo menso quatro passagens, duas delas vedam a censura expressamente, uma como direito de garantia fundamental e outra como direito dos comunicadores em geral, em duas outras passagens, protege a livre manifestação do pensamento e o direito à informação. A partir do momento que se veda que determinada emissora, que os jornalistas falem sobre determinado fato, não tenho a menor dúvida em dizer que há uma censura prévia, que é expressamente vedada na Constituição Federal e é o primeiro direito a ser suprimido em regimes totalitários, despotismo, é justamente a liberdade de manifestação do pensamento e se cala a imprensa livre. Isso é extremamente preocupante”, disse Mariano.
“Eu fico muito preocupado com determinadas decisões perto das eleições, do segundo turno. Calar uma emissora, dizer que não pode divulgar fatos que realmente aconteceram. Eu vou dar um exemplo muito simples: Lula foi condenado. Ponto. O processo foi anulado por vício formal. Ponto. Ele não foi absolvido. Ponto. E também não foi condenado. Mas os fatos existiram. Todo mundo viu, os fatos foram transmitidos pela televisão. Temos delatores, temos testemunhas, temos documentos. Os fatos não desapareceram. Como se proibir de noticiar fato que realmente aconteceu? Se houve a extinção da punibilidade, o problema é processual, dentro do processo. Isso não afeta a nossa verdade. E não se pode calar uma emissora ou um jornalista para noticiar fatos. Censura não é permitida. Se alguém extrapolou esse direito [de noticiar fatos], que ele seja investigado e punido posteriormente. Mas antes? Dizer o que a pessoa pode ou não pode falar, calar veículos de comunicação social, calar uma emissora como a Jovem Pan, isso só em um regime totalitário. Isso não se faz dentro de um Estado Democrático de Direito”, completou o procurador do MP de São Paulo.
Questionado sobre a não existência de uma grande mobilização social contra, de repúdio, o TSE neste momento, principalmente de indivíduos ligados ao judiciário, Mariano disse também não entender e se questionar. “Eu me faço essa pergunta. Me parece que isso está muito mais ligado à ideologia, não gostar de um candidato X ou gostar de um candidato Y. O que os operadores do direito não estão vendo, as instituições não estão vendo, é que não é um candidato X ou Y que está sendo prejudicado, é a Constituição que está sendo vilipendiada. Uma coisa que nós temos que ter em mente é que todas as vezes em que se instala um regime totalitário em que há violação a direitos e garantias fundamentais, isso é feito a conta gotas, as pessoas se calam. Um provérbio popular que é verdadeiro é que pau que bate em Chico também bate em Francisco. Isso vai atingir a todos. A partir do momento que se cala uma emissora como a Jovem Pan, uma emissora tão conhecida e tão digna, isso pode acontecer com qualquer outro veículo de comunicação. É extremamente preocupante. E eu não canso de dizer: não consigo aceitar como as instituições responsáveis pela preservação da democracia, todas elas, instituições públicas, de entidades civis, órgãos particulares se calam, ficam quietas, e algumas até aplaudem o que está acontecendo, justamente por estar sendo prejudicado muito mais um candidato do que o outro. Quando pensamos em livre expressão de pensamento é para todos, não apenas para um ou para outro, o que vale para um vale para outro, dentro do princípio da isonomia de que todos são iguais perante a lei”, pontuou Mariano.
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