Do sonho ao pesadelo: moradores contam como vão parar em uma ocupação

  • Por Matheus Meirelles/Jovem Pan
  • 15/05/2018 11h19 - Atualizado em 15/05/2018 11h30
Agência Brasil Alta do IGP-M em maio foi forçada pela nova valorização das commodities Atualmente, 45.800 famílias vivem espalhadas em 206 ocupações, entre terrenos, cortiços e prédios de São Paulo

Duas pessoas com origens, histórias e caminhos diferentes, mas que acabaram na mesma situação.

Daniella Neves, baiana de Salvador, saiu da cidade natal com objetivo de arrumar um emprego. Com um filho pequeno, morou de aluguel nos primeiros meses até que ficou sem trabalho. Com pouco dinheiro, teve medo de viver nas ruas.

De outro lado, um refugiado com formação acadêmica e boa posição social, que teve que fugir da ditadura que tomou conta do país em que nasceu na África. Com o objetivo de prosperar em outro continente, viajou ao Brasil.

O que de fato existe em comum entre essas duas pessoas? Elas tiveram como alternativa de moradia ocupações em prédios abandonados de São Paulo.

Daniella vive na Ocupação Nove de Julho, na região central da capital paulista. Lá, paga mensalidades de R$ 200,00 para manutenção do local, que segundo ela, estava bastante deteriorado. Hoje, o espaço tem biblioteca, marcenaria, cozinhas e banheiros coletivos, além de uma lista de regras bastante rígida.

A moradora da ocupação explicou que existem exceções, mas que o foco da organização não é o assistencialismo. “O Movimento não pode abrir para todos. Tem muita gente que quer continuar nessa situação de assistencialismo pela vida inteira. O que não é o meu caso. Os coordenadores têm a sensibilidade de perceber o tipo de pessoas que estão lidando”, revelou.

Já o refugiado africano, que não quis se identificar por segurança dos familiares, acabou indo parar na ocupação do edifício Wilton Paes de Almeida, que desabou no Largo do Paissandu. Ele se lembra claramente como foram os momentos de terror e desespero pouco antes do prédio cair. “A gente havia passeado, voltamos para casa, cozinhamos, comemos e dormimos. Mas de repente gritos de ‘sai, sai, fogo, sai…’ É um susto, né”, indagou.

O refugiado teve tempo de pegar os documentos, um computador, e as mãos do filho de um ano e da esposa. Minutos depois, o edifício Wilton Paes de Almeida ruiu.

Já Daniella disse que perdeu o chão quando recebeu a notícia da tragédia. Ao me receber no espaço que se instalou na ocupação Nove de Julho, ela também contou que convive todos os dias com o medo de ser surpreendida por uma reintegração de posse. ” A gente dorme e acorda com esse medo de pedido de reintegração. Mas o que nos tranquiliza um pouco mais é quando você participa de um movimento organizado, que tem assessoria técnica e jurídica. Isso fortalece”, declarou.

O refugiado, que agora vive em outra ocupação no Centro de São Paulo, diz que ainda tem medo de que uma nova tragédia ocorra devido à situação do local. Quando perguntei sobre as expectativas que tinha ao chegar a São Paulo, ele lamentou o choque de realidade. “É uma situação triste. A pessoa quando sai da África, e vem para cá, a intenção é começar uma vida melhor. Mas quando chega no Brasil encontra uma situação pior do que vivia. É um contraste”, afirmou.

Ele também contou que as mensalidades pagas no edifício que desabou variavam de R$ 100,00 a R$ 400,00, dependendo do espaço ocupado. Atualmente, 45.800 famílias vivem espalhadas em 206 ocupações, entre terrenos, cortiços e prédios da capital paulista.

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