‘Juiz de garantias afronta sistema constitucional brasileiro’, diz presidente da AMB
Sancionada no dia 24 de dezembro — e com prazo de 30 dias para começar a valer — a Lei Anticrime que prevê o juiz de garantias ainda gera muita polêmica, inclusive nos meios jurídicos. Se não for adiado, a nova regra entra em vigor já na próxima semana.
Em entrevista ao Jornal da Manhã, a presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Renata Gil, sinalizou a necessidade do adiamento para que — se necessária — a alteração no Código Penal aconteça em um maior espaço de tempo.
De acordo com a presidente da AMB, a necessidade da implantação do juiz de garantias não é vislumbrada pelos magistrados, em geral, porque “pela Constituição, todo juiz tem que ser imparcial”.
Segundo ela, os casos de desvio de conduta de juízes são raros. “Em São Paulo não temos nenhum caso recente de qualquer violação da realidade. Além disso, para eventuais abusos, temos diversos outros meios legais para impedir que aconteçam, como: habeas corpus, CNJ e corregedorias dos Estados”
“A exceção não pode gerar uma regra — ainda mais uma regra que afronta o sistema constitucional brasileiro”, disse.
Adiamento
Para Renata, é “absolutamente necessário adiar a implementação em, pelo menos, seis meses”. “Já houve uma consulta pelo CNJ desde a sanção da lei, foi montado um grupo de trabalho. Com isso se notou uma dificuldade, no país todo, por vários motivos.”
Entre as principais justificativas, Renata alegou que 40% das comarcas do país tem apenas um juiz. A nova regra exigiria uma duplicação desses profissionais, prevendo um juiz para avaliar as provas na fase da investigação e outro para analisar o processo criminal e dar o veredito com base em seu juízo de valor.
“Há dificuldades de implantação principalmente por questões orçamentárias. Todos os tribunais estão em seu limite da lei de responsabilidade fiscal e não podem imprimir mais despesas. A lei pegou todos de surpresa com esse prazo de aplicação de 30 dias”, explicou.
Lava Jato
Questionada se esses imbróglios poderiam atrasar processos como a Lava Jato, Renata foi incisiva.
“Não importa se Lava Jato ou crime comum. A nossa maior preocupação é com roubo, furto, tráfico. A Justiça brasileira não se resume a Lava Jato. Haverá atraso porque qualquer implementação é uma reformulação estrutural, não é uma simples alteração. Há sim delongas processuais na aplicação dessa lei.”
Outros países
Para Renata, o argumento de que o juiz de garantias foi implantado e funciona em outros países não é válido. “Ele foi implementado em diversos outros países, mas lá não temos o volume alto de processos que o Brasil tem em tramitação. Temos que atender a realidade do nosso país, que tem situações difíceis de serem resolvidas.”
Renata citou como exemplo o Estado da Bahia, em que há um só juiz respondendo por sete comarcas. “Como querer criar um juiz de garantias para uma região que tem carência de juízes?”
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