Mandetta e Bolsonaro se distanciaram em meio a conflito de ideias
De um início linear aos holofotes, foi assim a trajetória de Luiz Henrique Mandetta à frente do ministério da Saúde. O médico ortopedista com especialização no exterior, demitido do cargo na quinta-feira (16), teve passagem pelo hospital militar, foi secretário de saúde em sua terra natal e, como deputado federal foi opositor ao governo de Dilma Rousseff.
O presidente Jair Bolsonaro viu no mato-grossense-do-sul a possibilidade de aliar uma escolha técnica à política, decisão que também agradaria ao DEM, partido Democratras. Uma característica de Mandetta foi decisiva para a nomeação ao cargo, ter sido primeiro tenente do Exército Brasileiro.
Empossado no dia 1 de janeiro de 2019, o ministro dava o pontapé em sua jornada na frente da pasta, evitando entrar em divididas polêmicas e se tornando, cada vez mais, uma peça fundamental no combate ao coronavírus no Brasil, carregando consigo a defesa incisiva da ciência e do isolamento social.
Entretanto, as saídas às ruas do presidente Bolsonaro para cumprimentar manifestantes em meio ao confinamento, situação que aconteceu algumas vezes, acendeu o barril de pólvora desagradando o ministro. A rota de colisão foi inevitável e começaram as divergências públicas em razão das estratégias para conter a velocidade de contágio da doença.
Em entrevista exclusiva à Jovem Pan, Jair Bolsonaro balançou os pilares da relação e expôs a situação com o seu subordinado.
“Mandetta já sabe que a gente tá se bicando há algum tempo. Eu não pretende demiti-lo no meio da guerra, mas ele é uma pessoa que em algum momento extrapolou. O Mandetta quer fazer muito a vontade dele, pode ser que ele esteja certo, mas está faltando um pouco de humildade dele para conduzir o Brasil nesse momento difícil que estamos enfrentando.”
O ministro da Saúde, que conquistou protagonismo na sociedade civil tendo em pesquisa do Data Folha 76% de aprovação frente aos 33% de Bolsonaro, rebateu a fala.
“Nós vamos continuar porque continuando a gente vai enfrentar o nosso inimigo. O nosso inimigo tem nome e sobrenome é o covid-19. Nós temos uma sociedade para tentar lutar, para tentar proteger. Médico não abandona paciente, eu não vou abandonar.”
A queda de braço tonava-se cada vez mais acirrada e elevando as trocas de farpas. Em mais um capítulo das idas e vindas a notícia que Bolsonaro teria exonerado acabou gerando a mobilização de políticos, funcionários da saúde e da própria sociedade, o que levou militares ligados ao presidente o convenceram a desistir da ideia de demissão.
Entretanto, o desgaste era evidente e a vida do ministro na pasta estava na contagem regressiva. Em outro momento, Jair Bolsonaro fez uma nova ameaça de demissão. “O médico não abandona o paciente, mas o paciente troca de médico. Você vai com o médico, ele receita uma coisa que não vai dar certo, você tem o direito de trocar de médico. Tem todo o direito de trocar de médico.”
No dia anterior à na saída, o ministro Luiz Henrique Mandetta havia rejeitado o pedido de demissão do secretário de Vigilância em saúde, Wanderson de Oliveira, dizendo que todos estavam no mesmo barco e sairiam juntos.
No último episódio da Guerra Fria na quinta-feira (16), Mandetta já demitido pelo presidente Jair Bolsonaro, em sua última coletiva, não deixou de mandar o recado ao chefe do Executivo. “Nada tem significado que não seja uma defesa intransigente da vida, do SUS e uma defesa intransigente da ciência. Fiquem os três pilares que desses pilares vocês conquistarão tudo, porque esses pilares alimentam a verdade.”
Emocionado, o ex-ministro fechou sua última fala sob aplausos de funcionários do ministério da Saúde com sentimento de dever cumprido e cabeça erguida. “Foi um prazer e um honra pra mim como brasileiro servir o meu país, a minha nação até o dia de hoje como ministro. Mas nesse minuto seguinte trabalhei em dobro pelo meu país, pela nação brasileira. Muito obrigado equipe do ministério da saúde.”
*Com informações do repórter Daniel Lian
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