Subprocuradora-geral da República: ‘É impossível implementar o juiz de garantias em 30 dias’
A Procuradoria-Geral da República respondeu a uma consulta do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) defendendo a não aplicação do juiz de garantias, novo dispositivo previsto na lei anticrime que prevê um juiz na fase de investigação e outro no julgamento dos casos, em procedimentos que têm ritos próprios, como a Lei Maria da Penha.
Em entrevista exclusiva ao Jornal da manhã, Luiza Frinscheisen, subprocuradora-geral da República, explicou que a lei possui especificidades que não necessariamente exigem ações penais. “Na lei Maria da Penha, quase todas as medidas são protetivas e se esgotam nelas mesmas, como por exemplo, o impedimento do agressor ficar próximo de casa e da família. Não há necessariamente uma ação penal. Então não é o caso de uma medida cautelar investigativa, como a do juiz de garantias, onde a ideia é que quem deu a medida cautelar – quebra de sigilo telefônico e busca e apreensão, por exemplo – não sentencie. Por isso que entendemos que nesses casos, não deve ter a aplicação do juiz.”
A discussão do juiz de garantias não estava inicialmente nos projetos anticrime apresentados por Sergio Moro e Alexandre de Moraes, segundo a subprocuradora, que comenta que número de dúvidas acerca do tema poderia ter sido melhor esclarecido se houvesse mais tempo para discussão. “Eu participei de uma audiência publica sobre o tema, e quando ele foi aprovado e foi para o Senado, teve-se a ideia de que haveria mais debate, até por que o juiz de garantias também está no processo penal. Porém, acabou tramitando rápido, e não houve discussão. Quando uma medida modifica tantas leis, sempre há duvidas – a aplicação é imediata? Quais são regras de transição? Talvez um debate maior teria deixado tudo mais claro.”
Aplicação da Lei
Luiza Frinscheise avaliou os problemas que o judiciário enfrenta para a aplicação da lei dos juízes de garantia. “Nós temos um problema imediato: 20% das comarcas e subseções da justiça federal só tem um juiz. Isso é reconhecido pelo próprio CNJ, e o grupo de trabalho que coletou as sugestões está se debruçando sobre isso. A lei diz que, nestes casos, seria feito um rodizio dos juízes de garantias. Para isso ser feito, todos os processos criminais do Brasil tem que ser eletrônicos, e isso ainda não acontece. Segundo, esse rodízio não pode ser semanal, trazendo um juiz de garantia a cada semana, por exemplo. Isso feriria o principio do juiz natural, que é saber quem vai decidir sobre determinado caso”, explica.
“Para implantar o juiz de garantia, certamente precisamos de mais tempo. É por isso que um dos pedidos é que se defira um tempo maior para implementação da lei. Ela veio com o que chamamos de vacatio legis [tempo entre o dia da publicação da Lei e o dia em que ela entra em vigor] de 30 dias. É impossível implementar o juiz de garantias em 30 dias.”
Custos e precisão orçamentária
Algumas associações de magistratura como a Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUF) já entraram com ações diretas de inconstitucionalidade abordando, entre outros temas, o impacto da aplicação do juiz de garantias.
Embora já se tenha levantado a hipótese de que a reorganização da justiça não implicaria novos custos, a subprocuradora não acredita que isso vá acontecer. “Eu acho que implica, ainda que seja possível fazer dentro do orçamento. Não é uma mera redistribuição, a lei cria uma categoria completamente nova no sistema acusatório que é o juiz de garantia. Ela separa o juiz que defere medidas cautelares daquele que irá apreciar a instrução da ação penal e a sentença. Se isso não for feito cuidadosamente por um número de juízes razoável, vamos ter um novo problema de tempo, procrastinando as ações penais. E isso não pode ser feito, pois a lei traz prazos para prisões preventivas, por exemplo.”
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