Moro sobre o pacote anticrime: ‘O tempo do Congresso a ele pertence’

De acordo com o ministro, houve um “ruído superdimensionado” com Rodrigo Maia, mas agora o processo “está correndo bem”

  • Por Jovem Pan
  • 01/05/2019 18h52 - Atualizado em 01/05/2019 19h54
RENATO S. CERQUEIRA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Ministro espera que o pacote seja votado ainda no primeiro semestre deste ano

Em entrevista exclusiva ao programa Os Pingos nos Is, da Jovem Pan, nesta quarta-feira (1), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, comentou a tramitação do pacote anticrime na Câmara dos Deputados e afirmou que respeita o tempo de deliberação dos parlamentares: “O tempo do Congresso a ele pertence.”

Moro reconheceu ainda que o desentendimento entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o governo federal atrapalhou o andamento do projeto na Casa. “Temos conversado bastante com o presidente Rodrigo Maia. Houve ali algum ruído, a meu ver foi superdimensionado, mas o processo está correndo bem agora”, destacou.

Ele espera que o pacote seja votado ainda no primeiro semestre deste ano. “O papel do Executivo é apresentar o projeto e convencer os parlamentares do acerto, de que tem pontos ali que são relevantes”, explicou. “Claro que nós gostaríamos que isso fosse votado o mais breve possível, mas nós temos que respeitar.”

Sergio Moro ressaltou que um dos seus principais papéis é conversar com parlamentares e que não tem sentido resistência por parte dos congressistas. “Como é um novo governo e um novo Congresso, as relações estão sendo construídas”, disse. “Existe uma dificuldade em relação a isso, que não afeta o meu projeto em particular, mas basicamente todos os projetos do governo. É algo que vai ser solucionado com o tempo e vai ser construída uma boa relação”, antecipou.

Pontos do projeto

O ministro também discutiu alguns pontos polêmicos do projeto e rebateu críticas de que a proposta defendia excessos das forças de segurança. “[O projeto] tem algumas medidas relacionadas à legítima defesa que ao nosso ver são consistentes. Alguns falam que seria uma autorização desmedida para excessos das forças de segurança, mas não tem nada disso”, afirmou. “O dispositivo mais controvertido é uma cópia de um artigo do Código Penal alemão e ninguém fala que o Código Penal alemão atual é uma lei arbitrária ou coisa parecida”, disse, comentando a seção que permite a redução da pena no contexto de legítima defesa em caso de “medo, surpresa ou violenta emoção”.

Moro ainda comentou a indicação de Jair Bolsonaro de que ele planeja dar retaguarda jurídica para policiais em serviço. O ministro afirmou que ainda não discutiu o assunto com o presidente. “O presidente é o chefe, ele que dá a última palavra, ele que manda”, disse. “Essas conversas dentro do governo sobre propostas e projetos são naturais, mas é oportuno que a gente deixe para discutir mais oportunamente essas questões quando elas forem publicizadas”, pediu.

Combate ao crime

Mesmo sem a aprovação do pacote anticrime, Sergio Moro está comandando ações de combate ao crime organizado desde que assumiu o Ministério da Justiça. Uma delas foi a transferência de líderes do PCC para presídios federais, em conjunto com o governo de São Paulo. “Não adianta prender só quem está na base da pirâmide, é preciso prender as lideranças, e presas as lideranças, elas têm que ser isoladas”, explicou sobre a estratégia.

O ministro reconheceu que o problema das facções criminosas tem crescido muito no Brasil. “Organizações como o PCC eram um problema regional e se tornaram um problema nacional”, disse. Ele usou a crise de segurança pública no Ceará, em janeiro deste ano, como exemplo. “Eu nunca tinha visto organizações criminosas tentarem explodir viadutos”, contou. “Isso são sinais amarelos que nos alertam para a premência do problema e a necessidade de nós não só tomarmos medidas robustas contra as organizações, mas melhorar nosso aparato legal.”

Ele explicou que uma das ações do Ministério foi a formação de uma força de intervenção penitenciária para atuar em presídios com problemas de controle. “Desde janeiro, houve queda expressiva de índices de criminalidade onde essas forças realizaram intervenção. Isso permite uma conclusão provisória de que de fato há uma correlação entre a diminuição desses índices com o melhor controle dos presídios”, afirmou.

Mas um dos maiores problemas que Moro encontrou na pasta foi o fato de não haver estatísticas detalhadas sobre o número de presos no país. “Temos uma tragédia estatística no Brasil”, resumiu. “Precisamos melhorar essa área estatística em matéria prisional, precisamos conhecer o problema para enfrentá-lo”, explicou.

O ministro ainda defendeu que a prisão não é a única medida para o combate ao crime. “O problema da criminalidade não é só um problema de segurança pública punitiva, então nós temos que pensar políticas sociais, políticas que incrementem as oportunidades econômicas e políticas de urbanização que restaurem ambientes urbanos degradados”, disse. “Isso não significa que não é importante tirar o criminoso de circulação e passar a mensagem de que quem infringir a lei cometendo um crime vai ter uma punição, são estratégias que não são excludentes”, ressaltou.

Corrupção

Além do combate ao crime organizado, o combate à corrupção é outra bandeira levantada por Moro. A área está contemplada no pacote anticrime, que foi apresentado ao Congresso separando corrupção e crime de caixa 2. “Quando o projeto foi apresentado, chegaram até mim alguns ruídos de que alguns parlamentares se sentiram incomodados dessa questão do caixa 2 ter sido tratada junto com crimes como corrupção, crime organizado e crime violento. Se é esse problema, vamos apresentar em separado, mas nós também vamos trabalhar para que o projeto sobre o caixa 2 seja aprovado”, explicou o ministro. “Minha posição sempre foi muito clara que esses crimes são muito graves”, disse, ressaltando que considera a corrupção mais grave que o caixa 2.

Sergio Moro também comentou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a Justiça Eleitoral pode julgar os crimes da Lava Jato. Para ele, a decisão foi equivocada. “A gente tem que ter uma visão pragmática dessas coisas, não é uma questão conceitual, é uma questão de onde funciona e onde não funciona. Na nossa avaliação, esses casos podem ser tratados mais adequadamente na Justiça Federal ou Estadual, na Justiça Eleitoral, não, a função dela é outra”, explicou. “É uma posição respeitosa ao STF, mas do ponto de vista do que funciona e do que não funciona, é melhor deixar como estava.”

Confira aqui a outra parte da entrevista

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