“Lava Jato vai se afundar em burocracia”, critica presidente da Fenapef
Luís Antônio de Araújo Boudens, atual presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), esteve na bancada do Pânico na Rádio nesta terça-feira (18). Entre diversos outros assuntos, o convidado comentou a recente redução na equipe designada para a força-tarefa da Operação Lava Jato e a contingência de 44% do orçamento previsto para 2017. Sob o governo de Michel Temer (PMDB), este foi o primeiro corte expressivo no efetivo de investigações.
“A Lava Jato está ameaçada. Uma hora ela vai acabar, tem um limite de operacionalidade. Essa desconfiguração do formato de força-tarefa imediatamente vai burocratizar a investigação. Hoje os relatórios produzidos vão direto para o Ministério Público, que analisa e oferece denúncia”, disse. “O maior crime que poderia ocorrer é colocar a Lava Jato na nossa estrutura atual, que não resolve nada (…). Vamos vê-la se afundar em burocracia”, completou.
Boudens explicou que quem determinou essa mudança foi a própria superintendência da polícia. Não seria possível afirmar de início, então, que a cena teria sido orquestrada por governistas ameaçados com a possibilidade de serem investigados. Mas confirmou que a suspeita está, sim, sendo analisada. “Quem determinou essa mudança foi a própria gestão da polícia. Houve a ‘canetada’. O que estamos avaliando é se houve pressão externa”, afirmou.
Sobre Sérgio Moro, com quem já trabalhou diretamente, coube apenas elogios. “Trabalhamos direto com a Justiça Federal. Conheço vários juízes. O Moro se destaca pela coragem. Hoje, apresentar a postura dele é uma raridade no nosso país. Temos colegas que também fazem esse trabalho, mas sem a exposição dele. Corajoso temos certeza que ele é. E as sentenças são bem calçadas, ele tem muito conhecimento na área de crimes financeiros. Outras coisas ficam para análises paralelas”.
Desmilitarização da PM e legalização das drogas: discussões necessárias
Durante sua participação na bancada, Boudens comentou também a alarmante situação das polícias brasileiras e revelou que defende uma ampla mudança na estrutura da segurança pública – incluindo as discussões da desmilitarização da Polícia Militar e da legalização das drogas.
“Temos várias investigações paradas na PF por causa do nosso modelo arcaico. Usamos o modelo que Portugal trouxe e nem Portugal usa mais! É isso que estamos discutindo, uma mudança nas estruturas policiais. Temos que discutir a desmilitarização, o Brasil tem medo da polícia. Temos que discutir a distorção salarial. A polícia que te atende não está na estrutura que vai investigar. Quando a pessoa é furtada ela nem liga, vai embora, não chama a polícia”, disse.
“Não preparamos nossas estruturas para a democracia de 1988. A legalização de drogas vai ter que ser discutida. Se liberasse hoje, o país viveria um caos. Teria que ter fiscalização da vigilância sanitária – que não fiscaliza direito nem a carne e o leite. Mas temos que questionar, sim. Existem bons argumentos para isso. Nós não temos posição única na polícia, mas acho que o país precisa pensar sobre tudo”, completou, citando ainda a discussão sobre legalização do porte de armas.
Falta de eficiência em prevenção e investigação
O convidado falou por fim sobre a descrença da população nas instituições policiais, que, segundo ele, vem mais uma vez da burocratização do processo investigativo. Quando o indivíduo é furtado, por exemplo, liga para o 190 e espera algum policial disponível aparecer. Em seguida, precisa fazer entrevista e preencher o BO. É encaminhado então para uma delegacia – para no local começar “tudo do zero”.
“Existe um conceito moderno de ‘polícia completa’. Em todo país moderno é assim. Não pode existir economia de estrutura. Temos um mundo de atividade na PF e precisamos de mais gente! Tem gente de uma área trabalhando em outra, não pode”, disse.
Para exemplificar, comparou a Polícia Federal brasileira ao FBI (Departamento Federal de Investigação dos Estados Unidos) . Em nossa PF, há 12 mil federais ativos e 4 mil inativos. No FBI, por sua vez, apenas a área de investigação possui 32 mil profissionais.
“Existem grupos que estão na gestão e não querem mudar, eles se sentem ofendidos. No FBI também tem uma estrutura justa, você cresce de acordo com sua capacitação. Não é que nem aqui que você entra como delegado e já chefia um setor”, concluiu.
A polêmica da pausa na emissão dos passaportes, a fragilidade do Brasil no controle das suas fronteiras, a corrupção existente dentro da própria PF e os altos índices de suicídios de policiais também foram discutidos durante a tarde. Confira a íntegra no vídeo!
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