Pesadelos frequentes e violentos podem estar associados ao Parkinson
A conexão entre o distúrbio do sono REM e a proteína de Parkinson
O Transtorno Comportamental do Sono REM (TCSREM) é um distúrbio do sono em que os pacientes vivenciam fisicamente seus sonhos durante a fase REM. Comumente associados a pesadelos intensos e violentos, esses episódios incluem chutes, socos, gritos e simulações de lutas, ocorrendo devido à perda da atonia muscular que normalmente mantém o corpo paralisado durante essa fase do sono. Além de representar riscos físicos tanto para o paciente quanto para seu parceiro(a), o TCSREM afeta significativamente a qualidade de vida e o bem-estar emocional.
Estudos longitudinais indicam que o TCSREM é frequentemente um marcador precoce de sinucleinopatias, como a Doença de Parkinson (DP) e a Demência com Corpos de Lewy (DLB). Uma meta-análise revelou que a taxa de conversão do TCSREM para doenças neurodegenerativas é de 33,5% em cinco anos, 82,4% em 10,5 anos e 96,6% em 14 anos. Outro estudo prospectivo estima que até 65% dos pacientes com TCSREM idiopático desenvolvem uma sinucleinopatia, e dados de longo prazo indicam que mais de 80% dos casos isolados evoluem para distúrbios neurodegenerativos relacionados à alfa-sinucleína.
Achados neuropatológicos recentes corroboram essa relação. Autópsias de 20 indivíduos com TCSREM diagnosticado por polissonografia revelaram depósitos de alfa-sinucleína em regiões cruciais para o controle da atonia do sono REM, como tronco cerebral, sistema límbico e córtex. Em pacientes com DP ou DLB, esses depósitos foram amplamente distribuídos e associados a patologias coexistentes, como Alzheimer. Nos casos de TCSREM sem outras doenças neurológicas, as alterações permaneceram restritas ao tronco cerebral e sistema límbico, sugerindo que o TCSREM pode representar um estágio inicial de sinucleinopatias.
A identificação precoce do TCSREM oferece uma janela para intervenções terapêuticas antes do surgimento de sintomas motores ou cognitivos mais evidentes. Essa oportunidade inclui estratégias não farmacológicas, como exercícios físicos, e a inclusão de pacientes em ensaios clínicos de medicamentos neuroprotetores ainda na fase prodrômica, potencialmente retardando ou prevenindo a progressão da doença.
O acompanhamento contínuo desses pacientes também é essencial para identificar outros marcadores prodrômicos, como disfunções motoras leves, constipação, hipotensão ortostática e hiposmia. Além disso, terapias como melatonina e clonazepam ajudam no controle dos episódios de sono e na prevenção de lesões, melhorando a qualidade de vida e o prognóstico.
Pesquisas futuras concentram-se na fisiopatologia do TCSREM e na identificação de biomarcadores, como alterações neuroquímicas e na neuroimagem, para prever a conversão fenotípica para doenças neurodegenerativas. Estudos exploram também intervenções farmacológicas que inibam a agregação de alfa-sinucleína, com o objetivo de retardar ou prevenir a progressão para DP e outras sinucleinopatias.
Embora os ensaios clínicos em TCSREM enfrentem desafios, eles oferecem oportunidades valiosas para testar tratamentos modificadores de doença em estágios iniciais, quando a neuropatologia pode responder melhor ao tratamento. Tecnologias móveis para monitoramento objetivo dos episódios e avanços em biomarcadores estão sendo desenvolvidos para aprimorar a eficácia desses estudos.
*Por Dra. Talita Balieiro – CRM: 24036-DF RQE Nº: 18222
Neurologista especialista em distúrbios do movimento do Hospital Sírio-Libanês de Brasília
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