Discurso de Covas foi cordial demais para o momento que o país vive

Prefeito reeleito em São Paulo criticou indiretamente o presidente Jair Bolsonaro, mas deveria ter sido mais radical; além disso, nem citou medidas para a Cracolândia

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 02/01/2021 13h13
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ALEX SILVA/ESTADÃO CONTEÚDO homem careca de terno cinza usando máscara azul e sentado em cadeira Bruno Covas tomou posse como prefeito da cidade de São Paulo nesta sexta-feira, 1º de janeiro

Convirá escrever sobre a posse do prefeito Bruno Covas  nesta sexta-feira, 1º de janeiro. Afinal, ele é prefeito de São Paulo, que dizem ser uma das maiores cidades do mundo, o que de fato é. E uma das piores também. Covas fez um discurso repleto de boas intenções. E indiretamente, sem citar nome de ninguém, criticou timidamente a política negativista do presidente Bolsonaro. Só timidamente. Há momentos em que nada tem de ser timidamente e é preciso dar nome a quem está se criticando. Foi um discurso cordial demais para este momento que vive o país. As palavras civilizadas são necessárias, mas, em muitos casos, depende da circunstância. Covas deu ênfase ao combate à Covid-19, que cresce cada vez mais em São Paulo. E cresce também no país inteiro, já que a política federal para o coronavírus é para isso mesmo: desacreditar tudo, como se tudo fosse uma grande mentira global, incluindo as mortes, que são milhares. No que nos diz respeito, o Brasil já conta mais de 195 mil.

O prefeito afirmou textualmente “que o negativismo está com os dias contados na cidade e que o vírus do ódio e da intolerância também precisa ser banido da sociedade”. Está certo o prefeito. Mas falar é uma coisa e trabalhar pela ideia é outra. Seja como for, o prefeito Bruno Covas disse estar confiante no futuro, em dias melhores para todos os brasileiros que vivem em São Paulo. Afirmou que vai retomar o crescimento do emprego na cidade que, para ele, é a forma mais correta de enfrentar as desigualdades. Uma coisa é certa: Covas não quer ouvir falar em negativismo que vem alterando o comportamento das pessoas em relação a quase tudo. Chega disso. Cansou. O negativismo pregado especialmente do Palácio do Planalto, em Brasília, contraria a própria vida. Vejam, por exemplo, o que acontece em relação à pandemia. O negativismo trata da doença com absoluto desdém. O prefeito quer que prevaleça o diálogo, a conversa, a construção coletiva. Disse que no caso da pandemia o inimigo é um só: o vírus. O momento exige união.

De acordo com o prefeito, as crises sociais e econômicas provenientes da pandemia são profundas. Palavras do prefeito: “Por isso é fundamental conversar de forma generosa e aceitar as diferenças. Ninguém pode ser dono da verdade”. Esse “ninguém pode ser dono da verdade” tem como endereço o presidente Bolsonaro. Não falou claramente, mas é isso. E é bom que se fale isso, neste momento cada vez mais difícil para o país, mergulhado num pântano de incertezas em relação à vacinação que ninguém sabe ao certo o que ocorre. Muito se fala, mas pouco se resolve. Covas foi certeiro nesse ponto, ao dizer que a maioria da sociedade segue as regras a serem seguidas de combate à Covid-19, mas uma minoria insiste em colocar seus interesses em primeiro lugar, em vez de pensar no coletivo. O prefeito está correto. É exatamente isso que acontece com as mentes alucinadas que andam por aí a pregar o caos no país.

No entanto, o prefeito garante que há uma luz no fim do túnel. As vacinas vão chegar e a cidade de São Paulo está pronta para a vacinação em massa. Observou que São Paulo votou pela moderação e em favor da ciência. Por isso, o obscurantismo e o negativismo estão com os dias contados. Tomara que seja assim, senhor prefeito de São Paulo. A mim, que sou um simples cidadão, talvez de 5ª categoria, estranhou-me o senhor nada falar da grande chaga de São Paulo, a Cracolândia, que se transformou numa cidade dentro da cidade. Quando é que aquilo vai acabar? Todo mundo sabe quem leva a droga, conhece os traficantes e os bandidos que habitam aquele lugar e nunca acontece nada para ninguém. De vez em quando a polícia vai até lá agredir aquelas pessoas que apenas esperam a morte chegar para se livrar de tudo isso. Os traficantes ficam observando aquelas cenas cada vez mais graves. E o município da Cracolândia está aumentando de tamanho. A cada dia surgem novos párias que passarão o dia ali deitados se drogando sem parar. E a droga corre solta. E nada se faz. Ou não há mais nada a fazer? Do discurso de Bruno Covas restou essa tímida crítica ao comportamento do presidente Bolsonaro para com a pandemia. Tinha de bater com mais força. Tinha que ser mais radical, até. Essa palavra mansa e civilizada em alguns casos não resolve coisa nenhuma. E não se resolvendo coisa nenhuma, tudo fica como está.

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