Pandemia tira da mulher o emprego e dá em troca a violência doméstica
Confinamento faz disparar índices de violência dentro de casa (que às vezes termina em feminicídio), e isso está diretamente ligado à forma como o sexo feminino sofre mais com a falta de trabalho
Os males da pandemia ainda estão para ser medidos. No que diz respeito à saúde, já se tem ideia. Mas o coronavírus provoca problemas sérios de todos os tipos, inclusive nas áreas sociais e de comportamento. Lamentavelmente, existem aqueles que negam tudo, os chamados negacionistas, que aprendemos a conhecer no Brasil. O negacionismo, no fundo, é uma forma covarde de fugir da realidade e da verdade escancarada a quem quiser observar. E entre os muitos problemas sociais da pandemia, por aqui destaca-se o espancamento de mulheres, muitos seguidos de morte. Uma pesquisa revela que uma em cada quatro mulheres acima de 16 anos de idade sofreu algum tipo de violência desde que a pandemia começou. Isso representa mais de 17 milhões de mulheres brasileiras vítimas de violência sexual, física ou psicológica. Um quadro lastimável, que se agrava cada vez mais.
É o que revela a pesquisa “Visível e Invisível: a vitimização de mulheres no Brasil”, realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Datafolha. Chegou-se a um ponto inaceitável. No Brasil, infelizmente, acostumou-se a se deparar com notícias que mostram a mulher como vítimas constante de homens especialmente machistas, que as veem como propriedade. Essa violência é sofrida em maior número dentro de casa (49%), mas também há porcentagem considerável na rua (19%). Na verdade, não se trata de um problema exclusivamente brasileiro. Fatos assim se repetem em outros países. Antes da Covid-19 se alastrar, organismos internacionais e entidades de defesa dos direitos das mulheres fizeram alertas a partir do que ocorria na China e em toda Europa. Os lockdowns mais rígidos, as dificuldades de locomoção e o isolamento social em vários países agravaram a situação. O confinamento fez aumentar a violência.
No Brasil, existem outros fatores determinantes para as agressões e mortes: a dificuldade de garantir a autonomia financeira, a perda do emprego, uma renda mínima para sobrevivência e a impossibilidade de trabalhar. Mais da metade das mulheres agredidas relataram que, permanecendo dentro de casa, deram mais chances ao agressor. Há outro fator, no país, igualmente fundamental: a impossibilidade de acionar a polícia ou ir até a uma delegacia das mulheres, embora essa atitude, em muitos casos, signifique uma sentença de morte. No Brasil, o que mais pesou foi a redução de renda das famílias. E o desemprego na pandemia tem atingido mais o sexo feminino. Basta dizer que, nos primeiros 15 dias de confinamento, em março de 2020, mais de 7 milhões de mulheres perderam o emprego. De acordo com dados do IBGE, no primeiro trimestre de 2021 a taxa de desocupados entre homens passou de 12%, e entre as mulheres chegou a 18%.
Em 2020, mais de 7 mil mulheres foram atendidas pelo Projeto Justiceiras, 35% delas sem nenhuma renda. A dependência econômica não permite que a mulher procure outro lugar para viver, em casa de parentes, por exemplo. Então, ficam à mercê de uma violência que se repete e se agrava cada vez mais. Enquanto tudo isso acontece, a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, em 2020, só gastou 24% por cento da verba de R$ 120 milhões aprovada pelo Congresso Nacional para a proteção à mulher, de acordo com dados do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). E não gastou por quê? Qual a razão? Afinal, o que a ministra Damares está fazendo no seu ministério? Evidentemente, ninguém vai responder a essas perguntas. Responder o que, se essas respostas são sempre evasivas? O problema segue como está. As mulheres são espancadas nas ruas e dentro de casa, tantas vezes assassinadas. Infelizmente, no Brasil tudo tornou-se normal.
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