Propaganda política na televisão mostra um Bolsonaro que não existe

Presidente aparece de terno, doce, carinhoso, de fala mansa, mas ele não deseja a aura de bonzinho, ‘paz e amor’

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 03/06/2022 14h40
ANTONIO MOLINA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO Jair Bolsonaro Presidente Jair Bolsonaro (PL)

O presidente Jair Bolsonaro não está gostando dos rumos da sua pré-campanha, tanto que deu a ordem para os responsáveis resgatarem a agenda ideológica que o elegeu em 2018, afirmando que só assim será possível mobilizar seus eleitores. Bolsonaro deseja, também, uma forte discussão de seus aliados de temas que enfrentaram problemas no Congresso. A bancada bolsonarista já está preparada. Essa questão vem perturbando a cabeça do presidente há algum tempo. É um assunto que tem conversado somente com seus assessores mais próximos. Bolsonaro acha que está na hora de mudar tudo. Pior é que a propaganda política na televisão tem mostrado ao eleitor um Bolsonaro que nunca existiu na face da Terra, todo delicado, até terno. O que é isso? O presidente não deseja a aura de bonzinho. Isso não é com ele. Quer de volta o clima de 2018.

Acompanhando o movimento do pai, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) lançou um programa de treinamento com o objetivo de ensinar os simpatizantes a “enfrentar a esquerda”. Vários outros temas serão debatidos pela base, como o armamento da população, a política de drogas e a proibição do aborto. Esses temas não foram adiante nas discussões no Congresso. Surgiram e desapareceram de um dia para outro. Bolsonaro quer tudo de volta e com muita discussão para dar manchete em todo lugar. Com 3 anos e 5 meses de mandato, o governo Bolsonaro se dedicou mais à questão econômica, deixando de lado a ideologia. Na questão ideológica, o único item que passou foi o direito dos pais educarem seus filhos em casa. E mesmo assim o assunto não está resolvido inteiramente. Vai acabar no STF.

Ao custo de R$ 197, o filho Eduardo Bolsonaro lançou o curso “Prepara Brasil”, com aulas online “indicando os caminhos da liberdade”. Também vem realizando lives referindo-se ao curso hospedado em uma plataforma do Arizona, nos Estados Unidos. O treinamento tem o objetivo de “formar uma direita preparada para enfrentar as mentiras da esquerda”. O ex-ministro e pré-candidato ao governo do Rio Grande do Sul, Onyx Lorenzoni, e a ex-ministra Damares Alves, são dois dos professores que ensinam a “conquistar a liberdade”. Bolsonaro gostou. Sua determinação significa ir à luta e discutir tudo que a esquerda defende. Não importam os termos utilizados nesse embate. A ordem é mesmo voltar a 2018, quando o então candidato Fernando Haddad se encolheu e foi massacrado especialmente pelas redes sociais bolsonaristas. Alguns dos chamados “cientistas políticos” dizem que esse resgate determinado por Bolsonaro de temas ideológicos não faz sentido. Xico Graziano, por exemplo, afirma, em coluna no site Poder 360, que esse costume de dividir o mundo entre “esquerda” e “direita” perdeu o sentido na sociedade contemporânea em plena era digital. Hoje novos dilemas movimentam a opinião popular. Graziano lembra que a Guerra Fria acabou e aí surgiu Bolsonaro, militar e moralista, dizendo: “ Vamos acabar com essa put**** de Brasília”.

Parece que é isso que novamente estará em pauta. Significa partir para a ignorância, seja onde for, desde a tribuna até os comícios. Não perdoar ninguém. E agora a televisão começou a mostrar na propaganda política um Bolsonaro que não existe, doce, carinhoso, de fala mansa, de gestos até delicados. Essas inserções na TV desagradaram os aliados e até a família do presidente, porque mostra ao eleitor um Bolsonaro que poderia ser chamado de “Bolsonarinho paz e amor”. E não é assim. A esquerda é algo que precisa ser aniquilada de vez. Esmagada. Guerra é guerra. As armas de 2018 estão voltando.

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