Arte roubada pelos nazistas obriga Alemanha a continua a expiar o passado
Noelia López.
Berlim, 19 mai (EFE).- O tesouro de centenas de quadros encontrado na casa da idosa colecionadora Cornelius Gurlitt ressuscitou na Alemanha o interesse pela arte roubada pelos nazistas, um crime que o país continua a expiar, enquanto acontecem as restituições aos herdeiros dos proprietários.
Segundo dados do governo federal, o órgão encarregado de investigar a origem das coleções públicas alemãs analisou desde 2008 a história de 90 mil pinturas e desenhos em cerca de 70 museus e a procedência de mais de meio milhão de livros de 20 de bibliotecas.
Nos últimos 15 anos, 12.200 objetos, sete mil deles livros, retornaram às mãos de seus legítimos proprietários ou de seus herdeiros, segundo o centro de coordenação de Magdeburg, encarregado de dar coerência ao trabalho das diferentes entidades envolvidas nesta complexa missão.
As autoridades alemãs decidiram sistematizar as investigações após o debate que provocou em 2006 a restituição do quadro “Berliner Strassenszene” (Cena popular berlinense), de Ernst Ludwig Kirchner.
A cidade o tinha adquirido em 1980 para a coleção do Museu Brücke e decidiu devolvê-lo aos herdeiros do colecionador judeu Alfred Hess, sem poder esclarecer se tinha sido desapropriado ou vendido voluntariamente.
Embora não despertem o assombro mundial que provocou o descobrimento aparentemente casual da coleção de Gurlitt, o gotejamento de casos é constante.
Um dos últimos foi protagonizado nesta semana pela tela “Pariser Platz in Berlim”, pintado pelo expressionista austríaco Oskar Kokoschka em 1926 e pertencente à coleção da Nationalgalerie de Berlim.
Até o mês passado, o quadro adornava as paredes do escritório do presidente da Fundação Preussischer Kulturbesitz, instituição que dirige os principais museus da capital e que, curiosamente, trabalha de forma ativa na investigação da arte roubada pelos nazistas.
Foi durante um desses projetos que soaram os alarmes, ao não poder se comprovar que o Kokoschka tinha sido adquirido pelo Dresdner Bank, que depois vendeu sua coleção ao Estado, antes de 1933, data da chegada ao poder dos nacional-socialistas.
“Acredito que possamos esclarecer o mais rápido possível e de forma indubitável as circunstâncias da compra”, ressaltou o presidente da fundação, Hermann Parzinger, após o acordo de cooperação com a família de Anna Caspari, a quem pertenceu o quadro no passado.
Caspari, reconhecida colecionadora e marchand de arte em Munique nos anos 20, foi deportada em 1941 pelos nazistas para Riga, como outros muitos milhares de judeus, onde morreu assassinada.
É só um exemplo dos processos em andamento. O banco de dados digital criado em 2000 para coletar todas as reivindicações inclui hoje a descrição detalhada de mais de 154 mil objetos.
São principalmente obras de arte e arquivos roubados pelos nazistas dos proprietários, a maioria judeus, ou que se encontram em paradeiro desconhecido desde a Segunda Guerra Mundial.
Mais de 1.400 particulares e instituições nacionais e internacionais registraram suas buscas nesse banco de dados (www.lostart.de) e desde novembro aparecem nele também 590 quadros de origem duvidosa da coleção de Gurlitt.
Dado o volume da descoberta na casa desta colecionadora, foi criado um grupo de trabalho dedicado exclusivamente ao estudo, mas as poucas notícias que vazam na imprensa indicam que será uma pesquisa complicada.
Em março Gurlitt disse que colaboraria com a Justiça e, como primeira amostra de boa vontade, anunciou que devolveria o quadro “Mulher Sentada”, de Henri Matisse.
Segundo a documentação existente, a pintura tinha sido tirada em 1941 do colecionador Paul Rosenberg, pouco depois de os nazistas tomarem a França durante a Segunda Guerra Mundial.
Mas as herdeiras de Rosenberg -Marianne Rosenberg e Anne Sinclair, ex-mulher do ex-presidente do FMI, Dominique Strauss-Kahn – deverão esperar.
No início de abril os advogados de Gurlitt informaram que uma terceira pessoa, cuja identidade não foi revelada, tinha reivindicado a tela, o que obrigava a realizar novas comprovações. EFE
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