Deixem Sergio Moro trabalhar
O ex-juiz e ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro precisa pagar boletos e tem muitos inimigos; eles não perdem a chance de apedrejá-lo, mesmo que seja pelo motivo mais irrelevante
Sergio Moro arranjou um emprego. Diante desse fato, a melhor reação dos brasileiros seria: “sim, e daí?”. Oras, o homem era ministro, não é mais. Era juiz, não é mais. Renunciou à vida abastada do Judiciário e agora, como qualquer cidadão, não pode ficar desempregado. Precisa trabalhar para pagar boletos. Ao anunciar que será sócio-diretor da Alvarez & Marsal, consultoria especializada na reestruturação de empresas quebradas, Moro deixou claro: não vai se meter em casos com conflito de interesses. Não vai advogar para os clientes que ele julgou na Operação Lava Jato. Vai ajudar empresas a criar regras de governança e medidas antifraude. Mas gente querendo aparecer aproveitou para criar um factoide em cima do caso. O deputado Paulo Teixeira (PT-RS) pediu à Procuradoria-Geral da República (PGR) para investigar o ex-juiz por nada menos que corrupção. Paulo Teixeira é aquele que em 2015 disse ter R$ 190 mil “por engano” da empreiteira Engevix. Já a seção paulista da OAB emitiu uma notificação estranhíssima, alertando Moro que ele não deve atuar como advogado na empresa de consultoria. É estranho porque a OAB costuma se calar diante de diversas denúncias contra O comportamento de advogados. E agora, como se tivesse acordado de um longo sono, surge preocupada com a conduta do ex-juiz.
Um grupo de advogados foi mais longe. Disse numa carta que Moro, na Lava Jato, criou a demanda por serviços de consultoria que ele próprio agora oferece. É preciso um bocado de paranoia para acreditar que Moro planejou todos os acontecimentos dos últimos anos só para lucrar na iniciativa privada. O grupo disse ainda que Moro concedeu “benefícios aos grupos empresariais e seus dirigentes” quando era juiz da Lava Jato, sugerindo que ele estaria recebendo hoje por um serviço prestado no passado. Justamente o juiz conhecido por ser duro com os réus, cujas sentenças da Lava Jato ultrapassam 3 mil anos de prisão. Para quem se preocupa com a corrupção, é uma excelente notícia ver Moro ajudando empresas a andar na linha. Punir empreiteiras corruptas é bom mas não é suficiente: é preciso haver uma mudança de regras e cultura dentro das companhias. O ex-juiz e agora advogado sabe muito bem como empresários se enrolam em fraudes e crimes – ninguém melhor que ele para ensinar a evitar esse tipo de coisa. Sergio Moro tem muitos inimigos. Eles não perdem a chance de apedrejá-lo, mesmo se for pelo motivo mais irrelevante.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.