Variante Ômicron e falta de testes criam novos dilemas éticos

O fato de que muitas infecções pela nova cepa são assintomáticas é boa notícia, mas aumenta o risco de transmissão inadvertida, em que a pessoa infectada não faz ideia de que pode estar espalhando o vírus

  • Por Mônica Magalhães
  • 16/01/2022 08h00
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LUCAS PRATES/HOJE EM DIA/ESTADÃO CONTEÚDO Vacinação contra a covid-19 em Belo Horizonte Casos de Covid-19 disparam no Brasil com a chegada da variante Ômicron

A variante Ômicron parece ter sintomas mais leves de modo geral, ser assintomática em muitos infectados, e mandar uma proporção menor de pacientes para o hospital. Conforme nos aproximamos dos dois anos de pandemia, uma variante aparentemente mais “branda” chegou a criar esperanças do começo do fim: uma variante que infecta muitos mas mata poucos poderia aumentar a imunidade da população e evitar futuras variantes mais perigosas. Infelizmente, é cedo para tirar esse tipo de conclusão. Novas variantes podem sempre emergir, e não há garantia que pegar a Ômicron ofereça proteção contra futuras cepas do vírus (assim como as vacinas, que funcionam bem contra variantes anteriores, protegem menos contra a infecção pela Ômicron, embora ainda protejam contra o desenvolvimento de Covid grave).

A alta transmissibilidade da variante Ômicron e a consequente explosão no número de casos cria risco de muitas mortes e de sobrecarga do sistema de saúde: mesmo que a porcentagem de casos fatais ou exigindo hospitalização seja baixa, uma pequena porcentagem de um número gigantesco pode ser um número suficientemente grande para criar uma tragédia. E infecções entre os próprios profissionais da saúde, constantemente expostos ao vírus na linha de frente, também diminuem a capacidade do sistema afinal, mesmo com sintomas leves ou sem sintomas, profissionais da saúde que contraem Covid precisam se afastar do trabalho pela segurança de seus pacientes e colegas.

O fato de que muitas infecções pela nova cepa são assintomáticas é uma boa notícia para os indivíduos afetados e para o sistema de saúde, mas aumenta o risco de transmissão totalmente inadvertida, em que a pessoa infectada não faz ideia de que pode estar espalhando o vírus para pessoas vulneráveis como crianças e outros não vacinados, portadores de comorbidades, e outros grupos de risco e portanto não adota precauções. Justamente no momento em que, para evitar esse cenário, seria importante testar rapidamente pessoas assintomáticas que tiveram contato com pessoas infectadas, o Brasil, como muitos outros países, enfrenta a falta de insumos para testes e a resultante necessidade de racioná-los. E isso cria um dilema ético.

Claro que é importante reservar testes para pacientes com sintomas graves, quando o diagnóstico exato é necessário para direcionar o tratamento, e para profissionais da saúde, que colocariam muitos outros em risco caso estivessem infectados e assintomáticos, como uma grande rede de hospitais decidiu fazer. Mas essa política desprioriza os testes “eletivos” que permitiriam aos demais assintomáticos descobrir que estão com o vírus, e portanto proteger os mais vulneráveis à sua volta. Assim, até que a disponibilidade de testes aumente novamente (possivelmente incluindo os autotestes), fica clara a importância de continuar levando a sério as precauções como manter o distanciamento, usar máscaras, e evitar espaços fechados, especialmente para pessoas saudáveis e assintomáticas que podem ter sido expostas ao vírus, não podem se testar, e correm risco de expor pessoas vulneráveis.

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