Autonomia do Banco Central é boa notícia, mas não faz milagres
Com a dívida pública em 90% do PIB e ainda se falando em trazer de volta o auxílio emergencial sem apontar de onde virá o dinheiro, o banco fica praticamente com as mãos atadas
Não dá para dizer que a autonomia do Banco Central, aprovada pela Câmara dos Deputados, é uma surpresa. Depois de 25 anos de discussões, desde os anos 90, a ideia amadureceu a ponto de um projeto que sempre causou polêmica ter recebido mais de 300 votos a favor. Já tinha passado pelo Senado em novembro. Além do mais, nos últimos anos, o BC também já tinha autonomia nas decisões. É mesmo assim uma institucionalização necessária. Para focar em um caso, em 2014, houve a suspeita de que o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) segurou aumentos dos juros para não prejudicar o governo na eleição presidencial. Com a estabilidade do presidente do Banco Central e dos diretores, aprovada pelo Congresso, a pressão política se torna mais difícil.
Não é uma mudança a serviço do mercado financeiro, como acusam críticos como Guilherme Boulos. Seguirá obrigatória a quarentena de ex-presidentes e ex-diretores antes de voltarem ao mercado. Cabe a discussão, como colocou o ex-ministro Nelson Barbosa, na Folha, sobre se o prazo de seis meses de afastamento é o bastante. Parece pouco. Mas é outra discussão. Com o projeto aprovado, o presidente e os diretores do Banco Central vão ter mandatos fixos de quatro anos. Podem ser substituídos apenas em caso de doença, condenações definitivas na Justiça ou por desempenho insuficiente, desde que referendado por votação no Senado. Quanto à indicação, continua a ser feita pela Presidência e depende de aprovação dos senadores. Porém, uma vez instalados, não podem ser demitidos só pela vontade do presidente.
A mudança colocará o Brasil em sintonia com as economias mais desenvolvidas. O Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, por exemplo, é independente, o que significa que define suas próprias metas. Recentemente, o foco do BC americano tem sido a recuperação da economia e do emprego. Aqui, na nova lei, será uma das atribuições do Banco Central, além de garantir a estabilidade de preços. Agora, não dá para esperar milagres. A política monetária é importante, mas o que está pesando sobre a economia brasileira hoje é a política fiscal. Com a dívida pública em 90% do Produto Interno Bruto, devido às despesas com a pandemia, e ainda se falando em trazer de volta o auxílio emergencial sem apontar de onde virá o dinheiro, o Banco Central fica praticamente com as mãos atadas.
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