Rumo a Kiev

  • Por Mauro Beting/ Jovem Pan
  • 21/05/2018 09h02
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Reprodução Kiev recebeu a final da da Liga dos Campeões 2017/2018

Quando os nazistas tomaram Kiev, em 19 de setembro de 1941, 630 mil soldados ucranianos foram feitos prisioneiros. Foi a maior captura da história. Duas semanas depois, 33 mil judeus foram executados perto da capital do país que havia sido arrasada pelos bombardeios alemães e também pela política de terra arrasada dos soviéticos. Kiev foi atacada por quem a defendia e por quem a sitiava.

Em 6 de novembro de 1943, Kiev foi retomada pelas tropas soviéticas. Em 778 dias de ocupação nazista, a cidade de 800 mil habitantes só tinha 80 mil quando voltou ao jugo de Moscou. Gente que não sobreviveu à dieta de sopa de grama e ratos, à ditadura assassina, ao genocídio contra judeus. Ucranianos deportados para trabalhos forçados na Alemanha, mulheres expatriadas, mães obrigadas a abortar.

Nesse período, um time de funcionários de uma grande padaria ajudou a manter e elevar o moral local. O Start. “Começo”. Time formado por ex-jogadores do grande Dínamo e do Lokomotiv locais. Start que ousou ganhar todos os nove jogos do campeonato nacional. Inclusive dois contra soldados alemães. Insolência que os levaria à prisão dias depois, à execução sumária de um atleta que servira à polícia secreta ucraniana, e mais três que seriam assassinados num campo de extermínio, seis meses depois.

Essa é a Kiev que dede o século 13 já foi dizimada por mongóis (1240), já foi tomada por lituanos (1360), tártaros (1482), poloneses (1569), cossacos (1648), russos (1686). Entre 1917 e 1919 foram 18 trocas de poder.

Todos queriam Kiev. E ninguém a queria bem.

O que a cidade sofreu entre 1941 e 1943 está em poucos mapas da história. Já sobrevivera ao genocídio da Grande Fome ucraniana de 1932-33 (quase 7 milhões de mortos por inanição no país), ao Terror soviético de 1937. Mas quase não sobrara nada depois das atrocidades ainda maiores dos nazistas.

Combatidos na bola pelos 11 do Start. Os que elevaram o moral da população ao ganharem em campo o jogo que havia sido preparado para eles perderam. Partida que havia sido recomendada a derrota antes de a bola rolar pelo árbitro que era oficial da SS. Encomendado resultadão no intervalo por outro militar alemão. E eles se recusaram e esmorecer. Não saudaram Hitler antes de a bola rolar. Não entregaram o jogo. Apenas a própria sorte e as cabeças para rolar.

Kiev atacada e incendiada em 1941 pelos que a invadiram e pelos que a deixavam. NKVD (polícia secreta) que matou muitos presos antes da queda para os nazistas para não dar mais “munição” a eles. Nacionalistas ucranianos que também chacinaram judeu antes da queda. Em 1943, os nazistas também destruíram o que conseguiram para arrasar a nova terra.

A Ucrânia é hoje o oitavo destino turístico europeu. Quase todo ele destinado a Kiev. Ainda mais nesta semana de decisão continental. Real Madrid bicampeão e dodecacampeão contra o Liverpool penta europeu. Dono de uma força ofensiva armada pelo Klopp de efeito devastador.

Um duelo de paz em Kiev. Uma história que vamos contar a partir daqui. Lembrando os bravos do Start da Grande Guerra. E os guerreiros vermelhos e merengues em missão de paz em 2018.

Kiev já foi tomada varias vezes por varia povos com muita violência. É tempo de ser historicamente tomada por uma só torcida e um só clube.

Do jeito como corajosamente fez o Start no verão de 1942: na bola.

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