América Latina sofre com “falta de justiça histórica”, segundo AI

  • Por Agencia EFE
  • 24/02/2015 21h32

Guillermo Ximenis.

Londres, 24 fev (EFE).- A América Latina sofre com uma “falta de justiça histórica”, que permite que países e criminosos cometam crimes contra os direitos humanos impunemente, disse à Agência Efe a diretora para as Américas da Anistia Internacional (AI), Erika Guevara.

“O mais preocupante na região é o extremo nível de impunidade que existe em cada um dos países. É um legado acumulado através dos anos e que hoje em dia se reflete em sistemas de justiça debilitados, sem capacidade de proteger os cidadãos”, declarou Guevara na sede da organização, em Londres.

No relatório sobre o estado dos direitos humanos no mundo no ano de 2014, a Anistia Internacional destacou o assassinato de 43 estudantes que ocorreu no México em setembro, sobre o qual a porta-voz afirmou que “não comoveu apenas a sociedade mexicana, mas o mundo inteiro”.

“É impressionante que até agora ninguém tenha sido levado diante da justiça ou acusado pelos graves crimes contra esses estudantes. Esse extremo reflete a realidade crítica vivida pelo país em relação aos direitos humanos”, frisou.

A diretora da organização humanitária também destacou as desigualdades sociais e econômicas que alimentam os conflitos e a violência no continente sul-americano.

“Essa diferença tão significativa entre ricos e pobres, em um contexto de corrupção e impunidade, leva as pessoas a tomarem as ruas para exigir a prestação de contas dos Estados e pedir que estes protejam seus direitos fundamentais”, explicou.

Longe de encontrar resposta para suas reivindicações, a população encontra “uma contestação opressiva por parte dos Estados e violência das forças da ordem pública, sejam policiais ou militares”, disse Guevara.

Entre as situações nas quais ocorreram graves violações dos direitos humanos no contexto de protestos civis em 2014, Guevara citou os casos do Brasil durante as manifestações paralelas à Copa do Mundo, e da Venezuela, nos protestos políticos a favor e contra o governo do presidente Nicolás Maduro.

Em relação ao Brasil, a Anistia destacou que o governo deve esclarecer as denúncias sobre detenções arbitrárias, maus tratos e torturas ocorridas por causa das manifestações de 2014.

“O governo brasileiro tem muito a aprender, tendo em vista a resposta militarizada dada aos protestos. Tem que garantir o espaço democrático e a liberdade de expressão”, afirmou a porta-voz.

De acordo com uma pesquisa divulgada pela Anistia Internacional neste ano, 65% dos brasileiros têm medo de ser presos por acreditarem que poderiam ser torturados, um dado que “reflete como as sociedades permitem a tortura e a normalizam”.

A diretora da AI citou também a Venezuela como um dos exemplos de “redução de espaço democrático”, que acontece em vários países da América Latina.

Em Caracas “parece não haver espaço para a oposição ou para a crítica em relação às políticas do governo. Nos últimos meses, vimos uma série de detenções politicamente motivadas, como a do líder opositor Leopoldo López, para o qual pedimos claramente a libertação”, assinalou.

“O governo da Venezuela tem de garantir o Estado de direito. Tem obrigações internacionais em matéria de direitos humanos que devem ser respeitadas e deve se submeter às recomendações de órgãos como as Nações Unidas”, disse Guevara, que lamentou a “falta de vontade” de Maduro para cumprir essas pautas.

Sobre a prática de tortura no continente, a diretora da AI comemorou os “grandes avanços” na América Latina e no Caribe nas últimas décadas.

“Atualmente não encontramos situações nas quais a tortura seja uma prática sistemática”, afirmou, apesar de ter destacado que em Brasil, México e Venezuela ainda há a prática de tortura “no contexto das manifestações”.

É uma “prática permitida” por esses Estados, já que “não previnem nem punem sua prática e não enviam um sinal claro de que a tortura é um crime grave contra os direitos humanos. A prevenção e resposta em relação aos casos que acontecem é responsabilidade do estado”, afirmou. EFE

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