CNJ aprova resolução que reconhece identidade de gênero no sistema prisional

Medida beneficia a população transexual, em especial mulheres trans, alvos frequentes de violência e discriminação em presídios masculinos

  • Por Jovem Pan
  • 02/10/2020 23h55 - Atualizado em 03/10/2020 00h00
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G.Dettmar/CNJ Presos LGBTQIA+ terão direito a cumprir pena em alas separadas

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou nesta sexta-feira, 2, uma resolução que reconhece a identificação de gênero no sistema prisional brasileiro, permitindo que a população carcerária LGBTQIA+ possa cumprir suas penas em unidades adequadas ao seu gênero autodeclarado. A medida beneficia a população transexual, em especial mulheres trans que sofrem violência e discriminação dentro de unidades prisionais masculinas.

É a primeira vez que o CNJ, principal órgão responsável por definir diretrizes para o Judiciário nacional, estabelece medidas do tipo, segundo integrantes que participaram da elaboração da proposta. A resolução será publicada na próxima semana, e deve demorar 120 dias para começar a valer. “Com esta nova resolução, o Brasil dá um passo importante no fortalecimento da tutela das minorias e no reconhecimento da dignidade da pessoa humana”, apontou Luiz Fux, presidente do CNJ e ministro do STF.

Mesmo signatário de leis e tratados internacionais que dispõe sobre direitos humanos e proteção à população LGBTQIA+, o Brasil lidera o ranking mundial de violência contra transexuais, cuja expectativa média de vida é de apenas 35 anos, segundo o IBGE. “Em um sistema penitenciário marcado por falhas estruturais e total desrespeito a direitos fundamentais, a população LGBTI é duplamente exposta à violação de direitos”, afirmou o conselheiro Mário Guerreiro, que relatou o processo que se transformou na resolução aprovada pelo CNJ.

Segundo ele, a resolução é importante para que juízes entendam que a separação está de acordo com as normas. “Às vezes o juiz pode ficar com medo de dar decisão por achar que não têm respaldo normativo”, observou. “Conversamos com várias entidades do Ministério Público, da Advocacia, do Judiciário, e com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), e foi interessante notar que havia um consenso de que isso precisava ser feito para impedir a violência contra a população LGBTI nos presídios, que não vem de hoje. É até absurdo que isso esteja sendo feito apenas em 2020”, disse o conselheiro, que é juiz de direito e foi indicado ao CNJ pelo STF, onde já trabalhou como juiz auxiliar do ministro Fux.

O que muda

De acordo com a nova resolução, a Justiça levará em consideração a autodeclaração do cidadão, o que vai possibilitar que uma pessoa identificada como LGBTQIA+ cumpra pena em presídio que possua alas diferenciadas. A análise será feita caso a caso por cada juiz. A autodeclaração poderá ser dita em qualquer fase do procedimento penal até a extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena. Uma vez feita, o juiz deverá informar os direitos garantidos pela resolução, que também prevê visitas íntimas em igualdade de condições aos outros presos.

“A minuta do texto levou em conta as graves situações de violência e vulnerabilidade que a população carcerária LGBTI vive, assim como a ADPF 527, quando foram identificadas violações de direitos nesses cumprimentos de pena e determinado que as presas transexuais femininas sejam transferidas para presídios femininos”, conta o juiz auxiliar da presidência do CNJ Gustavo Direito.

A ínfima quantidade de vagas destinadas a essa população em todo o país dificulta a adoção das medidas. Segundo um relatório recente do Depen, são apenas 3.061, o que representa 0,4% do total de pessoas que se encontram em unidades prisionais no país – 758.676, de acordo com dados recentes do Depen. As medidas também serão aplicadas a adolescentes que cumprem medidas socioeducativas que se autodeclarem parte da comunidade LGBT até elaboração de uma lei própria.

O CNJ não possui a informação sobre quantas pessoas LGBTQIA+ estão presas no país. Em recente nota técnica, o Depen também apresentou orientações e diretrizes para que essas pessoas possam ficar em celas separadas nos presídios. Sobre a necessidade de criação de vagas específica, o departamento afirma que os Estados têm a possibilidade de solicitar repasses de recursos com essa finalidade.

*Com Estadão Conteúdo

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