Dodge defende obrigação das escolas de combater discriminações de gênero
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, defendeu a inclusão no Plano Nacional de Educação (PNE) do combate a discriminações por gênero, identidade de gênero e orientação sexual no ambiente escolar. Segundo ela, isso deve estar especificado no plano, para que as escolas sejam obrigadas a lutar contra essas opressões.
A manifestação refere-se a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) contra dispositivos da lei que aprovou o PNE. O partido questiona a ausência de menção ao dever constitucional das escolas de prevenir e coibir o bullying homofóbico, transfóbico e machista, excluído do texto original do Plano durante o processo legislativo.
De acordo com a ação, os dispositivos contidos no texto abordam o combate a todas as formas de discriminação e preconceito, mas são omissos em relação ao enfrentamento da intolerância de gênero e orientação sexual especificamente. Para o PSOL, essa ausência tem facilitado o veto à abordagem do tema em sala de aula. O partido pede, assim, que o Supremo esclareça a inexistência de tal proibição na lei ou que declare sua inconstitucionalidade.
Manifestação de Dodge
Em parecer enviado ao Supremo, Dodge afirmou a necessidade de reafirmar, como diretriz do PNE, o combate a discriminações de gênero, identidade de gênero e orientação sexual no ambiente escolar. “O não detalhamento dessa específica espécie de discriminação pelo Plano Nacional tem como efeito, além da possível imposição de silêncio sobre o tema nas escolas, a inércia quanto ao efetivo combate a atitudes discriminatórias nesse campo”, justificou.
Ela defendeu, ainda, que a exclusão da referência específica à discriminação por gênero, identidade de gênero e orientação sexual, substituída por “todas as formas de discriminação”, manifesta “inconstitucionalidade, porque dá margem ao descumprimento do propósito constitucional de erradicação de discriminações nesse campo e de promover educação integral, para o respeito ao próximo”.
A procuradora-geral citou, por exemplo, que em suas metas e estratégias, a lei manteve a indicação expressa aos demais grupos notoriamente vulneráveis, como negros, pessoas com deficiência, população do campo, comunidades indígenas e quilombolas.
Na manifestação, Dodge sustentou que o combate à discriminação de gênero e orientação sexual no ambiente escolar está amparado em diversos preceitos constitucionais, como o direito à educação, com foco no desenvolvimento da pessoa para o exercício da cidadania; os princípios da dignidade humana, da igualdade e da proibição de proteção insuficiente às crianças, adolescentes e jovens; além dos objetivos constitucionais de promoção do bem de todos e de dever de combate a toda forma de discriminação.
Ela ressaltou, também, que a falta de detalhamento do PNE em relação ao combate a esse tipo de discriminação vai de encontro à normatização internacional e à orientação dos organismos internacionais protetivos de direitos humanos.
Por isso, a PGR manifestou-se pela procedência do pedido, para que o Plano Nacional de Educação e suas metas sejam interpretados conforme a Constituição, garantindo assim a atuação combativa às discriminações por gênero, identidade de gênero e orientação sexual no ambiente escolar, reconhecendo-se o dever constitucional de ampla proteção às crianças LGBTI e às pessoas cis e trans.
Escolas
A ação proposta pelo PSOL citou diversas leis estaduais e municipais que, baseadas em interpretação equivocada do PNE, retiraram dos respectivos planos de ensino qualquer menção a gênero, identidade de gênero ou orientação sexual. Relatou ainda casos de ações concretas contra docentes que discutiram temas como homofobia, transexualidade e integração entre gêneros no ambiente escolar.
Na última semana, a Justiça de São Paulo determinou o retorno obrigatório, em 48 horas, de apostilas recolhidas da rede pública estadual a pedido do governador João Doria por “apologia à ideologia de gênero”. Doria afirmou que os juízes “não podem decidir tudo” no Brasil e justificou que “não é conservador”, mas que o conteúdo do material era “inaceitável” para uma criança de apenas 12 anos.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.