Juiz quebra sigilo de sócio de Flávio Bolsonaro, mas questiona cálculos da Promotoria

  • Por Jovem Pan
  • 19/12/2019 22h26
Fábio Motta/Estadão Conteúdo O senador Flavio Bolsonaro (sem partido-RJ) segue investigado pela Justiça

O juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau, da 27.ª Vara Criminal do Rio, autorizou a quebra de sigilo do empresário Alexandre Santini, sócio do senador Flávio Bolsonaro e dono de 50% de uma loja de chocolates em sociedade com o parlamentar na Barra da Tijuca, zona oeste da capital fluminense.

Mais cedo, o senador Flávio Bolsonaro acusou o juiz Flávio Nicolau de “autorizar tudo o que o Ministério Público pede” e sem ter fundamentações. O magistrado, contudo, questionou cálculos apresentados do Ministério Público envolvendo o empreendimento ao deferir as medidas de busca e apreensões.

Em relatório à Justiça, a Promotoria afirma que a loja de chocolates Bolsotini teria sido utilizada para lavar dinheiro obtido em repasses de “rachadinhas” no gabinete de Flávio Bolsonaro na época em que o filho do presidente Jair Bolsonaro exercia mandato de deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio.

Alexandre Santini, o sócio, seria “laranja” do senador para acobertar o uso de repasses da Assembleia para a compra e operação da loja.

A Promotoria se baseia em declarações de rendimentos e despesas de Flávio e sua mulher à época da aquisição do estabelecimento para afirmar que o casal não tinha “lastro financeiro” para bancar a aquisição e operação da unidade, repasses “incomparáveis” em relação ao volume de vendas da loja e retornos financeiros “absolutamente desproporcionais” e em curto espaço de tempo para Flávio Bolsonaro.

Um cálculo apresentado para acusar o parlamentar se refere à proporção média dos créditos em depósitos em dinheiro comparados ao crédito por meio de cartões de crédito e débito.

Segundo o Ministério Público, a porcentagem da proporção média ficou em 40% – o dobro do que a loja de chocolates registrava antes de ser passada para Flávio (20%).

O indício mostraria que, após a troca de mãos, a Bolsotini registrou o dobro de pagamentos por dinheiro em espécie em comparação com o período anterior à gestão de Flávio Bolsonaro.

A suspeita se baseia em dado informado pelo ex-proprietário da loja, Cristiano Correia Souza e Silva em depoimento aos investigadores.

“Ocorre que Cristiano Correia Souza e Silva afirmou algo diferente do que foi destacado pelo Ministério Público: ele disse que ‘a proporção de dinheiro recebido era em torno de 20% do faturamento’ e segui afirmando que ‘na loja atual do depoente o recebimento em dinheiro no último mês foi de 16% do faturamento, 36% no crédito, 45% no débito e 3% no vale-alimentação'”, afirma Flávio Nicolau.

O juiz efetuou novo cálculo, apontando que a proporção média, apesar de não superar 40%, “são bem superiores” ao informado por Cristiano.

“Assim, vê-se que a metodologia de cálculo adotada pelo Ministério Público é diferente da que foi adotada por Cristiano Correia Souza e Silva quando o mesmo prestou o referido depoimento. Cristiano Correia claramente se referiu ao faturamento total quando falou do percentual de 20%, não aos valores de recebimentos por cartões de crédito e débito, como afirmou o Ministério Público, o que faz uma grande diferença”, continua o magistrado.

As dúvidas do juiz, no entanto, não o impediram de determinar buscas e apreensões na sede da Bolsotini e de ordenar a quebra do sigilo bancário de Santini, acusado de ser “laranja” da empresa para ocultar o uso de dinheiro supostamente desviado do Legislativo nas transações do estabelecimento.

Venda

Outro ponto destacado pelo juiz Flávio Nicolau se refere à acusação de que o volume de depósitos em espécie na conta da Bolsotini não acompanhou o volume de vendas na loja.

Segundo o Ministério Público, a Bolsotini registrou, na Páscoa de 2017, época em que a venda de chocolates fica muito acima da média, cerca de 17% a 24% do faturamento veio de pagamentos em dinheiro em espécie.

O porcentual, no entanto, não apresentou variações na proporção de vendas da loja em outras época do ano, quando o movimento de vendas tende a diminuir. Na verdade, segundo a Promotoria, até mesmo nesses casos o porcentual foi maior que o registrado na Páscoa de 2017.

Um exemplo citado pela Promotoria afirma que 23,40% do faturamento da loja (R$ 46 mil) foram provenientes de depósitos em dinheiro.

Em novembro de 2017, em baixa temporada, o faturamento por depósitos em dinheiro chegou a 87,70% (R$ 46 mil) – ou seja, o ritmo de depósitos em dinheiro foi o mesmo em períodos de grande e baixa venda de chocolate.

O Ministério Público fez o cálculo seguindo uma linha: foi somado todos os rendimentos provenientes de pagamento com cartões de débito, crédito, cheques e outros até um subtotal do período. No caso da Páscoa de 2017, o subtotal foi de R$ 196 mil

A Promotoria então comparou este valor com a quantia de depósitos em espécie, R$ 46 mil, e com isso afirmou que os repasses em espécie representavam 23,40%.

Segundo o magistrado, o correto seria somar os R$ 196 mil com os R$ 46 mil em espécie e, então, ver o quanto os depósitos realmente representavam no subtotal do faturamento. Neste cenário, os rendimentos da Bolsotini seriam R$ 223 mil, dos quais 18,96% seriam por depósitos em espécie.

Cálculo do juiz sobre outros períodos da Bolsotini, incluindo a semana de novembro. Seguindo a fórmula, o magistrado aponta que em novembro, época de baixa venda, ao invés dos depósitos representarem 87,70% dos rendimentos da Bolsotini, o porcentual seria, na verdade, de 46,72%.

“Vê-se que há realmente uma discrepância entre os aludidos períodos no que tange ao total de depósitos em dinheiro, já que o percentual dos referidos depósitos no período da quinzena da Páscoa no ano de 2017 foi muito inferior ao da quinzena de 12 de novembro de 2017 a 27 de novembro de 2017, apesar de que o faturamento ter sido muito superior, não acompanhando proporcionalmente à elevação das vendas”, afirma o magistrado.

*Com informações de Estadão Conteúdo

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