Carlos de Habsburgo: nacionalismo foi culpado da 1ª Guerra Mundial

  • Por Agencia EFE
  • 26/06/2014 19h29

Luis Lidon e Jordi Kuhs.

Viena, 26 jun (EFE).- “Sou feliz por não ter sido imperador”, disse em entrevista exclusiva para a Agência Efe em Viena o cidadão comum Carlos de Habsburgo-Lorena, neto de Carlos I, último imperador da Áustria-Hungria.

O atual chefe da Casa de Habsburgo, de 53 anos, define-se como um “patriota europeu” e considera o nacionalismo o “principal responsável” pela Primeira Guerra Mundial, conflito que deixou 10 milhões de mortos.

Neste sábado, serão completados cem anos desde o dia do assassinato, em Sarajevo, do então herdeiro do trono austríaco, Francisco Ferdinando, o que desencadeou a Grande Guerra. Carlos de Habsburgo-Lorena, porém, afirma que, se “tivesse que encontrar um culpado pela guerra, seria historicamente incorreto acusar um país ou uma pessoa em particular.

Carlos de Habsburgo participará neste domingo, como um dos convidados de honra, dos atos comemorativos de Sarajevo para lembrar o assassinato de Francisco Ferdinando.

Para o neto do último imperador da Áustria-Hungria, a culpa é de “determinada mentalidade”, que, “sem dúvida, é o nacionalismo”.

Jurista de formação, antigo apresentador de televisão e ex-eurodeputado, ele preside hoje o braço austríaco da União Paneuropeia e comanda a Blueshield, organização que protege bens culturais em zonas de conflito.

Sem saudosismos, elogia o papel de seu pai, o arquiduque Otto da Áustria (1912- 2011), de quem destaca seu trabalho incansável pelo progresso dos povos e das nações que formavam a monarquia danubiana.

Além disso, ressalta a rápida renúncia de Otto a uma restauração imperial, passo que não era considerado “realista” pelo arquiduque.

Educado em um colégio público no sul da Alemanha, mas radicado na Áustria há décadas, Carlos de Habsburgo reconhece um vínculo especial com este país, mas em um sentido mais amplo se define como “um patriota europeu”.

“O patriotismo, ao contrário do nacionalismo, tem a grande vantagem de não se vincular a um território concreto”, argumenta, e como tal, “o patriotismo pode se dar em diferentes níveis” e assim é possível ser “um patriota europeu”.

Em relação ao antigo Império Austro-Húngaro, que dominou boa parte da Europa Central durante séculos, lembra “alguns aspectos positivos”, como a existência de uma “ordem jurídica supranacional” com matizes “liberais” e aberta à pluralidade.

Como exemplos, ele destaca que todo alto funcionário devia saber pelo menos três idiomas, que as línguas nacionais podiam ser utilizadas no parlamento de Viena – algo que atualmente na Europa só ocorre na Eurocâmara – e que o hino nacional do Império foi traduzido e cantado em 20 idiomas.

“Se alguém tivesse tentado que a Marselhesa (hino nacional da França) fosse traduzida para o bretão, teriam dito que isso é inconcebível”, comparou.

Mesmo assim, ele reconhece que havia graves “desajustes internos” no Império e diz que não é casualidade que um nacionalista sérvio-bósnio tenha matado Francisco Ferdinando.

O herdeiro do trono pretendia reformar o sistema de divisão de poderes do Império para dar maior poder aos povos eslavos, situados a leste e sudeste de Viena.

“A ideia que (Francisco Ferdinando) tinha em mente era de que se devia redefinir o papel dos povos eslavos”, explicou.

Em todo caso, Carlos de Habsburgo considera que a Primeira Guerra Mundial iria explodir de qualquer maneira, e que se não fosse o assassinato, outro fato teria desencadeado o conflito.

Naquela época, “ninguém tinha uma visão geral para poder imaginar o desastre de uma guerra das dimensões da Primeira Guerra Mundial”, diz.

Por isso, os líderes de todas as potências se encaminharam ao conflito como “sonâmbulos”, afirma o neto do último imperador, que chegou ao poder em 1916, em plena guerra, após a morte do envelhecido “Kaiser” Francisco José.

“Sonâmbulos” é justamente o título do recente e aclamado livro do historiador australiano Christopher Clark, uma obra que o próprio Carlos de Habsburgo recomenda para se conhecer os fatos que levaram a este primeiro conflito de dimensão planetária.

Uma guerra que acabou com a monarquia e a figura do imperador da Áustria-Hungria, posição que não teria gostado de ocupar. “Sou feliz por não ter sido imperador”, afirma de forma taxativa.

“Esta é uma declaração de puro egoísmo particular, porque não poderia fazer muitas coisas que agora posso fazer, se vivesse em uma monarquia”, explica.

Ser monarca não é “uma profissão que se possa desejar”, mas “uma obrigação” que carrega uma “grande responsabilidade”, concluiu. EFE

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