Começa o julgamento do senador que ameaça o primeiro-ministro canadense

  • Por Agencia EFE
  • 07/04/2015 20h12
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Julio César Rivas.

Toronto (Canadá), 7 abr (EFE).- O esperado julgamento do senador conservador Mike Duffy, acusado de suborno e fraude, começou nesta terça-feira em um tribunal de Ottawa em meio a um circo midiático incomum no Canadá devido às implicações políticas do caso.

Duffy, que antes de ser nomeado senador em 2008 era um dos jornalistas políticos mais poderosos do Canadá, ameaçou revelar “detalhes suculentos” sobre o envolvimento do primeiro-ministro canadense, Stephen Harper, e o governante Partido Conservador no escândalo.

O senador conservador, suspenso de seu cargo desde o ano passado, chegou na manhã de hoje ao tribunal de Ottawa escoltado por seu advogado e rodeado de dezenas de jornalistas e câmeras de televisão que lhe lançaram uma enxurrada de perguntas no curto espaço que separava seu veículo e a porta do recinto.

No entanto, Duffy não deu explicações e se limitou a dizer: “Falarei no tribunal. Ponto”.

No interior do tribunal, Duffy se declarou inocente das 31 acusações de fraude, abuso de confiança e suborno que recebeu da Polícia Montada canadense após meses de investigação sobre as contas do senador.

Segundo alegou hoje o promotor do caso, Mark Holmes, perante o juiz Charles Vaillancourt, Duffy reportou ao Senado despesas de viagens pessoais como se tivessem sido realizadas em função de seu cargo como senador.

Além disso, Duffy declarou que sua principal residência se encontrava na província da Ilha do Príncipe Eduardo e não em Ottawa, o que lhe permitiu receber milhares de dólares como auxílio-moradia, apesar de, há décadas e por razões profissionais, viver na capital canadense.

“O centro deste julgamento são os pedidos de compensação como resultado destas viagens, que o senador argumenta ter que realizar. Mas a teoria da promotoria é que ele não deveria fazê-las”, disse Holmes em sua declaração inicial.

No entanto, a atenção despertada pelo caso no Canadá não é pela suposta fraude de várias dezenas de milhares de dólares, mas pelo envolvimento de destacados membros do Partido Conservador, entre eles, segundo Duffy e seu advogado, o próprio primeiro-ministro.

Uma vez que em 2013 se soube que Duffy tinha embolsado US$ 72 mil em conceito de auxílio-moradia em Ottawa, apesar de não ter direito a essa subvenção, o então chefe de gabinete de Harper, Nigel Wright, desenhou um plano secreto para que o senador devolvesse o dinheiro e evitasse o escândalo.

O plano incluiu o pagamento a Duffy dos US$ 72 mil, quantia que saiu do bolso de Wright, embora, de acordo com as leis canadenses, o pagamento seja ilegal, motivo pelo qual Duffy está acusado de receber um suborno.

Curiosamente, Wright, um rico executivo que renunciou em maio de 2013 pouco após a divulgação do pagamento, não foi acusado pela polícia canadense de tentar subornar Duffy, que foi nomeado senador pelo próprio Harper.

O primeiro-ministro, que negou que tivesse conhecimento prévio do acordo entre Wright e Duffy, como assinalou o senador, tentou hoje distanciar-se o máximo possível do caso, tanto física como politicamente.

Harper evitou estar em Ottawa no dia da abertura do julgamento de Duffy e apareceu em Vancouver North, a 3.500 quilômetros da capital canadense, para participar de um evento.

Na costa do Pacífico do Canadá, Harper negou que vá ser convocado para testemunhar durante o julgamento, que durará 40 dias, e reiterou seu total desconhecimento do acordo.

“Os investigadores confirmaram o que eu disse, que não tive conhecimento de tudo isto. Não serei chamado como testemunha”, declarou Harper a jornalistas, ao acrescentar que ofereceu toda sua cooperação aos investigadores.

As possíveis revelações que Duffy, de 68 anos e, que após cinco décadas de carreira jornalística, tem fama de conhecer muitos dos segredos mais obscuros de Ottawa, possa realizar durante o julgamento mantêm em expectativa vários políticos do Partido Conservador.

O senador é considerado, por exemplo, uma das razões da vitória de Harper nas eleições de 2008, quando durante a campanha eleitoral o então jornalista entrevistou perante as câmeras de televisão o líder da oposição, o liberal Stéphane Dion.

Durante a entrevista, Dion, que é francófono e cujo domínio do idioma inglês não é perfeito, necessitou que Duffy repetisse em três ocasiões uma pergunta realizada em inglês.

Duffy, que transgrediu as normas jornalísticas e um acordo fechado com Dion, transmitiu todos os takes e passou a imagem de um líder indeciso, o que demoliu a imagem do chefe liberal e facilitou a reeleição de Harper.

Pouco depois, o primeiro-ministro nomeou o jornalista como senador, um cargo vitalício que Duffy ansiava há décadas. EFE

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