Comunicado do Copom sobre Selic alfineta governo e indica necessidade de calma na política monetária, dizem economistas
Especialistas ouvidos pela Jovem Pan avaliam que comitê manteve tom das reuniões anteriores, buscando manter a credibilidade das decisões, mas respondeu às constantes críticas de Lula e aliados sobre a condução da taxa de juros
Nesta quarta-feira, 3, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu manter a taxa Selic em 13,75% ao ano. A medida já era esperada por economistas, que acreditam que um processo desinflacionário só tenha início no segundo semestre. Como justificativa da manutenção da taxa, o comitê cita que episódios envolvendo bancos no exterior têm elevado a incerteza e que inflação ao consumidor segue acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta. Os membros complementam que a reoneração dos combustíveis e a apresentação da proposta de arcabouço fiscal reduziram parte da incerteza advinda da política fiscal, mas que a desancoragem das expectativas de longo prazo eleva o custo da desinflação necessária para atingir as metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. Segundo economistas ouvidos pela Jovem Pan, o comitê aproveitou o novo anúncio para alfinetar o governo, em uma tentativa de cessar as constantes críticas em relação à condução da política monetária. O grupo ressaltou a necessidade de calma e que o processo desinflacionário tende a ser mais lento quando as expectaitvas estão desancoradas. A cautela do órgão se deve à uma precaução para evitar que ocorra um corte de juros, que precise ser revertido logo em seguida.
Para o co-head de Investimentos da Arton Advisors, Raphael Vieira, o comunicado do Copom seguiu com o tom mais agressivo (hawkish) da reunião passada apontando os riscos existentes para a convergência da inflação. “O comitê inclusive cita que não há relação mecânica entre a convergência de inflação e a aprovação do arcabouço fiscal, dando um recado para o Governo Federal. Ao mesmo tempo, pede paciência e serenidade na condução da política monetária. Por fim, ele não retira a ênfase sobre não hesitar em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como o esperado. É válido mencionar que não havia expectativa no mercado de juros de um corte para essa reunião”, indica. Economista e sócio da SuperRico, Jayme Carvalho, opina que o comunicado veio um pouco mais duro do que o mercado esperava. “Diferentemente da expectativa dos juros futuros, que apresentam uma queda para algo entre 10 e 11% no final do ano, o Banco Central veio num tom mais duro, tirando parte das sinalizações de que existia um risco fiscal. Isso mostra o BC vê como positivo o arcabouço que foi criado e que está indo para o Congresso. No entanto, o Banco Central não sinalizou uma queda de juros agora, para as próximas reuniões, e deixou claro que isso dependente da queda da inflação. E agora o cenário é bem aberto no sentido de que o Banco Central está mais confiante, mas ainda espera uma queda na expectativa de inflação para começar a cortar juros”, afirma.
CEO da Simpla Invest, Lucas Rufino pondera que o Banco Central deseja ter um cenário mais previsível para iniciar uma eventual corte de juros. Por mais que tenhamos um cenário um pouco mais claro e controlado do que antes, o Banco Central não quer se precipitar em iniciar um ciclo de corte de juros para depois ter que voltar a aumentá-lo caso algum dos indicadores de inflação se descontrole. Isso poderia causar uma perda de credibilidade relevante. Alguns temas relacionados ao aumento da arrecadação do governo estão em aberto e uma possível reoneração dos combustíveis pode pressionar a inflação. Porém, essa reunião foi muito importante por que ela pode representar um direcionamento mais claro do BC ao mercado quanto o início do ciclo de corte de juros, que é muito aguardada por todos. Mas, em junho podemos que esperar que a decisão pela manutenção dos juros se repita”, projeta.André Meirelles, diretor de Alocação e Distribuição da InvestSmart XP, também observa que o comitê não deixou abertura para uma possível queda de juros na próxima reunião. “O comitê enfatizou que não existe relação mecânica entre o novo arcabouço e a convergência da inflação. Ou seja, a publicação do arcabouço sem queda nas expectativas de inflação não deve ser suficiente para reduzir a taxa Selic de maneira sustentável. A expectativa do mercado é que o ciclo de queda de juros aconteça a partir do segundo semestre desse ano, caso as expectativas de inflação acomodem. Daqui a duas semanas o comitê lançará a ata e teremos mais detalhes sobre o racional”, indica.
O Copom decidiu manter o mesmo patamar da Selic mesmo após a intensa pressão que tem sido feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por aliados, que cobram cortes na taxa e criticam os efeitos dos juros sobre a atividade econômica. Desde a última reunião, finalizada em 22 de março, ocorreram avanços no cenário econômico, entre eles a apresentação do novo arcabouço fiscal. O comitê havia sinalizado anteriormente a possibilidade de uma nova alta na Selic, mas o Palácio do Planalto bate na tecla que os recentes resultados positivos na economia, como a inflação abaixo do esperado, poderiam incentivar até mesmo uma queda nos juros. Contudo, a expectativa do mercado já era da manutenção da taxa de juros, uma vez que não houve grandes alterações no contexto nacional e internacional que justificassem uma mudança na política monetária.
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