PIB do Brasil cai 0,1% no terceiro trimestre e piora estagnação da economia

Segundo resultado negativo consecutivo ocorre em meio ao aumento da inflação e da aceleração dos juros; alta de 1,1% dos serviços impede queda mais brusca

  • Por Jovem Pan
  • 02/12/2021 09h02 - Atualizado em 02/12/2021 11h51
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Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro retraiu 0,1% no terceiro trimestre, na comparação com os três meses imediatamente anteriores, segundo dados divulgados nesta quinta-feira, 2, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O resultado, o segundo negativo após a queda de 0,4% no segundo trimestre — de acordo com dados revisados —, coloca a economia brasileira em recessão técnica e reforça a estagnação das atividades econômicas em meio ao avanço da inflação e da aceleração dos juros. Entre janeiro e março, o PIB registrou alta de 1,3%. Em paralelo ao mesmo período de 2020, a economia avançou 4%. Em valores correntes, o PIB, que é a soma dos bens e serviços produzidos no Brasil, chegou a R$ 2,2 trilhões. A queda foi puxada pela agricultura, com retração de 8%. A indústria ficou estável com variação de 0%. O setor de serviços — o mais beneficiado pela flexibilização das atividades econômicas entre julho e setembro —, evitou um desempenho mais negativo da economia ao crescer 1,1% na comparação com os três meses anteriores. No acumulado do ano até o mês de setembro, o PIB brasileiro apresenta avanço de 5,7% em relação a igual período de 2020. O resultado deixa o PIB no patamar do fim de 2019 e início de 2020, período pré-pandemia, e ainda está 3,4% abaixo do ponto mais alto da atividade econômica na série histórica, alcançado no primeiro trimestre de 2014. O IBGE também revisou o resultado do PIB do ano passado para queda de 3,9%, ante 4,1% divulgado anteriormente.

A queda de 8% na agricultura foi reflexo do encerramento da safra de soja, que também acabou impactando as exportações nacionais. A coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, explica que a colheita da soja, por ser muito mais concentrada nos dois primeiros trimestres, impacta no resultado. “Como ela é a principal commodity brasileira, a produção agrícola tende a ser menor a partir do segundo semestre”, afirma. Já a alta do setor de serviços — responsável por 70% do PIB doméstico — é resultado do avanço da vacinação contra a Covid-19 e a flexibilização de medidas de restrição. A mudança do eixo de gastos fez os serviços relacionados ao comércio registrarem queda de 0,4%. “O comércio, um dos setores mais afetados pela pandemia, teve uma forte alta no segundo trimestre, com a reabertura e, portanto, a base de comparação estava alta e as famílias também migraram parte do seu consumo para os serviços”, explica a pesquisadora. A estabilidade da produção industrial — setor responsável por 20% da soma do PIB —, é justificada pela manutenção de entraves que atingem a atividade desde o ano passado, principalmente a falta de insumos e os gargalos nas cadeias produtivas.

Pela ótica da demanda, o consumo das famílias aumentou 0,9% na comparação com o trimestre anterior, enquanto o consumo do governo aumentou 0,8%. Os investimentos medidos pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) retraíram 0,1%. No setor externo, as exportações de bens e serviços apresentaram queda de 9,8%, enquanto as importações de bens e serviços recuaram 8,3% no terceiro trimestre de 2021 frente ao segundo trimestre. “A balança de bens e serviços negativa acabou puxando a variação do PIB para baixo na comparação com o trimestre anterior. Cabe destacar, no entanto, que na comparação interanual, ambas as atividades tiveram alta acentuada, muito por conta da retomada do turismo internacional, mas a contribuição ao crescimento ainda ficou negativa, já que as importações (20,6%) superaram em muito as exportações (4,0%)”, afirma Palis.

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O baixo ritmo das atividades no terceiro trimestre era esperado após a desaceleração dos principais indicadores econômicos no período. O Índice de Atividades Econômicas do Banco Central (IBC-Br), considerado a prévia do PIB, apontou retração de 0,14% entre julho e setembro. O valor é semelhante à retração de 0,1% projetada pelo Monitor do PIB publicado pela Fundação Getulio Vargas (FGV). A queda acentuada da produção industrial já era observada pelas pesquisas mensais publicadas pelo IBGE, que indicaram desempenhos negativos nos três meses encerrados em setembro. As vendas no varejo, que traduzem a demanda dos brasileiros, performaram negativamente em agosto e setembro. O setor de serviços, que vinha em trajetória positiva em meio ao avanço da vacinação contra a Covid-19, perdeu fôlego e ficou no vermelho em setembro após cinco meses positivos.

A estagnação da economia doméstica está alinhada ao aumento do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador oficial da inflação brasileira, e a escalada dos juros pelo Banco Central (BC) no esforço de controlar a variação de preços. A inflação foi a 10,25% no acumulado de 12 meses em setembro, rompendo a barreira dos dois dígitos pela primeira vez em cinco anos — e se manteve em trajetória de alta em outubro e novembro. O aumento da volatilidade dos preços, principalmente nos combustíveis e na tarifa da energia, é um fenômeno que atinge as principais economias do mundo em meio ao processo de retomada das atividades pós-crise da Covid-19. No Brasil, no entanto, o fenômeno é acentuado pela combinação da desvalorização do real ante o dólar e o aumento da percepção do risco fiscal pelo mercado financeiro. Em resposta, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC aumentou os juros para 6,25% no fim de setembro ao somar 1 ponto percentual na Selic. O ritmo foi intensificado no encontro de outubro, com o acréscimo de 1,5 ponto percentual, elevando a taxa para o atual patamar de 7,75%. O colegiado sinalizou nova alta de mesma magnitude em dezembro, encerrando a Selic a 9,25% ao ano em 2021.

A queda das atividades econômicas somada à inflação alavancada reforçam que o Brasil caminha para um cenário de estagflação a partir de 2022. O fenômeno, que reúne o “pior dos dois mundos” da economia, se reflete na sociedade de forma perversa com o agravamento da taxa do desemprego, corrosão do poder de compra da população e diminuição no ritmo e volume de investimentos. A consolidação do quadro negativo é apontada semanalmente pelo mercado financeiro através do Boletim Focus, a pesquisa do Banco Central (BC) que reúne a mediana das previsões para a economia de mais de uma centena de instituições. Nesta semana, a estimativa para a inflação do ano que vem foi a 5%, o limite da meta perseguida pelo BC, com centro de 3,5% e piso de 2%. Já a projeção para o PIB foi rebaixada para 0,58% — opiniões mais pessimistas indicam até desempenho negativo da atividade econômica. Para este ano, os analistas do mercado projetam avanço de 4,78%. As previsões dos analistas são contestadas pelo Ministério da Economia, que prevê alta de 5,1% do PIB em 2021, e de 2,1% no ano que vem. O chefe da equipe econômica, Paulo Guedes, mantém o discurso de que a economia brasileira está voltando em “V” — quando uma forte queda é seguida de um crescimento robusto —, e afirmou nesta terça-feira, 30, que o Brasil “está condenado a crescer”.

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