Empresas cortam investimentos para tentar se adequar ao ambiente de crise

  • Por Agência Estado
  • 13/03/2016 10h26
Marcos Santos/USP Imagens Corte de gastos

Sem uma expectativa de retomada da economia brasileira no horizonte, cada vez mais empresas estão reduzindo seus programas de investimento, na tentativa de se adequarem ao ambiente da crise atual, que muitos economistas classificam como a pior da história do País. Com os números já anunciados pelas companhias, os cortes previstos para 2016 atingem bilhões de reais, puxados especialmente pela Petrobras. E tal cenário acaba criando um ciclo vicioso, ao contribuir para uma queda ainda mais pronunciada do Produto Interno Bruto (PIB).

Somente para 2016, a Petrobras pretende investir US$ 20 bilhões, 25,9% menos que o sinalizado em junho do ano passado. A simples redução dos investimentos não bastará para solucionar os problemas de liquidez e a elevada alavancagem da estatal petroleira, que já avalia a venda de ativos para gerar caixa e honrar as dívidas com vencimento no curto prazo.

Muitas das empresas que estão reduzindo seus investimentos programam apenas o chamado “capex de manutenção”, valor mínimo para a continuidade da operação. É o caso da Usiminas, que, em meio à sua fragilidade financeira e com risco de ingressar com pedido de recuperação judicial, já avisou que seus aportes em 2016 serão apenas para manter a operação e deverão cair pela metade em relação a 2015.

Outras companhias, além desse montante mínimo para a operação, estão destinando parte dos recursos para projetos que não podem ser deixados de lado. É o caso do “S11D”, da mineradora Vale, investimento já na fase final e que garantirá mais competitividade à companhia no ciclo de baixa dos preços das commodities. Ainda assim, os investimentos da Vale deverão ficar em US$ 6,2 bilhões em 2016, quinto ano consecutivo de queda do orçamento de investimentos pela mineradora, após o pico de US$ 18 bilhões em 2011.

“O primeiro ciclo de retirada de investimentos e mudança de planos foi muito duro. Chegou a hora de as empresas, ao invés de reagirem ao pânico coletivo, escolherem seus investimentos prioritários, alocando seus recursos de forma qualitativa e não quantitativa”, destaca o chefe de mercado de capitais da casa de análise independente Eleven Financial, Adeodato Volpi Netto.

O sócio líder das áreas de auditoria e consultoria da Grant Thornton, Daniel Maranhão, afirma que esse represamento de investimento ocorre, principalmente, devido à falta de previsibilidade em relação ao contexto futuro, tanto político quanto econômico, do Brasil. “Enquanto não houver um cenário mais definido e claro, as empresas não vão fazer investimento em aumento de capacidade, por exemplo”, destaca. Segundo o especialista, o foco no momento tem sido primordialmente cortar custos e manter o caixa.

Maranhão atenta para o fato de que as companhias precisam acompanhar de perto os sinais políticos e econômicos que vão sendo passados, para que novas premissas possam ser incorporadas às projeções. Como muitos investimentos têm maturação de médio ou longo prazo, é importante para a perenidade da empresa uma antecipação à retomada.

O momento de contingenciamento não poupou nem mesmo a gigante de bebidas Ambev, que já anunciou que deve investir no Brasil neste ano uma quantia menor do que os aportes de R$ 3,1 bilhões feitos em 2015. A companhia deve sofrer este ano pressões de alta de custo nas operações brasileiras, embora considere a redução no volume de investimento como uma “variação normal”.

Na fabricante de cosméticos Natura, o corte ocorrerá mesmo depois de a companhia já ter começado a reduzir investimentos no ano passado. A empresa saiu de um patamar de R$ 500 milhões de Capex nos últimos anos para R$ 383 milhões em 2015. E esse volume será reduzido de novo, para R$ 350 milhões em 2016. A racionalização fez a empresa até mesmo abandonar projetos que já estavam em andamento, para poupar caixa. “Os tempos são outros e temos que priorizar projetos”, disse o presidente Roberto Lima.

Para planejar os investimentos a serem feitos, a empresa precisa projetar um fluxo de caixa e trazer para o valor presente, para analisar se aquele investimento tem uma taxa mínima de atratividade, explica o coordenador do curso de Administração do Ibmec/MG, Eduardo Coutinho. “O nível de confiança está péssimo e é natural que os investimentos fiquem em patamares mínimos”, destaca.

Para baixo

No varejo, os cortes ficarão evidentes em um número menor de novas lojas. A Cia Hering, por exemplo, prevê investimentos 34,7% abaixo de 2015. A Riachuelo, que fez 28 inaugurações em 2015, projeta 15 aberturas em 2016. No Grupo Pão de Açúcar (GPA) a racionalização deve continuar, sobretudo nas bandeiras de eletroeletrônicos Casas Bahia e Pontofrio, nas quais a companhia não espera inaugurações em 2016. O GPA deve investir ao redor de R$ 1,5 bilhão em 2016, ante os R$ 2 bilhões de 2015.

Na esteira de mau momento do varejo, as operadoras de shoppings também irão segurar mais os gastos. A Multiplan, por exemplo, admitiu que irá esperar sinais de recuperação da economia antes de iniciar projetos e construções.

O novo ciclo de cortes de investimento também segue atingindo o setor de infraestrutura, em especial em companhias mais endividadas, como a Rumo Logística. A companhia irá cortar em cerca de 30% as projeções para o capex e o total de investimentos em 2016 ficará na faixa de R$ 1,7 bilhão a R$ 2,1 bilhões, ante projeções anteriores de R$ 2,6 bilhões a R$ 2,8 bilhões neste ano.

No setor de telecomunicações, a América Móvil, controladora de Claro, Embratel e Net no Brasil, indicou uma redução no ritmo de investimentos globais em aproximadamente 20% em 2016, o que inclui Brasil.

Na Comgás, o investimento previsto para este ano pode ficar quase 10% menor do que o aplicado no ano passado. O montante esperado é de R$ 470 milhões a R$ 520 milhões, frente aos R$ 521 milhões de 2015. Para gastar menos e manter o ritmo de expansão, a companhia vai diminuir o custo com conexão das residências: passará a buscar mais casas apenas com fogão (sem aquecedor) e exigir maior pagamento pelo consumidor.

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