Estudantes deixam 1ª escola ocupada na capital paulista
Depois de 55 dias de ocupação, passando por Natal e virada de ano, os estudantes da Escola Estadual Fernão Dias Paes, em Pinheiros, zona oeste da capital Paulista, deixaram completamente a unidade no início da noite desta segunda-feira, 4. A desocupação ocorreu em um clima tranquilo, sem violência, com a presença de membros da secretaria estadual de Educação.
Cerca de 50 alunos participaram da desocupação. Às 19h15, eles leram em conjunto uma declaração de desocupação “voluntária” e fizeram uma pequena lista de reparos pelos quais se responsabilizaram a arcar: os vidros de duas janela, fechadura de um arquivo, um espelho, uma mesa de mármore e uma mesa de pingue-pongue.
Entre os estudantes, o clima era de satisfação pela repercussão e resultado do movimento. Enquanto cantavam gritos contra o governo, muitos se abraçavam. “Dá uma tristeza de acabar por causa da família que se formou aqui. Aprendi muito na ocupação. Sobre falar, sobre política, sobre os problemas da educação no Brasil”, disse a aluna do 1° ano Camilla Rodrigues, de 15 anos.
Após a desocupação, os estudantes fizeram uma breve interrupção no trânsito da Avenida Pedroso de Morais. Eles carregavam faixas contra o aumento da tarifa de ônibus.
A ocupação no Fernão começou na manhã do dia 10 de novembro. Foi a primeira escola da capital a ser ocupada e a segunda no Estado No auge do movimento, 196 escolas foram tomadas por alunos em São Paulo.
Com organização para a limpeza da unidade e gestão dos próprios estudantes, a escola virou uma referência para outras ocupações. O prédio passou uma semana cercado por policiais militares, o que colaborou para que a unidade se tornasse símbolo da ação dos estudantes contra a reorganização anunciada pela gestão Geraldo Alckmin (PSDB) – e suspensa no dia 4 de dezembro.
A desocupação estava marcada para as 18h desta segunda. Os estudantes entregaram a chave da escola às 19h20 para o supervisor de ensino Alex Pereira de Almeida, que assinou a declaração de desocupação. Uma perícia da Polícia Civil deve ser realizada ainda nesta segunda para atestar que não houve danos na unidade. A perícia esteve no local mais cedo, mas, com o atraso da saída, foi embora.
Os alunos limparam a escola e recolheram sacos de lixo, colchões e cobertas pessoais antes de saírem. Também recolheram a maioria das faixas sobre a ocupação que adornavam a fachada do prédio. O saco plástico que cobre a estátua do bandeirante que dá nome à escola foi mantido.
No meio da tarde, a dirigente de ensino da regional Centro-oeste da Secretaria de Educação, Rosângela Aparecida de Almeida Valim, esteve na escola para conversar com os alunos e ver as condições da escola. “Não é uma vistoria, vim para conhecer e acompanhar como estão as coisas”, disse ela, que ressaltou a urgência de reiniciar as aulas. “Faremos uma reunião com os professores amanhã e queremos recomeçar as aulas no dia seguinte”.
Segundo a dirigente, haverá 28 dias de aula para que se complete os 200 dias letivos previstos na legislação. As reposições devem ocorrer antes do dia 15 de fevereiro, quando está marcado o início do ano letivo de 2016. “Temos urgência para resolver os históricos escolares de quem está se formando e também a documentação de aposentadorias de professores”, diz Rosângela.
Ao longo da tarde, os estudantes realizaram reuniões fechadas no interior da unidade. Por volta das 17h30, expuseram na porta da escola uma faixa com os dizeres “ocupar para educar”.
A ocupação recebeu o apoio de intelectuais e personalidades, que realizaram aulas e debates no local. A cartunista Laerte e o escritor e autor Gregório Duvivier foram alguns nomes que passaram pela escola. A chef Paola Carosella também cozinhou no local. “Mas o melhor prato que fizemos aqui foi um peru com abacaxi, pouco antes do Natal”, disse o aluno Heudes Oliveira, de 18 anos, aluno do 3° ano.
A exemplo de outras ocupações, o movimento se manteve sem lideranças. Oliveira, no entanto, foi o mais proeminente participante. Aluno do Fernão há seis anos, ele preferiu neste ano se dedicar ao movimento a se preparar para o vestibular. Oliveira quer estudar Direito.
“Estava no cursinho (paralelamente ao 3°ano), mas parei porque vi que essa luta era mais forte do que passar no vestibular neste ano”, diz ele, que mora em Embu das Artes, região metropolitana. “Tudo isso aconteceu porque o governo teve uma atitude autoritária, sem nos ouvir. Demos o exemplo que os alunos querem participar e se interessam pela sua educação. E a luta continua”.
Alguns pais e professores também acompanharam a saída dos estudantes. “Apoiei desde o começo o movimento, é o despertar político deles, que estão lutando pelo que acreditam”, disse a analista Marcia Balades, de 54 anos, mãe de uma das alunas do Fernão.
A professora de Filosofia Dalva Garcia, de 50 anos, que leciona há 13 anos na escola, fez a primeira aula pública na unidade depois da ocupação. “Alguns alunos meus não me surpreenderam por toda essa mobilização e outros tiveram um grande aprendizado. Isso tudo foi um sintoma do desgaste de uma gestão não democrática da educação”, disse ela, professora da rede estadual há 25 anos.
A ideia da reorganização era fechar 93 escolas no ano que vem e transformar 754 prédios em unidades de ciclos únicos. O governo argumenta que esse tipo de escolas tem melhor desempenho no Idesp, o indicador de qualidade do Estado. Sobre o fechamento das unidades, a gestão defende que houve queda no número de alunos.
Depois da suspensão do projeto para 2016, estudantes mantiveram a mobilização exigindo um sinal de que a reorganização não seria retomada sem discussão efetiva com as comunidades escolares. Ainda há 7 escolas ocupadas, cinco na capital e duas em Santos. O governo promete voltar a discutir o projeto neste ano, mas ainda não anunciou um calendário.
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