500 dias de Guerra na Ucrânia: como está o conflito e o que mudou nesse tempo?

Apesar da expectativa inicial de que Moscou poderia arrasar e dominar boa parte do território ucraniano, Zelensky contou com o apoio do Ocidente para equilibrar a disputa e armar uma contraofensiva

  • Por Sarah Américo
  • 08/07/2023 12h59
Handout / UKRAINIAN PRESIDENTIAL PRESS SERVICE / AFP invasão russa à ucrânia Militares ucranianos participando de uma cerimônia com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky mostrada em uma tela na Praça Santa Sofia em Kiev, no primeiro aniversário da invasão russa de Ucrânia

A Guerra na Ucrânia completa 500 dias neste sábado, 8. Desde fevereiro de 2022, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, já houve altos e baixos e, no momento, apesar da contraofensiva ucraniana que está em curso desde o começo de junho e o motim contra Moscou que aconteceu no final do mês passado, assustando a todos, no campo de batalha, a situação segue no mesmo impasse que tem sido registrado há meses. Em razão disso, uma solução para a guerra é algo distante da realidade, o que faz com que o mundo inteiro viva uma incerteza em relação a quais são os próximos desdobramentos deste conflito, como aponta o cientista político Leandro Consentino. “Temos uma situação de completa incerteza sobre os rumos desse conflito, que traz muitos impactos para geopolítica mundial, porque vai muito além dos dois países que estão em guerra. Esse confronto impacto o mundo inteiro, tanto do ponto de vista de defesa quanto econômico”, disse o especialista ao site da Jovem Pan, acrescentando que apesar dessa reação ucraniana, não dá para pontuar que alguém está ganhando. Apesar disso, na avaliação de Consentino, a Ucrânia leva leve vantagem neste momento, já que, no início do conflito, tinha-se a ideia de que a Rússia faria um passeio – havia estimativas de que a Moscou tomaria Kiev em três dias, o que não ocorreu nestes 500 dias.

Valdir Bezerra, mestre em relações internacionais pela Universidade Estatal de São Petersburgo, relembra que a guerra passou por algumas fases distintas desde fevereiro passado. “Um período inicial de rápidos avanços russos, seguido por estagnação e poucos ganhos territoriais das duas partes, depois um período de conscientização dos países Ocidentais no sentido de ajudarem a Ucrânia militarmente contra a Rússia”, explica. “Testemunhamos, nesse ínterim, ataques às infraestruturas de processamento de petróleo, eletricidade e instalações militares em ambos os países, incursão e ataques por meio de drones tanto na Ucrânia quanto na Rússia e até mesmo insinuações de que o conflito poderia escalar para uma guerra nuclear entre Grandes potências”, continua. Bezerra, porém, ressalta que apesar dessas movimentações, o impasse prevalece. Contudo, pode-se presenciar uma maior ansiedade do lado ucraniano, pois “suas forças armadas estão na ofensiva e desejando recuperar quanto antes os territórios anexados pela Rússia em setembro passado”.

O especialista pontua que os russos, por outro lado, “ainda não consolidaram totalmente seu controle na Bacia de Donbass e talvez precisem apresentar resultados mais concretos quanto aos seus objetivos políticos anunciados em fevereiro passado, em vista do ano eleitoral que se avizinha no país”. As eleições na Rússia estão programadas para 17 de março de 2024. Bezerra lista dois pontos vitais: “as forças russas não se mostraram capazes de provocar a capitulação do país, como alguns analistas ocidentais e mesmo russos previam”. No começo do conflito também não se imaginava que a ajuda Ocidental a Kiev seria tão significativa como está sendo. “Já em benefício da Rússia, percebe-se que o país não colapsou economicamente como se esperava diante das sanções, em vista de um reordenamento de suas relações econômicas e políticas com potências asiáticas como China e Índia”, contextualiza o especialista.

Vitelio Brustolin, professor de Relações Internacionais da UFF e pesquisador de Harvard, afirma que os objetivos iniciais de Putin com a Guerra na Ucrânia denotava um conflito ilimitado, ou seja, aquela em que só se consegue alcançar o que se pretende após cumprir três fases: primeiro, destruir as forças armadas do oponente; segundo, ocupar o território; terceiro, impôr a obediência civil. No entanto, não houve êxito, o que faz com que o líder russo trave uma guerra limitada. “Essa estratégia não tem capacidade de entregar os objetivos políticos traçados por Putin nesta guerra. Nesse momento, o que ele tem é o contrário do que ele pretendia: Organização do Atlântico Norte se expandindo, Ucrânia mais próxima da União Europeia e da Otan do que estava antes e o exército de Kiev tem um dos mais forte do que tinha no início da invasão russa”, relembra, enfatizando que Putin não só errou em ir para a guerra, como também não acertou nas estratégias. Além disso, a forma que os ucranianos têm lutado para defender o seu território, só destaca que eles não têm o menor interesse em fazer parte da Rússia. Para defender seu território, a Ucrânia recebeu muito armamento, mas, o professor também destaca que eles também receberam treinamento. “Essas nove brigadas que vemos agora na contraofensiva foram treinadas com táticas da OTAN, que é uma coisa que não se via antes”, explica.

Leandro Consentino analisa esses acontecimentos como uma vitória para a Ucrânia, porque, no começo, se pensava que “seria um país alvo fácil e vulnerável ao poderio russo, porém, não é isso que estamos assistindo nesse exato momento. Então, acho que só isso já é uma vitória importante da Ucrânia”, resume. Ele destaca que do começo da guerra para agora, o que mudou é justamente o apoio do Ocidente para Kiev, pois foi isso que fez com que eles conseguissem equilibrar o conflito. “A Ucrânia está voltando a conquistar territórios que tinha perdido, isso era algo que não se esperava. De outro lado, acho que outra coisa inesperado é o prolongamento do que a gente está assistindo. São 500 dias e temos players muito mais engajados. Essa guerra não ficou sendo apenas um problema regional e ganhou notoriedade no mundo inteiro”, acrescenta. Apesar de ainda ser cedo para julgar a contraofensiva ucraniana, Valdir Bezerra pontua que “as expectativas dos países ocidentais sobre a Ucrânia estão altas”.

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