Argentina escolhe candidatos à presidência em meio a cenário de grave crise econômica e esquerda enfraquecida

Primárias acontecem neste domingo, 13, com incertezas política e disputas internas nas principais coalizões do país; Javier Milei, da direita conservadora, recebeu apoio de Jair Bolsonaro

  • Por Sarah Américo
  • 12/08/2023 17h00
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Luis ROBAYO / AFP javier milei Congressista argentino e pré-candidato presidencial pela La Libertad Avanza Alliance, Javier Milei, discursa durante o encerramento de sua campanha

A Argentina conhecerá neste domingo, 13, os candidatos que vão disputar a eleição presidencial no dia 22 de outubro. As primárias acontecem em um momento em que o país enfrenta uma grande crise econômica, com taxa de inflação de 115% ao ano e uma pobreza que atinge 40% da população. A incerteza política se traduz em nervosismo nos mercados e se reflete na cotação do “dólar blue”, como é chamada a taxa de câmbio informal, que esta semana ultrapassou a barreira psicológica dos 600 pesos por dólar, o dobro da oficial. A Argentina tem um acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional) de US$ 44 bilhões (aproximadamente R$ 160 bilhões, em cotação da época), firmado em 2018 e renegociado em 2021. Há meses, as reservas internacionais diminuem a cada dia. Na terça-feira, 8, fecharam em US$ 24,1 bilhões, segundo o Banco Central do país.

Diante deste cenário, os eleitores precisam escolher aquele que seja capaz de revertes essa situação e devolver a normalidade aos argentinos. Contudo, três dos quatro principais candidatos vêm de partidos que, ao longo da última década, tentaram estabilizar a economia, mas falharam em sua tentativa. O quarto concorrente, por sua vez, é o outsider Javier Milei, que busca fazer mudanças radiais com consequências imprevisíveis. Ele é o típico candidato que seduz eleitores mais cansados dos políticos tradicionais. O economista ultradireitista aparece como um nome de força para as eleições presidenciais, porém, há pouco dias das primárias, perdeu pontos nas pesquisas, e agora quem aparece como força é Patricia Bullrich, da coalizão de direita Juntos por el Cambio.

moeda argentina

Como a Paso funciona? 

As eleições Paso (Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias) são realizadas na Argentina desde 2009. O nome se explica porque é um processo aberto (nas quais participam todo o eleitorado, não só os filiados aos partidos políticos), simultâneo (uma vez que todos os grupos definem suas pré-candidaturas ao mesmo tempo) e obrigatório (porque devem votar todos os cidadãos que estão aptos a exercer esse direito). Os candidatos eleitos poderão se apresentar nas eleições gerais de 22 de outubro, quando concorrerão os aspirantes a ocupar a presidência argentina durante o período 2023-2027.

Este ano é a primeira vez em que os eleitores das coalizões mais importantes, a governista Unión por la Patria (União pela Pátria, peronistas) e a opositora Juntos por el Cambio (Juntos pela Mudança, centro-direita), deverão escolher entre dois aspirantes, já que nas eleições anteriores disputaram com um candidato único. Existem mais 22 candidatos de 12 coalizões. Contudo, boa parte deles aparecem com menos de 5% nas pesquisas. Os nomes mais bem cotados no grupo do atual líder do país, Alberto Fernández, são os de Sergio Massa, ministro da Economia, e do líder de movimentos sociais Juan Grabois. Eles concorrem entre si para ver quem será o representante do partido União Pela Força (UP). A vitória de Massa é apontada como certa, segundo analistas internacionais.

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Pré-candidatos à presidência da Argentina; da esquerda para direita: Patricia Bullrich, Horacio Rodríguez Larreta, Sergio Massa, Javier Milei e Juan Grabois │Juan MABROMATA, Luis ROBAYO, Victor CARREIRA / AFP / TELAM

Horacio Rodríguez Larreta, prefeito de Buenos Aieres — e representante de uma centro-direita mais “moderada” —, e Patricia Bullrich, ex-ministra de Segurança — de uma centro-direita que busca transformações mais rápidas e defende uma política de linha-dura —, também estão entre as primeiras opções de voto. Os dois se enfrentam para conseguir ser o candidato do Juntos Pela Mudança (JxC). Não há uma perspectiva de quem deverá levar a melhor. “É uma eleição com final em aberto, e esse resultado vai definir o novo cenário eleitoral”, avalia o analista político Carlos Fara.

Javier Milei, conhecido como Bolsonaro argentino, é o único candidato do partido A Liberdade Avança (LLA), mas mesmo assim precisa enfrentar as primárias. O ex-presidente Jair Bolsonaro declarou apoio a Milei. Em um vídeo enviado ao pré-candidato, que é seu admirador e de Donald Trump, o político brasileiro disse ter muita coisa em comum com o argentino. “Defendemos a família, a prosperidade privada, o livre mercado, a liberdade de expressão, o legítimo direito de defesa”, disse. “Muito obrigado, presidente Jair Bolsonaro, por sua mensagem”, agardeceu Milei. “Lutaremos por uma América Latina livre. Viva a liberdade, c**alho.” Ele precisa obter bons número para mostrar seu peso. As primárias também vão servir para escolher os candidatos às eleições parciais na Câmara de Deputados e no Senado, assim como para a prefeitura da capital e o governo da província de Buenos Aires.

Pesquisas publicadas nas últimas semanas pela CB Consultora Opinión Pública apresentaram um cenário favorável à oposição. Porém, a coalizão de Milei aparece isolada na terceira posição. Em segundo está a Unión por la Patria. É um partido peronista ligado à atual esquerda que governa o país, porém enfraquecido devido às crises econômicas e políticas que assolam o país. A primeira posição, ao que tudo indica, ficará com a coalizão Juntos Pela Mudança. Nenhum dos candidatos às primárias supera 25% das intenções de voto. Estima-se que cerca de 10% dos eleitores ainda não decidiram em quem votar. De acordo com as autoridades eleitorais, cerca de 5,5 milhões de pessoas optaram por não votar.

Violência afeta a campanha

morena morta argentina

Policiais montam guarda durante manifestação realizada por moradores do município de Lanús exigindo justiça pelo crime de uma menina de 11 anos│Emiliano Lasalvia / AFP

Nesta semana as campanhas eleitorais precisaram ser paralisadas após a morte violenta de uma menina de 11 anos ocorrida na periferia de Buenos Aires. Morena Domínguez foi abordada enquanto estava indo à escola por dois jovens em uma motocicleta que queriam roubar sua mochila. A menina foi arrastada pelo chão e recebeu um golpe na cabeça, que acabou causando sua morte em um hospital de Lanús, cidade da Província de Buenos Aires. Diante do ocorrido, os principais pré-candidatos à presidência argentina anunciaram a suspensão de seus respectivos comícios de encerramento de campanha, que estavam previstos para a última quinta-feira, 10.

As primárias deste ano abrem o processo eleitoral que marca os 40 anos desde a volta da democracia no país, o período mais longo da história da Argentina. Embora a população valorize as liberdades democráticas, demonstra certo ceticismo em relação à capacidade de atender seus problemas cotidianos, segundo pesquisas de opinião. Após anos de polarização, que os argentinos chamam de “grieta” (racha), esta eleição será a primeira sem os ex-presidentes Cristina Kirchner e Mauricio Macri, figuras emblemáticas da aliança peronista e sua opositora, Juntos por el Cambio.

*Com informações das agências internacionais 

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