Belarus é acusada de forçar pouso de avião para prender jornalista crítico a Lukashenko

Roman Protasevish teria sido preso após um caça MIG 29 escoltar um voo da Ryanair que ia da Grécia à Lituânia e obrigá-lo a desviar para Minsk; ato foi considerado um ‘terrorismo de Estado sem precedentes’

  • Por Jovem Pan
  • 24/05/2021 11h27 - Atualizado em 24/05/2021 11h30
EFE/EPA/STRINGER Policiais detêm um jornalista Roman Protasevich que tentava cobrir um comício em Minsk, Bielo-Rússia, 26 de março de 2017 Roman Protasevich já tinha sido detido pela polícia em março de 2017 enquanto cobria um comício em Minsk, em Belarus

Belarus desviou para o aeroporto de Minsk um avião da Ryanair que ia da Grécia à Lituânia neste domingo, 23. A oposição afirma que a operação foi comandada pelo presidente Alexandr Lukashenko com o objetivo de prender um jornalista crítico de seu governo, Roman Protasevish. O editor do portal de notícias Belamova estava voltando de Atenas após cobrir uma visita da líder oposicionista Svetlana Tikhanovskaia à cidade grega. Depois que o voo civil 4678 foi escoltado por um caça MIG 29 e obrigado a pousar em Misk, o jornalista teria sido detido pelas autoridades bielorrussas. O Ministério do Interior de Belarus chegou a confirmar que Protasevish tinha sido preso, mas apagou a postagem pouco tempo depois. A Ryanair explicou que a tripulação foi avisada pelo controle aéreo de Belarus de uma “ameaça potencial à segurança a bordo”  e instruída a desviar o voo para Minsk. O avião passou por uma vistoria, mas como nada foi encontrado, o voo foi retomado horas depois e chegou com segurança em Vilnius, na Lituânia. O comunicado da companhia aérea não menciona o destino de Roman Protasevish ou de sua namorada, a russa Sofia Sapega, que eram dois dos passageiros a bordo. Porém, o diretor-executivo da Ryanair, Michael O’Lery, disse que acredita que havia agentes do serviço de espionagem de Belarus, a KGB, a bordo da aeronave.

A passageira lituana Raselle Grigoryeva disse à emissora de televisão norte-americana ABC News que todos entraram em pânico após o desvio do voo porque acharam que o avião estava prestes a cair. “Foi um mergulho repentino, mudando a altitude drasticamente. Foi muito violento. Nunca senti isso em um avião. Todo mundo estava em choque”, relatou. Outro passageiro lituano, nomeado apenas como Mantas, contou para a agência de notícias Reuters que Protasevich pegou sua mala logo depois que o piloto anunciou que o voo estava sendo desviado para Minsk. “Ele pegou a bagagem e estava tentando dividir as coisas, como o computador que deu para a namorada. Acho que ele cometeu um erro. Havia muita gente para que ele pudesse dar as coisas, para mim ou para outros passageiros, e não para a namorada, que também foi, eu acho, presa”, comentou. Outro passageiro não identificado relatou que policiais usaram de força física para prender o jornalista, que aparentava estar bastante assustado, e confiscar o seu passaporte.

Após o episódio, o governo da Lituânia decidiu proibir todos os voos com saída ou destino aos seus aeroportos de cruzar o espaço aéreo de Belarus. O secretário de Estado dos Estados UnidosAntony Blinken, exigiu a libertação imediata de Roman Protasevish e afirmou que o “ato chocante do regime Lukashenko pôs em perigo a vida de mais de 120 passageiros, dentre os quais cidadãos americanos”. O presidente do Conselho EuropeuCharles Michel, garantiu que “o incidente não ficará sem consequências”. “Apelo às autoridades da Belarus que libertem imediatamente o passageiro detido e garantam plenamente os seus direitos”, acrescentou. A presidente da Comissão EuropeiaUrsula von der Leyen, também considerou o desvio do voo “inaceitável” e disse que “qualquer violação das regras de transporte aéreo internacional deve ter consequências”. Já o primeiro-ministro da Polônia, Mateusz Morawiecki, foi contundente ao dizer que as ações de Belarus foram um “ato de terrorismo de Estado sem precedentes”.

O ministro das Relações Exteriores de Belarus, Anatoli Glaz, criticou as acusações que estão sendo feitas pela comunidade internacional. “É impressionante a pressa das declarações abertamente belicosas de uma série de países e instituições europeias. A situação foi sendo alimentada de uma forma clara e direta. São deliberadamente politizadas, ouvem-se acusações infundadas”, defendeu. Nesta segunda-feira, 24, ele garantiu que as autoridades do país agiram em “total conformidade” com as normas interacionais ao desviar o avião para Minsk e que o fato de haver um “extremista”  entre os passageiros não influenciou a decisão de “ajudar o avião de passageiros que relatou problemas”. No domingo, 23, o canal do Telegram associado ao serviço de imprensa da presidência bielorrussa afirmou que “tanto Atenas como Vilnius estavam pedindo a Minsk que assumisse o comando” do voo.

Roman Protasevish, 26 anos, foi confundador e editor de um dos principais portais de notícias de Belarus, o Nexta, que foi banido pelo governo em outubro de 2020 por ser considerado extremista. O canal foi fundamental para liderar os protestos antigovernamentais que irromperam após as eleições fraudulentas que reelegeram Lukashenko e para expor a repressão do regime através de fotos e vídeos. Protasevish e outro fundador do Nexta foram acusados de incitamento ao motim e ódio social contra funcionários e agentes da lei e violações graves da ordem pública, crimes puníveis com até 15 anos de prisão ou mesmo a pena de morte. Além disso, a KGB bielorrussa colocou-os em uma lista de “pessoas envolvidas em atividades terroristas”. Por esse motivo, Protasevish decidiu deixar o país e estava morando na Lituânia. A líder oposicionista Svetlana Tikhanovskaia, que seria a real vencedora das eleições do ano passado, tinha feito esse mesmo voo entre Atenas e Vilnius há pouco tempo. “A partir de agora, ninguém voando sobre Belarus pode estar seguro. Tivemos sorte de chegar ao destino. O espaço aéreo bielorrusso tem que ser evitado e os responsáveis devem ser punidos”, afirmou a política.

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