Entenda o que é o ‘Isis-K’, braço do Estado Islâmico que reivindicou ataques em Cabul
Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, alertou que grupo organizava atentado terrorista na região para atingir civis afegãos e norte-americanos durante operação de retirada
O responsável pela autoria das duas explosões realizadas do lado de fora do aeroporto de Cabul, no Afeganistão, que deixou pelo menos 70 mortos na manhã desta quinta-feira, 26, é o Estado Islâmico de Khorasan, chamado no exterior de “Isis-K”, um braço do tradicional Estado Islâmico voltado para a Ásia Central. Ainda na terça-feira, 24, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, tinha alertado em comunicado oficial sobre a possibilidade de um ataque terrorista articulado pelo grupo, que rejeita a ideia de “estados nacionais” na região. O professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC-SP Reginaldo Nasser lembra que a quantidade de pessoas concentradas nos muros do aeroporto tentando deixar o país para fugir do poder do Talibã tornou o espaço propício para ataques do tipo. “O contexto é propício a um atentado terrorista. Você tem muita gente no aeroporto, atentado terrorista gosta de chamar atenção”, afirmou em entrevista à Jovem Pan. Além de bombardeios em torno do aeroporto, a comunidade internacional também projetava possíveis ataques a comboios militares a caminho do local.
O professor explica que o grupo extremista funciona de forma semelhante ao Estado Islâmico “tradicional”, que nega a existência de países como Síria e Iraque, mas tem a denominação de “Khorasan” porque remete à região com mesmo nome formada antes de influências imperiais ou colonialistas que dividiram a Ásia Central e outras partes do mundo por séculos. “O Khorasan é uma região antiga onde os estados nacionais basicamente não existiam. A área abrangia o nordeste do Irã, uma boa parte do Afeganistão, do centro para o norte, e o Tajiquistão”, lembra. A missão do grupo, segundo o professor, é formar uma grande comunidade internacional islâmica chamada “Umma”.
‘Isis-K’ tem Talibã, Afeganistão e EUA como inimigos em comum
Apesar de ser um grupo extremista, termo também utilizado quando o mundo se refere ao Talibã, o “Isis-K” tem o grupo fundamentalista como inimigo declarado. Segundo o especialista, isso ocorre pelo desenvolvimento “político” que os talibãs tiveram ao longo de décadas de formação. “À medida em que o Talibã está sentando na mesa, fazendo negociação com o ex-presidente do Afeganistão, que foi colocado no cargo pelos americanos, eles [o Isis-K] vão começar a jogar a ideia de que o Talibã se vendeu. Agora ou mais tarde, grupos vão insuflar as pessoas dizendo que o Talibã traiu [a comunidade islâmica], então vão aparecer grupos mais radicais do que o Talibã”, explica. Apesar de não acreditar que a natureza repressiva dos talibãs vai mudar, o professor aponta que a “situação diplomática” do país é completamente diferente da de décadas atrás. “É diferente daquele momento em 1996 quando eles chegaram ao poder. Naquele momento, eles não tinham interesse em agradar a comunidade internacional. Hoje, parece que eles têm uma atuação diplomática intensa, que começou, na verdade, nas reuniões diplomáticas com Donald Trump”, disse.
A chegada do Estado Islâmico de Khorasan ao país ocorreu ainda durante a presença das tropas norte-americanas na região, entre os anos de 2015 e 2016. O grupo fundamentalista, diferente das outras opções presentes na região, permitia a inclusão de mulheres na organização e conseguiu aliciar pessoas da classe média, algo considerado uma dificuldade para os talibãs. Ao longo dos anos 2010, com o crescimento de atentados do “Isis-K” em regiões do Afeganistão, uma união bélica inusitada ocorreu no território da Ásia Central. “Nessa época, o governo afegão, as tropas americanas que estavam lá e o Talibã lutaram contra eles. O Estado Islâmico de Khorasan foi o inimigo comum. Isso, inclusive, intensificou o apoio tanto da Rússia, que é contra o Estado Islamico na Síria e na região, como também do Irã. Após vários atentados e combates, eles foram rechaçados e voltaram a operar na região alguns anos depois, já durante o governo Trump”, recorda. O Talibã se pronunciou algumas horas após o ataque terrorista em Cabul e disse que a presença de forças internacionais no país eram as principais culpadas pelas mortes causadas na região.
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