“Não vejo a economia reagir tão cedo”, diz presidente do Insper
O economista Claudio Haddad, presidente do Conselho de Administração do Insper, viveu o Brasil das crises. Nos anos 80, foi diretor do Banco Central; nos 90, sócio do Garantia, um dos bancos de investimentos mais inovadores do País. Nada do que viu lá atrás se compara a hoje e seu diagnóstico é desalentador. Diz que a instabilidade política não tem data para acabar e que a economia não melhora no curto prazo. Mas se considera um otimista, porque o combate à corrupção melhora o País. “O Brasil está como que no meio de uma estática de rádio, mas tem música no fundo”, diz. A seguir, trechos de sua entrevista.
Que cenário o sr. traça para a economia, levando em consideração o atual ambiente político?
A história ainda não acabou. O passado recente tem demonstrado que uma coisa vem depois da outra: é mais uma delação, mais uma nova informação. Estamos em um processo no qual o presidente está ficando cada fez mais fraco. Isso, evidentemente, se reflete na sua capacidade de conduzir o processo político e fazer com que as reformas aconteçam. Se isso vai chegar num ponto de ruptura, que a tensão fique tão forte, seja no aspecto legal, seja no aspecto popular, e leve a uma renúncia, o mais adequado seria nomear um interino. Já temos eleições marcadas para o ano que vem. Não vejo por que antecipar eleições. Já tivemos interinos. Foi assim quando Getulio Vargas se suicidou, quando Jânio renunciou. As instituições seriam preservadas.
Nesse cenário extremo, como ficaria a equipe econômica?
Trocar a equipe seria um suicídio. É ela que faz os investidores acreditarem que as coisas podem melhorar. Se entrar uma equipe econômica que pense diferente dessa, entraríamos numa rota caótica, num circulo vicioso do qual dificilmente sairíamos.
E a economia, nesse meio tempo: fica em compasso de espera?
A economia já está em compasso de espera. Não vejo como a economia vai reagir tão cedo. Não vejo nenhuma fórmula mágica que faça com que, repentinamente, as reformas sejam rapidamente aprovadas, do jeito como o mercado gostaria, e que a gente tenha a retomada da confiança e dos investimentos. Isso só vai acontecer quando voltarmos a ter a sensação de continuidade.
Mas as reformas podem sair?
Eu acho que a reforma trabalhista sai. Essa é importante para melhorar o ambiente de negócios e a produtividade. A reforma da Previdência, também, mas muito diluída, talvez apenas com idade mínima. E essa é vital para melhorar as contas públicas. De qualquer maneira, no meu cenário, vejo que ambas terão de ter continuidade no próximo governo.
O sr. já disse que não se faz omelete sem quebrar ovos, numa analogia de que o novo governo deveria rever desonerações e outras distorções. A opção foi outra: fazer reformas estruturais de longo prazo que, no curto prazo, melhorariam a confiança – mas a confiança não melhorou. O sr. diria que a estratégia é frágil?
Em termos macro, sim, exceto pelo Banco Central. O Banco Central tem hoje uma direção muito mais clara e incisiva que no governo anterior. Mas, em termos de política fiscal, a coisa vai assim, em quebra-galho, na minha opinião. O panorama macro ainda é muito ruim. Tivemos uma queda de 11% na renda. Não me lembro de isso ter acontecido no passado – e olhe que estudei a economia brasileira ao longo do século 20. Tem muito chão pela frente para a economia melhorar. Na parte micro, porém, temos mudanças importantes.
Quais?
A nova administração na Petrobrás, com Pedro Parente, tem sido fantástica. Colocou a companhia de pé de novo. Isso já se refletiu nos resultados financeiros, no preço da ação, na taxa de risco. Outra grande coisa é uma série de mini reformas que estão ocorrendo.
O sr. conversa com muitos investidores, dentro e fora do Brasil. Como ficou a imagem do empresariado brasileiro?
A imagem do Brasil, em geral, piorou. Mas muita gente racional vê o lado positivo: qual País emergente está fazendo uma limpeza dessas e as instituições funcionam de forma admirável? Os juízes trabalham. Políticos são investigados e presos. Os empresários idem, não importa o tamanho de suas empresas. Mas veja bem. Não foi nenhum ‘oh Meu Deus!’ Ninguém foi surpreendido pela relação incestuosa entre o governo e alguns empresários. Mas tenho uma visão otimista. Estamos melhores.
Por quê?
O Brasil hoje está no meio de uma estática de rádio, mas tem música no fundo. Há décadas existe caixa 2 de campanha no País, mas a coisa exacerbou. É muito importante fazer essa limpeza. A corrupção, para mim, é constituída por três elementos. Um elemento é a impunidade. Em nível mais alto – não estou falando a corrupção de fiscal da Prefeitura, mas dos grandes esquemas, com grandes empresas – a Lava Jato cumpre um papel importante. Presidentes e diretores de empresas vão pensar mil vezes antes de entrar num esquema. O segundo elemento é o ambiente, que no Brasil é muito tolerante com o ilegal. As mesmas pessoas que saem na rua dizendo abaixo a corrupção furam fila, colam na prova, pagam por fora a empregada. É a mistura de boa educação, valores e cidadania que leva um país para a frente. Nosso capital social tem muito a evoluir. O último ponto é a oportunidade. Na verdade, o que produziu tudo isso? A concentração de recursos e poder nas mãos do governo, das agências governamentais, dos políticos, das empresas, que, num contexto de baixo capital social, pouca transparência institucional, são capturados por vários interesses escusos. Você vai lá e coloca bilhões na política de conteúdo nacional para alguns; coloca bilhões no BNDES para fazer campeões nacionais. Essa concentração cria um ambiente perfeito para a corrupção.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.